Por Juliana Gonçalves/Brasil de Fato
Instituído em 1983, o Dia Internacional da Mulher Indígena reflete a resistência contra ideias coloniais
No dia 5 de setembro de 1782, a líder indígena Bartolina Sisa, indígena aymara, foi brutalmente assassinada durante a rebelião anticolonial de Túpac Katari, no Alto Peru. Em 1983, durante o II Encontro de Organizações e Movimentos da América, em Tihuanacu (Bolívia) a data foi escolhida como o Dia Internacional das Mulheres Indígenas.
Para a indígena Chirley Pankará, a data nascida do sangue indígena, traz reflexões importantes. “O dia Internacional da Mulher Indígena é para que possamos refletir. Esse dia a gente está fortalecendo para ser lembrada a presença e força da mulher indígena, que ela precisa estar nos espaços dialogando, contribuindo com o movimento e com a luta”, explica.
Tanto no Brasil como em outros países da América Latina, as mulheres indígenas desempenham historicamente um papel fundamental como agentes de mudança nas famílias, comunidades e na vida de seus povos.
Chirley participou da organização do I Encontro Estadual de Mulheres Indígenas, que ocorreu entre 1º e 3 de setembro deste ano na aldeia guarani localizada no Jaraguá, região noroeste da cidade de São Paulo (SP).
Participaram do encontro mais de 15 povos indígenas do Brasil, entre eles, os Terena, Tupi, Pataxó, Kaiowá e Xavante, além dos povos andinos Aymara e Mapuche. Comunidades refugiadas da Síria, Palestina, Congo e Haiti também estiveram presentes. Ao todo 200 pessoas circularam pela aldeia do Jaraguá durante as atividades do encontro batizado de “Mulheres Indígenas: Lutar é Resistir”.
Durante o encontro, as mulheres trocaram experiências sobre saúde, educação e demarcação de terras, entre outros temas. No manifesto lançado por elas, destaca-se o reconhecimento do direito à terra e da moradia e sustentabilidade dos povos originários.
Além disso, o documento repudia a proposta de “marco temporal” sobre as demarcações de terras, que, segundo elas, subtrai direitos dos povos indígenas. A tese jurídico-política, defendida por integrantes do governo de Michel Temer (MDB), restringiria genericamente o direito constitucional de demarcação de terras e territórios tradicionais de povos indígenas e comunidades quilombolas caso estas não comprovem a ocupação das áreas reivindicadas na data da promulgação da Constituição de 1988. Isso desconsidera todo o processo de expulsão sofrido por essas comunidades.
Durante o encontro, as mulheres ainda fizeram uma moção de repúdio que exige do Estado argentino a não extradição para o Chile do mapuche Facundo Jones Huala. “Há um plano sistemático político-repressivo contra os povos originários do continente que supõe a perseguição e retirada de suas terras, com políticas de urbanização, de mercado, de saúde, pretendendo apagar a cosmovisão, colonizando suas almas. Fora o capitalismo dos territórios dos povos originários de todo o mundo!”, são palavras do documento.
A programação do encontro encerrou-se com uma marcha que reuniu cerca de mil pessoas na região central de São Paulo, no dia 3 de setembro. Além das mulheres indígenas, marcharam em solidariedade diversos grupos de mulheres da cidade, entre eles a Marcha das Mulheres Negras de São Paulo. O trajeto foi marcado também pela participação do bloco percussivo de mulheres Ilú Oba de Min.
“Emocionante elas terem ido nos acompanhar. E estarmos somando forças somos mulheres, mulheres de luta”, ressalta Chirley.
De acordo com Letícia Indi Oba, indígena da etnia Payayá e uma das organizadoras do ato, o encontro e a marcha pautaram com sucesso as especificidades das mulheres indígenas. “A marcha era para demarcar esse território dentro da cidade de São Paulo. A gente está ali rompendo o machismo, o patriarcado e o capitalismo e a marcha vem simbolizando essas rupturas”.
Segundo ela, as reivindicações das mulheres indígenas são questões que passam por propostas de saúde, educação, políticas afirmativas e de autoafirmação e ampliação do mercado de trabalho às jovens indígenas.