Por Bharat Dogra*
A mudança climática oferece o exemplo mais estranho de um problema, que é ampla e crescentemente reconhecida pela melhor opinião científica disponível, por ser um grande e definitivo perigo às condições básicas de sustento da vida do nosso planeta; e ainda assim, décadas após isso ser estabelecido de forma convincente, permitiram que as emissões que causam esse problema aumentassem além de limites perigosos. Na medida em que lemos as estatísticas verdadeiramente inquietantes dos mais confiáveis especialistas sobre a extrema gravidade do problema, planos confiáveis para soluções oportunas a nível mundial ainda não surgiram (para uma atualização sobre a gravidade da situação, consulte Expert IPCC Reviewer speaks out, by Robert Hunziker, 21 de novembro, 2020, matéria em inglês da countercurrents.org).
É neste contexto que se deve questionar: Não é o momento oportuno para uma reflexão fora da caixa? Com isso refiro-me a ideias que podem não ter parecido práticas até pouco tempo, mas que precisam ser consideradas de forma séria agora, tendo em vista a urgência dos desafios que temos pela frente.
A primeira ideia que gostaria de propor é, de alguma forma, assegurar que não se travem guerras no futuro e, depois, com base nessa garantia, tentar alcançar uma redução de 95% na produção de todas as armas.
Os especialistas tendem a trabalhar em suas áreas de especialização e por isso as estreitas ligações entre o fim das guerras e o controle das alterações climáticas, em geral, não têm sido exploradas. No entanto, as ligações realmente são muito claras. A fim de verificar as alterações climáticas a tempo (bem como resolver outros problemas ambientais que ameaçam a vida), é necessário um grau muito elevado de cooperação internacional. Isso não pode ser estabelecido enquanto a sombra da guerra (talvez até uma guerra mundial) pairar sobre o mundo e houver competição entre as grandes potências em assuntos delicados como armas nucleares, armas autônomas letais e guerra espacial. No entanto, se não houver nenhuma chance de uma guerra futura, então a possibilidade de uma cooperação internacional para controlar as alterações climáticas, e outros problemas ambientais mais graves, pode aumentar drasticamente.
Em segundo lugar, as guerras e seus preparativos são atividades muito poluentes que envolvem emissões muito elevadas de gases com efeito estufa (GEE). Em terceiro lugar, é a possibilidade de guerras que proporciona a principal razão da indústria mais destrutiva e que mais desperdiça do mundo, a indústria de armamento. Uma vez que as guerras forem descartadas, as possibilidades de alcançar o objetivo de 95% de redução de todas as armas e munições podem crescer exponencialmente.
É claro que é muito importante evitar guerras e reduzir o armamento a fim de salvar vidas humanas e reduzir o sofrimento, os benefícios mais diretos e importantes, mas o benefício indireto da imensa contribuição para o controle da mudança climática e outros problemas ambientais também é significativo.
A questão final permanece sendo a de como podemos eliminar a possibilidade de guerras futuras. O maior problema aqui é que futuras guerras e armas estão se tornando tão ameaçadoras à vida que é, cada vez mais, não uma questão de as evitar, mas unicamente de como conseguir isso. Uma vez que os bilhões de pessoas cujas vidas e vozes importam forem convencidas de que guerras devem ser impedidas, assim elas serão. Trata-se de uma questão de esforço humano, sinceridade e sabedoria.
Outra ideia fora da caixa que vale a pena ser considerada é se podemos listar as substâncias mais nocivas em uso generalizado e tentar reduzir sua produção e uso em cerca de 80% em cinco anos através de uma campanha constante. Muitas dessas substâncias são não apenas prejudiciais à saúde, mas também conhecidas por serem grandes poluentes e emissores de GEE. O álcool e o tabaco seriam dois candidatos óbvios para essa lista. Todas as substâncias nocivas usadas atualmente de maneira imprópria na produção de alimentos seriam também classificadas. Muitas outras químicas, substâncias e dispositivos identificados por serem nocivos à saúde, ainda que propagados largamente, também estariam incluídos. Os produtos de luxo utilizados apenas pelos superricos, mas que envolvem enormes desperdícios de recursos, deveriam também ser incluídos nessa lista, embora possam não ser diretamente prejudiciais para a saúde. Vejo isto como parte de um esforço maior, a parte mais óbvia fora da caixa, para repensar completamente o desenvolvimento, o crescimento e a economia.
Outra área em que o pensamento fora da caixa pode ser útil é no contexto de grandes mudanças que são necessárias no governo, incluindo o governo internacional, que pode possibilitar o controle das mudanças climáticas, de outras degradações ambientais e da corrida armamentista antes que seja tarde demais. No entanto, essas alterações devem acontecer no âmbito da justiça, da paz e da democracia, e deve evitar e resistir os esforços de alguns bilionários e outras elites globais com interesses particulares, para desempenhar um papel maior nos assuntos internacionais, em nome de resolver problemas urgentes.
Embora o pensamento fora da caixa neste sentido seja bem-vindo, as soluções altamente arriscadas e imprevisíveis da geoengenharia, que cada vez mais se propõe a checar as alterações climáticas, não são de todo necessárias, uma vez que não é de todo aconselhável tentar resolver os problemas existentes através da criação de novos problemas.
Um simples passo inicial eficaz seria para as Nações Unidas declarar a próxima década como a década para proteger a Terra, argumentando que todas as outras atividades vão manter em vista esse objetivo predominante. Tal declaração seria muito útil para divulgar esta ideia básica, incluindo em todas as instituições educacionais onde as crianças vão começar a perguntar qual é a necessidade desta década de proteção e no processo crescer com uma melhor compreensão das questões mais críticas. Este escritor redigiu uma petição para tal declaração e depois de obter o apoio de muitas personalidades ilustres a enviou ao Secretário-Geral da ONU. (Ver bharatdogra.in para ler o texto da instrução básica).
* Bharat Dogra é autor de vários livros em inglês e hindi sobre o desafio de proteger as condições básicas de vida de nosso planeta, incluindo “O Planeta em Perigo” e “Protegendo a Terra para Crianças”.
Traduzido do inglês por Jenifer Paz Araújo