Artigo/Animais Ameaçados
Devemos proteger a rede da vida e prezar pelas outras espécies viventes com as quais compartilhamos este planeta. Társios comem e hospedam pequenos animais que vemos nas casas – insetos, aranhas, lagartos, percevejos, piolhos, pulgas e vermes. As vaquitas são predadas por grandes tubarões e orcas, mantendo-os longe de nós. Porém, existem apenas 10 vaquitas e, com a ausência da espécie, a dieta desses predadores pode mudar. Um tigre na natureza indica que a floresta na qual habita é saudável e diversa. Hoje em dia, existem 3900 tigres selvagens no mundo, e mais que o dobro deles (8000) em cativeiro. Ao proteger a rede da vida, construímos um mundo melhor para todos.
Os esforços de conservação para salvar e aumentar a população de tamaraos em Mindoro, Filipinas, estão sendo comprometidos pela COVID-19. Guardas-parque de santuários e guardas-florestais dependem dos ganhos com turistas, trilheiros, conservacionistas e viajantes.
Eles dobram suas baixas rendas trabalhando em empregos secundários, como guias de montanha e carregadores de bagagem. Poreém, as dificuldades econômicas causadas pela COVID-19 podem levá-los à perda de seus empregos. Os guardas-parque e os guardas-florestais dos santuários de tamaraos são Mangyans compostos por oito tribos em Mindoro.
Segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), esses animais estão classificados como criticamente ameaçados, a um passo de serem extintos na natureza.
Fatos sobre os tamaraos
O tamarao filipino (Bubalus mindorensis), é um bovino tímido, ainda que curioso, também conhecido como búfalo-anão-de-mindoro. É o maior mamífero terrestre das Filipinas. Esse bovino solitário, quando em época de acasalamento, se relaciona ocasionalmente com seu parceiro o ano todo. A fêmea dará à luz após dois anos, e mãe e filhote permanecerão juntos por 2 a 4 anos. Manadas não são comuns em tamaraos, mas pequenos grupos de juvenis já foram vistos.
Tamaraos são ferozes e podem sentir o cheiro de predadores a mais de um quilômetro de distância. Quando encurralados, é um perigo. Se os humanos os perturbam, reagem de maneira violenta. Tamaraos também lutam entre si, perseguindo uns aos outros por até um quilômetro. Quando irritados, abaixam a cabeça e mantêm seus chifres em posição vertical, balançando a cabeça de um lado para outro.
Tamaraos frequentemente descansam nas bordas das matas, entre a vegetação densa. Eles caminham à procura de fontes de água e mergulham em lamaçais. Alimentam-se de uma variedade de brotos e gramíneas. Infelizmente, seu status na UICN pode piorar com a COVID-19.
Pressões da Pandemia
Devido à COVID-19, turistas, trilheiros, conservacionistas e outros viajantes pararam de visitar o Parque Nacional Mounts Iglit-Baco (PNMIB), o maior santuário de tamaraos, com 75.445 hectares, localizado na província de Mindoro Ocidental, na parte central da ilha. 90% das tamaraos vivem aqui. É um Parque do Patrimônio da Associação de Nações do Sudeste Asiático.
Antes da COVID-19, 35 guardas-parque e 24 guardas-florestais administravam o parque. Muitos desses empregados são indígenas, que falam línguas de diferentes tribos. Eles eram responsáveis pela proteção de 2500 hectares do PNMIB, na zona central, trabalhando 22 dias ao mês. Faziam seus turnos regularmente, perguntando a tribos das redondezas como Buhid, Taw’buid e Iraya, que residem na área, sobre caçadores. Os moradores davam informações valiosas aos guardas. Os guardas-parque e os guardas-florestais dobravam suas baixas rendas trabalhando em empregos secundários, como guias de montanha e carregadores de bagagem.
Com a perda do turismo em razão da COVID-19, alguns desses guardas podem perder seus empregos. Com as restrições de deslocamento na pandemia, trabalhadores de diferentes municípios foram proibidos de entrarem no PNMIB. Aqueles que vivem no santuário agora trabalham mais horas para compensar a redução na equipe. Trabalhadores que vivem fora do PNMIB protegem habitats de tamaraos próximos a suas casas.
Em novembro de 2020, a COVID-19 ocasionou um corte de 10% no orçamento para o Programa de Conservação do Tamarao (PCT), totalizando ₱230.000 pesos (aproximadamente R$23.900,00), ou um mês de salário para 31 guardas-florestais e 10 guardas-parque. O PCT permitiu que a Divisão de Gestão de Áreas Protegidas (DGAP) transferisse três guardas-florestais.
Além disso, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – Iniciativa Finanças para a Biodiversidade arrecadou ₱1,1 milhão (R$115.000,00) por meio de uma campanha de arrecadação coletiva, Juntos pelos Tamaraos. O dinheiro pagou os trabalhadores por meio ano.
Com a COVID-19, a caça aumentou. Caçadores possuem armas, enquanto que os guardas não têm nenhum tipo de armamento nem algemas, apenas binóculos e câmeras.
A população de tamaraos
Desde a pré-história, os tamaraos vagam pelas Filipinas. Existem registros de tamaraos em Luzon da época do Pleistoceno. Um tamarao foi descrito em 1888, quando a espécie perambulava livremente pelas florestas de planície e nas montanhas de Mindoro. Nos anos 1900, apenas 10.000 indivíduos prevaleceram, devido à intensa agricultura, agropecuária, desmatamento, caça ilegal e doenças.
Na década de 30, o surgimento da peste bovina (um vírus que hoje está erradicado) atacou animais artiodáctilos (de casco fendido, como bovinos, camelos, girafas, entre outros), matando gado e deixando menos de 100 tamaraos. Em 1996, um plano de conservação para os tamaraos no PNMIB foi implementado. Nos anos 2000, o número de tamaraos chegou a 154. Em 2010, a quantidade quase dobrou, chegando a 300. Em 2018, havia 500 no PNMIB, onde 80% dos tamaraos vivem. Com a COVID-19, esse número caiu para 480. Outros 120 tamaraos vivem em outras áreas de Mindoro, totalizando cerca de 600 indivíduos.
Um local onde ocorrem tamaraos é o Santuário Selvagem de Mt. Calavite (SSMC), na cidade de Paluan, em Mindoro Ocidental. Um tamarao foi avistado em 1992. As buscas por tamaraos vivos continuaram ao longo dos anos, mas nenhum foi encontrado. Baseando-se em rastros e fezes, cientistas estimaram que 15 tamaraos viveram no parque em 2004. Eles voltaram em 2010, 2013 e em 2015. Então, em 2019, um macho jovem apareceu próximo ao topo do Mt. Calavite. Sua presença mostrou que, com cuidado e proteção, a população de tamaraos pode aumentar. Mas sem qualquer avistamento desde então, existe uma preocupação de que os números tenham caído.
Em 2007, um levantamento realizado pelo PCT apontou que existem 16 animais vivendo em Aruyan-Malati. Esse número é resultado de uma pesquisa e entrevistas com moradores locais. A área restrita possui menos de 1000 hectares.
A Ameaça de Caçadores
No fim de agosto de 2020, o capitão Geronimo “Cocoy” Barcena e sua equipe ouviram disparos de armas no PNMIB enquanto realizavam suas rondas. Caçadores ilegais utlizam armas, enquanto que os indígenas usam métodos tradicionais, tais como armadilhas.
Barcena e sua equipe vigiaram a área por 24 horas e viram oito caçadores armados. Eles pediram por reforços. Após 48 horas, restaram apenas dois caçadores. Os 12 guardas-florestais e guardas-parque convenceram os homens a largarem suas pugakang, rifles capazes de abater um tamarao com apenas dois tiros.
Os caçadores pertenciam às tribos Tau Buwid e Buhid, as duas primeiras tribos de Mangyan, que chegaram até Mindoro em uma época em que os tamaraos eram abundantes e, assim, faziam parte de suas dietas. A carne de tamarao, disfarçada de carne seca de veado ou porco, vale aproximadamente ₱300,00/kg. Seu crânio chega a valer ₱4 milhões.
A maioria dos caçadores vive nas planícies e, assim que Barcena e seu time os levaram montanha abaixo em direção a uma delegacia de polícia, os dois caçadores escaparam. Os guardas não eram familiarizados com as planícies, mas continuaram a caminhar até que encontraram carnes de tamarao expostas em pedras para ressecar. O couro e os ossos foram jogados em um riacho. O crânio não foi encontrado.
O PCT e a Divisão de Gestão de Áreas Protegidas (DGAP) aplicaram multas para os dois caçadores de acordo com as leis anti-caça. Eles esperavam descobrir de onde provinham as armas desses caçadores.
Esforços de Conservação
Aqui estão dois dos muitos esforços de conservação no passado e no presente:
- Fazenda de pool gênico. Em 1980, uma fazenda de pool gênico de 280 hectares foi estabelecida pela Universidade das Filipinas, Fundação Los Baños SA, como uma população reserva para os tamaraos selvagens. Em 1982, eles tinham 21 indivíduos.
“Gene Boy”, o primeiro tamarao nascido em cativeiro, morreu em 1991. A maioria dos tamaraos morre em decorrência de doenças. Em 1997, restavam apenas nove tamaraos. E em 2015, apenas um animal nascido em cativeiro estava vivo e sozinho em um recinto de meio hectare.
Kali, nascido em 24 de junho de 1999, foi o último tamarao na fazenda de pool gênico. Seu nome completo, Kalikasang Bagong Sibol, significa “o novo broto da natureza”. Kali viveu mais tempo que sua mãe, e após a morte desta, ficou mais próximo às pessoas que o assistiam no recinto de 2000 metros quadrados.
O guarda-florestal Arnold “Dodong” Roca cuidou de Kali por 10 anos. Kali permitia aqueles em quem confiava que o afagassem. Roca sabia como Kali gostava de sua cama, e durante a noite, o cobria com folhas de bananeira, as quais o tamarao amava. Quando turistas visitavam o local, Roca persuadia gentilmente o tímido Kali, para que as pessoas o pudessem ver de perto.
O líder da equipe, Ronnie Estrella, também se apegou a Kali quando este foi transferido a seus cuidados durante a COVID-19. Kali ensinou Estrella sobre os costumes dos tamaraos e essa elusiva espécie selvagem se tornou mais tangível, real e acessível.
Kali morreu em um sábado aos 21 anos de idade. Estrella foi chamado e imediatamente se dirigiu ao recinto de Kali. O animal descansava no canto mais ao fundo, com algumas bananas mordidas. Era como se Kali o aguardasse, antes de partir, às 14:30, em 10 de outubro de 2020. Neil Anthony del Mundo, coordenador de projeto do PCT e superintendente assistente das áreas protegidas do PNMIB, disse sobre Kali: “Ele não era nosso animal de estimação, mas, de alguma forma, era como um irmão para nós”.
E Kali deixou algo para todos os tamaraos: seu sistema reprodutivo, que foi retirado e preservado para fertilização in-vitro em eventuais programas de reprodução futuros.
- O Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Tamaraos, estabelecido em 2018, durará até 2050. Espera-se que o número de tamaraos aumente nos três santuários existentes, e o plano é de construir mais dois. Essencialmente, prevê-se que os tamaraos estarão prosperando junto com os povos indígenas de Mindoro. Muitas organizações apoiam o plano, incluindo as do Departamento de Meio Ambiente e Recursos Naturais (DMARN):
- A Divisão de Gestão da Biodiversidade
- Programa de Conservação do Tamarao
- Escritório Nacional – MIMAROPA, PENR/CENR
- Escritórios de Gestão de Áreas Protegidas
Eles colaboram com:
- Comissão de Sobrevivência das Espécies da UICN – Grupo Especializado em Bovinos Selvagens, Conservação da Vida Selvagem Mundial
- Comissão de Sobrevivência das Espécies da UICN – Grupo Especializado em Planejamento de Conservação
- Fundação D’ABOVILLE (DAF)
- Fundação de Conservação da Biodiversidade de Mindoro SA
- WWF Filipinas
- Centro para Inovação da Conservação
Eles visam acabar com a caça ilegal, prevenção da disseminação de doenças, manejo de plantas invasoras em territórios de tamaraos, engajamento dos povos indígenas de Mindoro para mesclar suas culturas com a recuperação do tamarao, e cooperação de moradores locais com conservacionistas globais, legisladores e indígenas.
Fatos curiosos sobre os tamaraos
É possível descobrir a idade de um tamarao através do comprimento e espessura de seus chifres.
- Tamaraos adoram descansar enquanto se escondem em meio à grama alta;
- Tamaraos têm como casa as florestas densas;
- Tamaraos gostam de tomar banhos de lama;
- Até então, nenhum predador de tamarao foi identificado, exceto seres humanos.
Tamaraos se alimentam de gramíneas e bambu. Seu papel na sustentação do equilíbrio de ecossistemas florestais e de pastagens é crítico. Eles se adaptam bem às mudanças ambientais. Quando humanos se intrometem, eles passam a ser noturnos. No PNMIB, eles retomaram o modo de vida diurno, talvez devido ao fato de ser um santuário protegido.
Traduzido do inglês por André Zambolli / Revisado por Larissa Dufner