Em documento, Rede Nossa São Paulo e outras entidades defendem também limite de mandatos parlamentares e mais diversidade no sistema representativo, entre outros pontos
São Paulo – A Rede Nossa São Paulo, fórum que reúne 700 entidades representativas de vários setores sociais, divulgou no dia 16/08 um manifesto pela reforma política em que defende o fortalecimento dos instrumentos de democracia direta e participativa e a proibição do financiamento empresarial das campanhas eleitorais.
O documento também defende o teto de dois mandatos consecutivos para o parlamentar – depois dos quais ele não poderia se recandidatar – e maior diversidade no sistema representativo.
Além da Nossa São Paulo, assinam, num primeiro momento, a Escola de Governo, a Fundação Avina, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), o Instituto Saúde e Alegria (PSA) e o Instituto Socioambiental (ISA).
Leia a íntegra do manifesto:
“Mudanças já, e com soberania popular!
As ruas brasileiras foram tomadas pelo desejo de mudança. O grito de indignação foi forte e foi ouvido por todos/as. Mesmo assim, corremos o risco de ver algumas das reivindicações sendo postergadas continuamente. Como, após todas essas manifestações, podemos realizar as eleições de 2014 com as mesmas regras que não impedem a influência das grandes financiadoras das campanhas sobre os poderes Legislativo e Executivo? Por que não colocar em prática os instrumentos constitucionais de democracia direta? Até quando serão adiadas as reformas necessárias para democratizar, de fato, o Estado brasileiro?
Vivemos uma crise de representação. A resposta via repressão policial aos protestos desnudou o enorme descompasso entre representantes e representados. Esta crise aparece nos governos que, em grande maioria, não garantem os mecanismos de diálogo, participação e decisão da população.
A crise também está no Congresso Nacional que entra em férias quando o País pede mudanças com urgência. No Legislativo Federal ainda temos que lidar com alguns parlamentares que tentam aprovar mudanças ínfimas na legislação como se isso significasse uma verdadeira reforma política.
A crise transborda para as diferentes instituições do Estado e concretamente se visibiliza nas políticas públicas precárias, que longe de serem universais, segregam criando serviços “pobres para os pobres”. As agendas locais dos protestos, em que foram realçadas as questões do direito à mobilidade e ao transporte público, precisam de respostas por parte dos governantes. E as mobilizações em sua defesa não podem parar.
Porém, a luta por Reforma Política pode abrir caminhos consistentes à radicalização da democracia e para avançarmos, definitivamente, na qualidade dos serviços públicos. Só com Reforma Política resolveremos esta crise.
Por isso, reafirmamos os princípios democráticos e republicanos. Nesta tarefa, precisamos reconstruir a política com outras formas, novos conteúdos e, principalmente, com instrumentos de democracia direta que possibilitem o exercício da soberania popular. Isso inclui repensar o nosso sistema de representação, em especial como os partidos e as eleições são financiadas. Sem tal alteração vamos reforçar este enorme déficit democrático, já que as instituições não são capazes de processar as demandas por profundas transformações sociais, políticas, econômicas e comportamentais.
Em meio a uma crise geral de representação, a sociedade civil precisa se questionar por onde começar. Acreditamos que o foco das reivindicações deve ser o Congresso Nacional!
É a hora de marcharmos para Brasília e “abraçarmos” o Congresso Nacional com o mesmo clamor dos protestos por cidadania que vimos pelo nosso País.
A Reforma Política é debatida há mais de 18 anos pelo Legislativo Federal. Neste período, muito já se falou e muito tempo e dinheiro já foram gastos em audiências públicas e em reuniões. Contudo, o Congresso opta por manter as coisas como estão. Faltaram aos congressistas o interesse político e a coragem de pensar no País e não nas eleições e reeleições que estava em jogo. A onda de manifestações mostra com o parlamento parece andar de costas para a sociedade.
Devemos dar um basta a este jogo de cartas marcadas que só serve para manter no poder aqueles que sempre estiveram lá.
É o momento de agir e de sermos mais proativos. As entidades e cidadãos/ãs que assinam este documento reafirmam as mudanças que desejamos para o nosso país.
Queremos mais democracia direta e participativa. Queremos plebiscitos e referendos que possam ser convocados pelos cidadãos/ãs. Queremos que determinados temas que só possam ser decididos pelo voto direto da população, e também decidir quais serão as questões que necessitam a aprovação popular. O Brasil precisa de mais flexibilidade no processo de criação de leis de iniciativa popular, com redução do número de assinaturas exigidas e liberação de coletá-las via internet. Queremos também que Emendas Constitucionais possam ser objeto de leis de iniciativa popular.
Defendemos a proibição ao financiamento de empresas para campanhas eleitorais, assim como queremos restringir drasticamente os abusivos valores gastos nas candidaturas que, dessa forma, já nascem compradas e corrompidas.
Queremos um sistema de fato representativo, em que a diversidade da nossa sociedade esteja refletida. Não aceitamos mais um Congresso Nacional formado basicamente por homens, brancos e proprietários. Queremos a igualdade de representação das mulheres nos parlamentos brasileiros e mecanismos de aumento da representação da população negra, indígena, jovem, pessoas com deficiência, do meio rural, das periferias urbanas, e também a homossexual, bissexual e transexual.
Queremos serviços públicos de qualidade e para todos e todas. Chega de serviços públicos pobres para os pobres, quanto os demais gozam de serviços “particulares” custeados com recursos públicos!
Queremos que haja um teto máximo de dois mandatos também para os legislativos, ou seja, reeleição uma única vez para qualquer cargo. Queremos ainda garantias de que o parlamentar eleito cumpra o seu mandato e não o utilize como um trampolim para acessar cargos no executivo.
Queremos o fim do foro privilegiado para os políticos, mudança no conceito de decoro parlamentar e a participação da sociedade nos conselhos de éticas que julgam os parlamentares. Queremos a adoção do instrumento de recall (em que a população pode interromper o mandato de políticos) em caso de desvio ético ou de não cumprimento do programa proposto durante as eleições.
Queremos o Judiciário que atue de forma célere e com austeridade, que não hesite em punir seus pares que se desviarem. Bem como queremos um Ministério Publico zeloso e guardião do respeito às leis e que cobre das autoridades responsáveis pelos abusos e violência durante as manifestações. O debate sobre a forma como são escolhidos os ministros do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça também precisa ser aberto.
Queremos ainda a retomada da discussão a respeito da justiça tributária para garantirmos o financiamento dos serviços públicos de qualidade. Não podemos continuar a ter um sistema tributário perverso e injusto, que concentra as riquezas ao invés de distribuir.
Queremos um Brasil democrático, justo e republicano! E a hora é agora!
Para conquistarmos todas essas mudanças é necessária a mobilização permanente da sociedade, em suas diferentes formas de organização, para pressionar o Congresso Nacional a romper esta postura de isolamento e para que ele volte a dialogar com a população.
Neste processo, é fundamental que sejam construídas respostas para as reivindicações das manifestações de junho e para os desejos e demandas da sociedade apresentados de diferentes formas nos últimos anos. Não temos dúvida de que tudo isso começa pela votação de uma Reforma Política que fortaleça a democracia direta, que aperfeiçoe a democracia representativa. A partir daí podemos efetivamente garantir serviços públicos de qualidade para toda a população.
Exigimos as garantias para que esta reforma seja feita em um processo democrático e popular para podermos construir o futuro que queremos, mudando já o presente!”
Assinam
Rede Nossa São Paulo
Escola de Governo
Fundação Avina
Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)
Instituto Saúde e Alegria (PSA)
Instituto Socioambiental (ISA)
por Redação RBA