MINERAÇÃO

Por Fernanda Perdigão

 

A mineração atinge os direitos das crianças e adolescentes, a luta do grupo de Pais e Mães da Escola Municipal Padre Xisto no município de Brumadinho, causa perplexidade e revolta aqueles que tem bom senso. Cumpre lembrar, o município de Brumadinho foi palco do Desastre-crime da Vale S.A no ano de 2019, quando rompeu a barragem da mina do Córrego do Feijão, deixando 272 (duzentas e setenta e duas) vítimas imediatas, além de danos profundos e ainda existentes.

O Distrito de Piedade do Paraopeba, com cerca de 98 (noventa e oito) quilômetros quadrados de extensão territorial, localizado na zona rural do município de Brumadinho, mantém o ar de cidade interiorana, e na Vila de Piedade do Paraopeba, encontra-se a Escola Municipal Padre Xisto, com cerca de 260 (duzentas e sessenta) crianças, que em 25 de abril de 2022, durante um Seminário Orientativo da empresa Vallourec, os pais e mães tomaram ciência que seus filhos e filhas estudavam em uma escola que se encontra na chamada zona de autossalvamento – lê-se zona de morte.

Cumpre destacar que, as Zonas de Autossalvamento (ZAS) são regiões imediatamente a jusante da barragem, em que se considera não haver tempo suficiente para uma adequada intervenção dos serviços e agentes de proteção civil em caso de acidente, como o rompimento de barragens.

Isso posto, a Escola Municipal Padre Xisto, está localizada na ZAS da Barragem Santa Bárbara cuja responsável é a empresa Vallourec Tubos do Brasil, que segundo informações da própria empresa, tem 938 m³ de capacidade, e a distância até a comunidade é de aproximadamente 1,3 quilômetros.

Comunidade Piedade do Paraopeba

 

Diante o cenário apresentado aos pais e mães dos alunos da Escola Municipal Padre Xisto, e os traumas já acumulados às comunidades do município de Brumadinho devido ao desastre-crime da Vale S.A, pais e mães se reuniram e criaram um grupo para reivindicar os direitos das crianças e adolescentes que estão expostos na zona de autossalvamento da Barragem pertencente à empresa Vallourec.

Importa destacar, esses pais e mães ao se organizarem na defesa dos direitos de seus filhos, estão cumprindo o que a CRFB/88 afirma, “é dever do Estado, da família e da sociedade assegurar à criança, com prioridade absoluta, uma série de direitos”, porém, esses pais e mães, além do extremo sofrimento de terem seus filhos e filhas expostos ao risco da barragem, sofreram ataques e ameaças na tentativa de cessar a luta pelos direitos das crianças e adolescentes da Escola Municipal Padre Xisto.

O que foi observado por órgãos como o Conselho Tutelar do Município de Brumadinho, Secretaria de Educação Municipal, e Ministério Público Estadual da Comarca de Brumadinho, foi a total negligência e perversidade com essas crianças e adolescentes, visto que as alegações de tais órgãos e entidades dizem aos pais e mães dos alunos é “a empresa está dentro da legalidade”.

As inobservâncias aos direitos das crianças e adolescentes não param nessa alegação irracional, mas, também no andamento da ACP – Ação Civil Pública – impetrada pelo Grupo de pais da Escola Padre Xisto, com o apoio do Projeto Ecologismo dos Pobres da PUC Minas, que dentre outros pedidos, requer: “o descomissionamento da barragem Santa Bárbara; que os alunos e alunas da Escola Padre Xisto tenham até o descomissionamento um local seguro para frequentar as aulas; reposição das aulas perdidas para cerca de 6 (seis) alunos (as) que não estão frequentando as aulas devido ao medo diante o risco da barragem”.

Outra aberração durante a ACP impetrada, foi que não se observou os artigos 148, IV e 209 da Lei 8.069/1990 que, impõe o reconhecimento da competência absoluta da Vara da Infância e da Juventude, em detrimento da Vara da Fazenda Pública, para processar e julgar causas envolvendo matrículas de crianças e adolescentes em creches e escola, uma vez que também é discutido a transferência dos alunos e alunas para escolas seguras, a Vara da Infância e Juventude remeteu o processo à 1º Vara da Fazenda Pública.

Mas, pelo histórico de aberrações jurídicas efetuadas pela justiça mineira, como o Acordo Judicial firmado entre empresa ré Vale S.A e Estado de Minas Gerais, não é de se assustar que o respeito à prioridade absoluta que é dever legal na garantia dos direitos de crianças e adolescentes esteja esvaziado nas ações do caso da Escola Municipal Padre Xisto.

O direito à vida, à saúde, à integridade e ao meio ambiente tem sido descumpridos reiteradas vezes em regiões mineradas, o colapso não é somente da possibilidade de um futuro e inesperado rompimento de barragem, mas, também o colapso moral dos poderes do Estado de Minas Gerais nas garantias constitucionais dos direitos da criança e do adolescente.

Ainda nessa seara de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, precisamos citar a Resolução nº 215/2018 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA – que dispõe de parâmetros e ações de proteção de crianças e adolescentes no contexto de obras e empreendimentos, que cumpre destacar, os órgãos e instituições do Poder Público, devem desconhecer.

É preciso que o Poder Público e as entidades envolvidas na proteção da criança e do adolecente repensem suas práticas, bem como a maneira que estão lidando com os profundos impactos que o medo, o pavor, da existência de uma escola em zona de autossalvamento causa ao presente e ao futuro dessas crianças e adolescentes, é preciso que seja garantido desde já a Prioridade Absoluta à essas vítimas atingidas também pela subserviência dos Poderes do Estado de Minas Gerais com as empresas mineradoras.