26 de Agosto 2024

O Presidente francês decidiu agravar a crise política que se seguiu às últimas eleições e apela agora a socialistas (PSF), ecologistas (Verdes) e comunistas (PCF) a procurarem acordos à sua direita. O partido “França Insubmissa” (este também parte, juntamente com os outros partidos da esquerda, da Nova Frente Popular ou NFP) apresenta moção de destituição de Macron e vai convocar manifestações a favor do respeito pela democracia.

No final do segundo dia de audiências com os partidos, em que recebeu a União Nacional (extrema-direita) e seus aliados à direita, Emmanuel Macron concluiu que “um governo baseado unicamente no programa e nos partidos propostos pela Nova Frente Popular, seria imediatamente censurado por todos os outros grupos representados na Assembleia Nacional”, pelo que rejeita dar posse ao governo do bloco político mais votado nas eleições de Julho.

No seu comunicado, Macron acrescenta que alguns partidos, entre os quais os da sua base presidencial, se “mostraram abertos a apoiar um governo dirigido por uma personalidade de fora das suas fileiras”, lançando o convite ao PSF, Ecologistas e PCF a proporem “formas de cooperação com as outras forças políticas”, rompendo assim com a França Insubmissa e com o projeto da Nova Frente Popular que venceu nas urnas.

No final das audiências com os partidos centristas na sexta-feira, os seus dirigentes anunciaram que apoiariam uma moção de censura caso um futuro governo incluísse ministros da França Insubmissa (FI). Mas, no sábado, o líder histórico deste partido desafiou-os a dizer que viabilizariam um governo da esquerda sem a presença dos ministros da FI. A resposta do atual primeiro-ministro demissionário, Gabriel Attal, veio esta segunda-feira numa mensagem aos seus deputados, afirmando que iria censurar um governo da esquerda mesmo que não incluísse deputados da FI.

Emmanuel Macron dissolveu o Paramento após a vitória da União Nacional nas eleições europeias com o objetivo de fazer uma clarificação política. Mas o eleitorado surpreendeu-o nas legislativas, ao ditar a derrota, quer do seu partido quer da extrema-direita, favorita nas sondagens mas que acabou na terceira posição. Agora, Macron impede a formação dum governo da esquerda unida, que está em minoria no Parlamento mas que é o grupo mais forte, e faz apelo ao “espírito de responsabilidade”, adiantando que irá promover nova ronda de audiências com “responsáveis dos partidos e personalidades que se distinguiram pela experiência ao serviço do Estado e da República”.

O comunicado de Macron foi naturalmente mal recebido pelos partidos da esquerda. O líder parlamentar socialista, Boris Valaud, reagiu assim nas redes sociais: “Ele dissolveu. A esquerda ficou à frente. Ele não nos vai nomear. O Presidente continua a aprofundar a crise que ele próprio criou. É angustiante”. Também nas redes sociais, o líder do partido, Olivier Faure, preferiu apenas recordar a Emmanuel Macron que “a República nasceu da recusa do poder pessoal”.

A líder dos Ecologistas, Marine Tondelier, foi mais longe e considerou que o comunicado de Macron “é uma vergonha”. E acrescenta que “invocar a estabilidade quando se dissolveu o governo sem qualquer concertação, e quando se recusa a aceitar os resultados de uma eleição para a qual os franceses jamais tinham comparecido em tão grande número, é perigosamente irresponsável”. Lembrando que três quartos dos eleitores “querem uma rotura política com o macronismo”, Tondelier prometeu “continuar a lutar para respeitar a vontade dos franceses”.

Também o líder dos comunistas franceses reagiu ao comunicado de Macron apeando à mobilização popular em todas as cidades francesas. “A democracia foi manchada. O povo francês está amordaçado. A República está ameaçada”, afirmou Fabien Roussel, reafirmando a recusa em participar nas futuras audiências no Eliseu com um Presidente que só quer estabilidade “para ele e para os seus, uma minoria dos mais ricos”. Ainda antes de ser conhecida a decisão de Macron os líderes dos partidos da Nova Frente Popular já tinham dito que não voltariam ao Eliseu a não ser para discutir sobre as formas de coabitação [entre a candidata deles a primeira-ministra, Lucie Castets, e o Presidente].

França Insubmissa avança com moção de destituição do Presidente

Num comunicado, a França Insubmissa qualificou de “excecional gravidade” a decisão presidencial ao não reconhecer o resultado das urnas que levaria à indicação de Lucie Castets para tentar formar um governo viabilizado pela maioria dos deputados. O partido entende que não cabe ao Presidente invocar a estabilidade institucional, mas sim ao Parlamento consegui-la, e por isso diz que Macron cometeu “mais um abuso de poder”, questionando-se sobre qual a maioria parlamentar disponível que terá encontrado durante as suas audiências com os partidos.

Tal como prometido caso este cenário se concretizasse, a França Insubmissa irá avançar com uma moção de destituição do Presidente e avisa também que apresentará uma moção de censura a qualquer governo que não seja chefiado por Lucie Castets, a economista apontada pelos quatro partidos da esquerda para liderar o seu executivo.

“A gravidade do momento exige uma reação firme da sociedade francesa contra o incrível abuso de poder autocrático de que é vítima”, afirma o maior partido da esquerda francesa, apelando também à realização de manifestações a favor do respeito pela democracia, convocando para essa mobilização todas as organizações democráticas francesas.


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