Pela segunda vez em pouco tempo uma “pirralha” dá lições para os políticos e reacionários do mundo. No ano passado foi Malala Yousafzai, que por sua militância pelas meninas nos rincões do obscurantismo muçulmano recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Este ano a prestigiosa revista Time entrega à ativista sueca Greta Thunberg, de apenas 16 anos, o título de Personalidade do Ano de 2019. São duas militâncias distintas, em realidades muito diferentes, mas fundamentais para o processo de evolução da humanidade.
Os jovens vão herdar o mundo que os velhos insistem em destruir. Um sistemático desmonte de milhares de anos de civilização e desenvolvimento da cultura, que desde o iluminismo vem mostrando que há visões e modelos de organização da sociedade capazes de elevar a humanidade a um patamar ético e civilizatório melhor.
Nas últimas décadas o desmonte do processo civilizatório tem sido expressivo, com o abandono de políticas sociais, de redução das desigualdades, de desagregação da coesão social e, principalmente, de ruptura de processos democráticos a partir de fundamentalismos religiosos e políticos que fazem da mentira e da violência seus principais mantras.
Os modelos políticos que emergiram da Revolução Francesa e construíram as democracias modernas já não conseguem superar as barreiras impostas pelo desenvolvimento de novas tecnologias de conexão, que criam bolhas de interação desconectadas com a realidade. Em quase 10 bilhões de habitantes no planeta Terra há opiniões para todos os gostos e isso fortalece a formação de tribos que veem em suas próprias elucubrações valores maiores do que os da ciência desenvolvida com diligência e método por acadêmicos e pesquisadores em todo o mundo.
Para estes “iluminados” a filosofia deixa de ser o aprofundamento do conhecimento do homem para ser uma série de suposições e ilações que vão ao encontro do que cada grupo quer e deseja acreditar.
A humanidade que chega neste início de século à maturidade cronológica é, também, uma espécie que está se desconectando de sua descendência ao entregar para as próximas gerações um planeta degradado, poluído por bilhões de toneladas de plástico inútil, por modelos econômicos de aprofundamento da desigualdade, e por atividades que impactam decisivamente nas mudanças climáticas, com alto risco para as populações mais pobres e desassistidas da Terra.
A lista de mazelas que entregaremos às futuras gerações é imensa e muitas com impactos de séculos sobre a biodiversidade, sobre os ecossistemas e sobre as populações.
Chegamos a um ponto de inflexão em que a transição geracional é, também, uma passagem de bastão de responsabilidades. Não será uma transição tranquila, como aliás já vem sendo mostrado nas ruas das grandes capitais do mundo, nas eleições inconclusas em países antes considerados modelos de democracia liberal, nas guerras impostas pelas potências para garantirem suas hegemonias políticas e territoriais.
A geração que tem em Greta e Malala alguns de seus expoentes mais visíveis, está ocupando espaços cada vez mais importantes no debate e na ação política ao redor do mundo. E essa ação está atraindo cada vez mais reação de uma geração rançosa que não está disposta a abrir mão de privilégios e poder, mesmo à custa de milhares ou milhões de vidas, como é o caso das guerras no Oriente Médio, das hordas de refugiados, dos embates entre religiões ultra ortodoxas e de grupos e partidos políticos extremistas.
O movimento de transição de responsabilidade está apenas começando!
Fonte: Envolverde, por Dal Marcondes.