Movimentos sociais acreditam em virada contra o impeachment e avaliam que o povo entende que o que está em jogo não é só o mandato de Dilma, mas avanços e conquistas dos últimos anos.
por Rodrigo Gomes, da RBA publicado 31/03/2016
O ato em defesa da democracia na capital paulista reuniu 60 mil pessoas na Praça da Sé, na região central, sob um sentimento de confiança de que as mobilizações realizadas nos últimos dias vão barrar a tentativa de impeachment contra a presidenta da República, Dilma Rousseff. “Eu acredito que vamos derrubar o impeachment. Desde o dia 18 têm ocorrido atos quase todos os dias, de diversos segmentos da sociedade, contra o autoritarismo do Judiciário, a ação golpista, a tentativa de acabar com direitos. Essa força popular vai bater no Congresso”, disse o coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) em São Paulo, Raimundo Bonfim.
Para o ativista, está clara para a população a conspiração do vice-presidente, Michel Temer (PMDB), “que não tem votos e quer subir ao poder por meio de um golpe e sem comprovar qualquer crime da presidenta”. Bonfim ressalta que a Frente Brasil Popular, uma das organizadoras dos atos de hoje (31) em todo o país, tem sido convidada todos os dias para lançamentos de grupos e eventos em defesa da democracia. “Fugiu ao nosso controle, o que é muito bom. O povo sabe que esta tentativa de golpe não é contra a Dilma ou o PT, é contra os avanços e conquistas dos últimos anos”, afirmou.
Como no último dia 18, a manifestação foi marcada pela diversidade. Homens, mulheres, crianças, idosos, LGBT, religiosos, estudantes, professores, sindicalistas, militantes de movimentos sociais, artistas. Em ritmo de festa, dançaram e cantaram, aos gritos de “não vai ter golpe”.
Ilegítimo
O presidente da CUT São Paulo, Douglas Izzo, também acredita que essa força vai barrar o impeachment, mesmo que ele se consolide no Congresso Nacional. “Não vamos reconhecer o ilegítimo mandato presidencial conquistado por meio de um golpe. Temer representa ataques aos direitos trabalhistas, avanço da terceirização, fim das políticas sociais. Por isso banqueiros, empresários e conglomerados de mídia o apoiam”, afirmou.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) reafirmou a postura de “não dar um único dia de paz a um possível governo Temer”, embora o coordenador estadual Gilmar Mauro não acredite que isso vá chegar a ocorrer. “Temos um processo muito intenso de politização. O que deixamos de fazer em 15 anos, estamos fazendo em 30 dias. Aos golpistas sobra ódio, falta conteúdo. Este é um momento de mantermos a calma, dialogarmos com a família, os amigos, colegas de trabalho e mostrar qual é o objetivo deste impeachment.”
Para o militante sem-terra, é importante aproveitar a mobilização atual para garantir duas coisas: que o governo Dilma retome o programa que vinha sendo desenvolvido nos anos anteriores e intensifique a participação popular em todas as esferas de governo. “Só assim vamos realmente acabar com a corrupção”, afirmou.
Ditadura
Os manifestantes escolheram o dia 31 de março e a Praça da Sé, justamente pelo que eles representam na história brasileira. A data lembra o golpe de Estado de 1964, que derrubou o presidente João Goulart e levou o Brasil a 21 anos de ditadura. Também porque a praça foi palco de uma das grandes manifestações da campanha Diretas Já, em 25 de janeiro de 1984.
Moradora de Heliópolis, na zona sul de São Paulo, Mariana Maria da Silva fez questão de participar para defender a democracia e também “os avanços conquistados no governo do PT”. “Essa ação pelo impeachment preocupa a classe trabalhadora. Querem que voltemos à estaca zero. Sem emprego, com salário de miséria, sem acesso à universidade, o Nordeste desprezado. Sabemos como é difícil conquistar as coisas. Não vamos desistir delas sem luta”, afirmou.
Mesmo pessoas críticas com os rumos do governo Dilma marcaram presença e destacaram que a luta para defender a democracia é de todos. “Nós estamos na rua defendendo um governo legitimamente eleito. Nossa história é de golpes. E nós não vamos aceitar mais um. Mas nós não estamos satisfeitos com esse governo. Nós queremos muito mais e juntos vamos conquistar”, afirmou o militante do movimento negro Douglas Belchior.
Recém-saídos de uma intensa luta para barrar o projeto de reorganização escolar do governador paulistam Geraldo Alckmin (PSDB), e mobilizando-se para pedir punição à máfia da merenda que operava no governo tucano, os estudantes secundaristas destacaram que vão tomar as ruas “quantas vezes forem necessárias” para barrar o impeachment. “Nós vamos resistir. Não vamos deixar acontecer com o Brasil o que acontece aqui em São Paulo. Nós já conhecemos esse projeto político na pele e não vamos aceitar”, afirmou a presidenta da União Paulista de Estudantes Secundaristas (Upes), Angela Meyer.
Alguns representantes de partidos políticos também compareceram ao para deixar sua mensagem. O ex-senador e atual secretário municipal de Cidadania e Direitos Humanos de São Paulo, Eduardo Suplicy, foi ovacionado pela multidão, que queria falar com ele, fazer selfies, abraçá-lo. No fim, o secretário ainda dançou ao som de forró com dezenas de manifestantes. E voltou a cantar um dos hinos de resistência à ditadura, Pra não Dizer que não Falei das Flores, de Geraldo Vandré.
O presidente estadual do PT em São Paulo, Emídio de Souza, ressaltou que hoje “milhares de homens e mulheres saíram às ruas unidos para enfrentar o golpe articulado pelo Congresso e o judiciário”. Para ele, os golpistas querem colocar um “fantoche” no poder. “Para poder acabar com os programas sociais, com os avanços. Acham muito gastar com Prouni, com Bolsa Família, com Minha Casa, Minha Vida. Mas acham normal a mulher do (Eduardo) Cunha gastar milhares de reais na Europa em um dia”, criticou, referindo-se ao presidente da Câmara.
Citando a Bíblia, Souza disse que “o Mar Vermelho abriu para o povo passar. No Brasil, o mar vermelho vai fechar para deter o golpe”. Em seguida, a vice-prefeita da capital paulista, Nádia Campeão, lembrou que o impeachment tem apoio da Rede Globo, mas que a “’Rede Povo’ vai unir os brasileiros para confrontar o golpe e derrotá-lo”.
A coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres, Nalu Faria, destacou que não se pode esquecer quem é o condutor do impeachment, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) “Nós, as mulheres, pedimos o fora Cunha, esse corrupto, que prega a injustiça, a favor da morte das mulheres. Seu machismo chulo contra a Dilma fez com que as mulheres do país se erguessem todas. Sairemos fortalecidos desse embate.”
Fonte: Rede Brasil Atual