Declaração histórica citou caso do matemático comunista Maurice Audin, que desapareceu durante luta pela independência; é a primeira vez que um líder francês culpa Forças Armadas
O presidente francês, Emmanuel Macron, reconheceu nesta quinta-feira (13/09) que o Exército utilizou métodos de tortura durante a guerra de independência na Argélia. O discurso mencionou o caso do matemático comunista Maurice Audin, detido em junho de 1957 por tropas francesas, e que foi “torturado e executado por militares que o buscaram em seu domicílio”.
Segundo o Palácio do Eliseu, “o desaparecimento [de Audin] só foi possível com um sistema que permitiu a aplicação de uma lei que prendesse, detivesse e questionasse” qualquer civil “suspeito”. O texto também mencionou que Macron “decidiu que era hora de a nação fazer um trabalho de verdade sobre esse assunto”.
Com a decisão, o presidente se tornou o primeiro líder do país a reconhecer publicamente os crimes de guerra no confronto em território argelino. Outros governantes apenas fizeram menções ao episódio, como o ex-presidente François Hollande que, em 2014, contestou a versão oficial de que Audin havia fugido da prisão, afirmando que a vítima havia sido assassinada.
A última vez em que um chefe de Estado francês admitiu culpa em episódios de guerra foi em 1995, quando o então presidente Jacques Chirac pediu desculpas publicamente pela participação da França nos crimes do Holocausto, durante a Segunda Guerra.
O governo francês também entregará uma carta de Macron à viúva do matemático, Josette Audin, de 87 anos. A missiva fala que o caso do argelino “trouxe à tona” um “terreno de atos terríveis” e que, com o reconhecimento formal do papel das Forças Armadas nos crimes de guerra, é possível honrar “todos os franceses, civis ou militares, que desaprovaram a tortura” e “que, ontem e hoje, recusam qualquer elo com aqueles que a praticaram”. O Eliseu comunicou que o presidente fará uma visita a Josette Audin.
A guerra pela independência
A Argélia foi colonizada pela França em 1830, mas o conflito pela libertação do território argelino só ocorreu entre 1954 e 1962. A disputa principal foi entre o partido Frente de Libertação Nacional (FLN) e o Exército francês.
Com dois anos de luta armada, o Parlamento francês deu ordem para que as Forças Armadas retomassem a ordem no país, concedendo autonomia policial a membros do Exército. A partir do decreto, houve um aumento no número de civis desaparecidos, fato que teve “fins políticos”, segundo a recente declaração do governo da França.