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Apenas 100 pessoas acompanhavam a primeira transmissão de uma estação de rádio licenciada, que aconteceu às 20h no dia 2 de novembro de 1920. Era a KDKA, de Pittsburgh, e a estação estava transmitindo os resultados das eleições presidenciais daquele ano.
Quando o responsável, Frank Conrad, acionou o interruptor pela primeira vez, ele não poderia prever o quanto a radiodifusão transformaria a vida política.
Durante séculos, os discursos políticos podiam ser apenas lidos. Contudo, a rádio possibilitou ouvir os candidatos em tempo real. De repente, a personalidade deles começou a ter mais importância. O modo como suas vozes soavam fazia a diferença. A capacidade de se envolver e entreter tornaram-se componentes cruciais em suas candidaturas.
A televisão, seguida das mídias sociais, construiria esse desvio drástico que transformaria a política americana para sempre.
E o vencedor é…
Na década de 1890, as ondas de rádio foram transmitidas a longas distâncias pela primeira vez, proeza que levou o engenheiro Guglielmo Marconi receber o Prêmio Nobel em 1909. Até a década de 1910, operadores de rádio amador transmitiam suas próprias vozes e tocavam suas próprias músicas, porém poucas pessoas dispunham de aparelhos de rádio, e nenhuma receita era gerada.
Em 1920, funcionários do inventor e o industrial George Westinghouse, tiveram a ideia de impulsionar vendas via rádio, fornecendo uma programação para a qual um grande número de pessoas poderiam sintonizar.
O homem que tornou essa ideia possível foi Frank Conrad. Natural de Pittsburgh, cuja educação escolar não passara da sétima série, Conrad seria responsável por mais de 200 patentes.
Percebendo que a rádio poderia cobrir a corrida presidencial, ele programou uma transmissão para o dia da votação do ano de 1920.
Naquela noite, daquela que viria a ser a primeira estação de rádio comercial da nação, Conrad transmitiu o resultado das eleições presidenciais de 1920 que colocava na disputa o candidato Democrata, James Cox, contra o candidato Republicano, Warren Harding. Conrad recebia os resultados eleitorais por telefone, e aqueles que o escutavam pelo rádio descobriam o resultado — a vitória esmagadora de Harding — antes de qualquer um ler a notícia no jornal no dia seguinte.
Abre-se caminho para um novo jeito de fazer política
Em 1964, o teórico Marshall McLuhan, famoso por declarar que “O meio é a mensagem”, defendia a ideia de que a forma pela qual uma mensagem é transmitida importa mais do que conteúdo.
As estratégias dos políticos — e suas abordagens durante a campanha — mudaram com o surgimento da estação de rádio.
Durante séculos, o principal meio de divulgação de notícias políticas era a palavra impressa. Quando Abraham Lincoln e Stephen Douglas participaram de uma série de nove debates para o Senado dos Estados Unidos em 1858, no estado de Illinois, os presentes na ocasião somavam-se milhares, mas o número de pessoas que acompanhavam os debates através de extensos editoriais por todo o país somava-se milhões. Os candidatos deveriam apresentar seus argumentos e cada um dos debates tinha duração de três horas.
Até os anos de 1930, os políticos podiam falar abertamente com os cidadãos através da rádio. A Grande Depressão induziu Franklin D. Roosevelt a manter calorosos bate-papos, e durante a Segunda Guerra Mundial, Winston Churchill falou diretamente à população via BBC. O secretário de imprensa de Roosevelt elogiou dizendo que a rádio “não pode ser deturpada e mal interpretada”. Porém, McLuhan a descreveu como um meio “quente”, pois as transmissões dos discursos poderiam incitar emoções de maneira que também possibilitavam a ascensão de governos totalitários como de Mussolini e Hitler.
A televisão assume a posição
Com o passar do tempo, os políticos começaram a se dedicar ao entretenimento para atrair a atenção dos eleitores. Na era da rádio, estrelas como Judy Garland entoavam canções em nome do presidente Franklin D. Roosevelt.
Com a chegada da televisão, a estratégia política mudou ainda mais na direção do espetáculo. A RCA havia testado transmissões televisivas na década de 1930, mas em 1945 havia menos de 10 mil aparelhos de TV nos Estados Unidos. Até os anos de 1950, as principais redes de transmissão — ABC, CBS e NBC — já funcionavam a todo vapor.
Nas eleições de 1952, a campanha de Eisenhower começou a trabalhar com agências de anúncios, e atores como Robert Montgomery foram contratados para desenhar a personalidade do candidato na TV. Mais do que nunca, uma imagem bem lapidada tornou-se fundamental ao poder político.
Até 1960 havia 46 milhões de aparelhos de TV em uso nos Estados Unidos, preparando o palco para que 66 milhões de pessoas acompanhassem o primeiro debate presidencial televisionado, entre John Kennedy e Richard Nixon. Kennedy se colocava bem diante das câmeras, mas Richard Nixon apareceu para o seu primeiro debate com uma aparência pálida, vestindo um terno que não contrastava bem com o set e barba por fazer. A maioria das pessoas que acompanhava o debate pela rádio acreditava que Nixon venceria, mas os telespectadores que acompanhavam pela TV davam a vitória a Kennedy.
São os políticos criações dos meios de comunicação de massa?
Atualmente, as redes sociais têm ajudado a transformar o discurso político, que, para atrair a atenção, vai desde um argumento fundamentado ao uso de imagens e memes. Os políticos, que agora competem com centenas de canais de mídias e meios de comunicação, precisam chamar a atenção dos eleitores e, para tanto, voltam-se cada vez mais ao ponto do ridículo e até ultrajante.
Alguns podem considerar a política moderna como uma profecia de McLuhan: “O político não terá problemas em abdicar a favor de sua imagem, pois a imagem será por si só muito mais poderosa do que ele mesmo.”
A crescente dependência da transmissão da mídia e das redes sociais dificulta focar nos méritos do argumento. Mas o drama visual é algo que quase todos se identificam de imediato.
Poderia Donald Trump ter sido eleito em 1860? Poderia Abraham Lincoln ser eleito presidente atualmente?
Nunca saberemos. Mas se considerarmos as palavras de McLuhan, devemos refletir sobre a possibilidade de que ambos são criações dos meios de comunicação de massa de seus respectivos tempos.
As sociedades democráticas negligenciam os efeitos do novo formato da mídia à qualidade do discurso político sob seu próprio risco.
O governo “do povo, pelo povo, e para o povo” — conforme disse Lincoln — só pode prosperar quando os eleitores são informados através de uma verdadeira e forte troca de ideias.
Traduzido do inglês por Rubia Gomes / Revisado por Isabela Gonçalves