O novo triunfo de Correa coloca grandes desafios na direção do cumprimento das propostas do programa de governo 2013-2017 da Alianza País. No horizonte das dívidas pendentes está atacar a concentração da terra, promover a redistribuição da água, a lei de comunicação, enfrentar os grupos monopolistas que concentram a economia, abrir o diálogo político com os povos indígenas e combater a corrupção.
Matéria de Eduardo Tamayo da Alai Amlatina, publicada pelo Portal Carta Maior
O presidente Rafael Correa foi reeleito no primeiro turno com uma votação superior a 60% dos votos, segundo pesquisas de boca de urna realizadas pelas empresas Cedatos e Opinião Pública Equador. Segundo esses dados preliminares extraoficiais, Correa ganhou em todas as províncias do Equador, seguido pelo banqueiro Guillermo Lasso, que deve obter cerca de 21% dos votos.
Com exceção da denúncia de tentativa de invasão da página do Conselho Nacional Eleitoral na internet, a jornada eleitoral se desenrolou de forma tranquila e normal tanto nas seções eleitorais do Equador como do Exterior.
O triunfo de Correa significa um triunfo da estabilidade em um país que experimentou profundas crises políticas nas quais vários governos corruptos e entreguistas foram derrotados pela mobilização social. É a primeira vez, em mais de três décadas, que um presidente conserva altos níveis de popularidade ao final de seu mandato e é reeleito com uma ampla margem.
Neste sentido, a votação de Correa expressa um sólido apoio à continuidade de suas políticas e uma oportunidade para que ele conclua as obras que começou em matéria de estradas, hospitais, escolas, centrais hidroelétricas, etc.
Alguns elementos podem explicar o contundente triunfo de Correa: crescimento econômico, baixas taxas de inflação e de desemprego e políticas de redistribuição de renda que se traduziram em um massivo investimento social em educação, saúde, habitação, assistência social e melhoria da qualidade dos serviços públicos (Correios, Seguridade Social, registro civil, assistência jurídica).
Ao imprimir altos níveis de qualidade aos serviços públicos e ao colocá-los à disposição dos setores mais pobres da população, estes últimos não só tem acesso a eles como se sentem valorizados em sua dignidade, o que explicaria o alto apoio a Rafael Correa. Esses setores, além disso, foram beneficiados com o bônus de desenvolvimento que no mês de janeiro subiu de 35 para 50 dólares mensais.
Um candidato a deputado do Movimento Alianza País, cujo nome será preservado, defende que o voto de Correa é “transclassista”, ou seja, que ele viria de todos os setores sociais. A gestão do governo, segundo esta versão, certamente favoreceu setores empresariais os quais estão indo muito bem e que constituiriam o voto oculto em favor de Correa. O melhoramento das estradas, por exemplo, permite que eles economizem tempo e tenham mais facilidade para transportar seus produtos.
Da mesma forma, as políticas econômicas que limitam as importações de têxteis ou calçados permitiram o crescimento dos setores econômicos dedicados a este ramo da produção. Esses setores empresariais teriam “se acostumado” a pagar impostos e a cumprir leis trabalhistas porque isso permite que eles tenham melhores relações com seus trabalhadores, o que resultaria em uma maior produtividade.
Do ponto de vista internacional, o triunfo de Correa representa o fortalecimento da tendência de governos progressistas que já conseguiram se reeleger no Brasil, Argentina, Uruguai, Venezuela e Nicarágua, e uma aposta no fortalecimento dos espaços de integração como Alba, Unasul e Celac. O governo de Correa deverá enfrentar situações difíceis como o caso de Julian Assange, que se encontra asilado na embaixada do Equador em Londres, a lei dos Estados Unidos que sanciona os países que mantém relações com o Irã, as demandas das transnacionais contra o Estado equatoriano, entre outras.
Um dos elementos que contribuiu de maneira decisiva para a vitória de Correa foi a fragmentação e a pobreza do discurso das oposições (de direita, esquerda e populistas) que apresentaram sete candidaturas presidenciais, sem que tenham conseguido se unificar em três ou quatro tendências. Centradas todas em atacar o que denominaram o autoritarismo, a intolerância e a concentração de poder nas mãos de Correa, foram incapazes, especialmente no caso da direita representada pelo banqueiro Guillermo Lasso, o homem mais rico do Equador Álvaro Noboa e o ex-presidente Lucio Gutiérrez, de propor alternativas críveis e medianamente estruturadas e coerentes.
Guillermo Lasso, que obteve o segundo lugar, canalizou o voto anti-Correa dos setores da direita tradicional que compartilham algumas de suas teses esgrimidas na campanha como a de diminuir os impostos dos mais ricos, firmar tratados de livre comércio e abrir o país ao investimento estrangeiro privado. Lasso é membro numerário da Opus Dei e mantem relações com José María Aznar, do Partido Popular, da Espanha, que atua na América Latina representando a direita internacional e o capital transnacional.
A campanha
Outro elemento que influenciou os resultados eleitorais foi o desenho da campanha de Correa. Apesar da grande popularidade do presidente, o movimento Alianza País trabalhou como se não tivesse um só voto e privilegiou a campanha na rua, perto das pessoas, as concentrações em vilas e cidades, o que se complementou com o uso de meios de comunicação e redes sociais. Este movimento acumulou a experiência de oito vitórias eleitorais consecutivas.
Ainda que o triunfo de Correa já fosse previsto, não estava assegurada a maioria na Assembleia Nacional composta por 137 membros, razão pela qual a estratégia do presidente deu atenção especial ao parlamento. “Não me deixem só”, dizia Correa a seus seguidores nos comícios, enquanto pedia o voto para sua lista de deputados. Apesar de alguns candidatos terem sido questionados e também o candidato a vice-presidente, isso não parece ter repercutido nos resultados finais que apontam uma maioria folgada da Alianza País na legislatura. O carisma de Correa influiu mais.
Ampliação da democracia
No início do século XX, se reconheceu o direito de voto para as mulheres. Em 1979, quando o Equador retornou ao regime democrático, se reconheceu esse direito aos analfabetos. Em 2013, graças à nova Constituição, se avançou muito mais na inclusão política. Agora, puderam votar os jovens de 16 a 18 anos, os militares e policiais, os emigrantes, os presos sem sentença executada, os estrangeiros residentes. De acordo com esta política, foram tomadas medidas para que os policiais e motoristas pudessem ajudar às pessoas com problemas de mobilidade e pessoas da terceira idade para que pudessem chegar aos recintos eleitorais.
Este novo triunfo de Correa coloca grandes desafios na direção do cumprimento das propostas do programa de governo 2013-2017 da Alianza País e da resposta às expectativas de uma cidadania cada vez mais protagonista. No horizonte das dívidas pendentes está atacar a concentração escandalosa da terra, a redistribuição da água, a lei de comunicação, o enfrentamento dos grupos monopolistas que concentram a economia, a abertura do diálogo político com os povos indígenas e o combate à corrupção, entre outros.