Por Fernanda Perdigão

Análises da lama de rejeitos, da empresa Vale S.A. resultante do rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão em Brumadinho no ano de 2019 no estado de Minas Gerais, apresentam concentrações de elementos químicos como Bário, Cobre, Ferro e Manganês com teores superiores aos preconizados pela legislação vigente. Para o manganês os teores chegaram a ser 27 vezes maiores que os teores médios e para o ferro até 2 vezes.

Os resultados foram apresentados pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, que divulgou o Boletim Epidemiológico do “Um ano do desastre da Vale em Brumadinho”, no estado de Minas Gerais.

O boletim de “Organização e Resposta do Ministério da Saúde”, foi elaborado de maneira coordenada com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) do Município de Brumadinho e com a Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais (SES/MG), tendo também colaboração de órgãos do Governo Federal, para redução de riscos e impactos à saúde em curto, médio e longo prazos.

O Boletim apresenta resultados de análises da lama de rejeitos, de análises de qualidade de água para consumo humano e dados sobre os possíveis agravos à saúde, como doenças e agravos relacionados ao trabalho, para os trabalhadores das áreas afetadas pelo rejeito, intoxicações exógenas (sinais e sintomas devido ao contato com substâncias químicas que prejudicam o organismo das pessoas, podendo provocar danos graves e até a morte), doenças diarreicas agudas – DDAs, Dengue, Chikungunya e transtornos psicossociais.

Quantitativo químicos. Boletim MS

 

As análises de água para consumo humano, o monitoramento indica valores insatisfatórios frequentes para os parâmetros microbiológicos e organolépticos (características que podem ser percebidas pelos sentidos humanos, como a cor, o brilho, a luz, o odor, a textura, o som e o sabor), muito embora tenham sido identificados, pontualmente, valores insatisfatórios para os parâmetros antimônio (também chamado estíbio, é um dos elementos químicos), arsênio, bário, chumbo, cromo, mercúrio, níquel e selênio, que são classificados pela Norma de Potabilidade como substâncias que representam riscos à saúde.

As concentrações detectadas para algumas substâncias superam os valores de risco a saúde sugeridos pela Organização Mundial da Saúde, como alumínio – 0,9 mg/L; manganês – 0,4 mg/L; e ferro – 2,4 mg/L.

Quantitativo água. Boletim MS

 

Além da apresentação das análises quantitativas, o Boletim de “Organização e Resposta do Ministério da Saúde”, cita recomendações como:

“De forma a se caracterizar as rotas de exposição e determinar as implicações à saúde pública decorrentes do desastre da Vale em Brumadinho, cumpre destacar a relevância das Diretrizes para Elaboração de Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana por Exposição a Contaminantes Químicos, publicada pelo MS em 2010 a partir da adaptação do modelo da AT SDR/EUA ao sistema de saúde brasileiro. Sendo assim, o MS recomenda a realização de Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana na região atingida, de modo a balizar a atuação dos serviços de saúde a partir das implicações identificadas pelo estudo.”

Bem como a recomendação, de articulação dos sistemas de saúde com a causadora do dano, neste caso a empresa Vale S.A.

“A complexidade de ações desse tipo deve estar amparada pela estrutura de gestão tripartite do SUS, bem como pelo princípio do poluidor pagador presente na legislação ambiental brasileira, o que demanda articulação com a SES, as SMS dos municípios atingidos e a empresa Vale, responsável pelo desastre.”

Tais informações contendo resultados alarmantes que podem desencadear doenças a curto, médio e longo prazo, reforçam que desastre de magnitudes catastróficas como ocorrido pelo rompimento da barragem da empresa Vale S.A na cidade de Brumadinho (MG), nos mostra que os danos à comunidade atingida ainda estão em andamento, podendo se estender por longos períodos se não tomadas as devidas ações a fim de reduzir, minimizar e ou eliminar as fontes propagadoras dos elementos químicos prejudiciais bem como parâmetros dos sistemas de saúde para recebimentos dos casos e acompanhamento.

Tendo em vista que investigações epidemiológicas conduzidas pelo CEREST de Betim/MG apontaram que, dos 267 Acidentes de Trabalho Graves (ATG) registrados no município de Brumadinho em 2019, 264 (98,9%) estavam diretamente relacionados ao desastre da Vale. Destes, 243 (91%) resultaram em óbitos.

Doenças Diarreicas Agudas, apresentaram aumento após o rompimento da barragem de cerca de 31,22%, dengue e chikungunya um incremento de 4.028% em relação ao mesmo período do ano anterior ao rompimento.

Casos de violência interpessoal e autoprovocada e tentativas de suicídio em 2019, um total de 72 notificações, 23 casos foram de autoagressão e 9 foram tentativas de suicídio, o agravo de episódios depressivos, tiveram em 2019, 993 casos registrados, já o agravo de reações ao estresse grave apresentou em 2019, 672 casos.

As reações ao estresse grave e transtorno de adaptação apresentaram 933 casos em 2019. Os sentimentos de insegurança, a angústia dos familiares e amigos de vítimas fatais bem como a ruptura de laços e rotina, agravam o quadro de doenças psicológicas das comunidades afetadas pelo desastre.

Podemos perceber que os efeitos de um desastre de proporções colossais como o rompimento da barragem da empresa Vale S.A. ocorrido em Brumadinho, não se dissipam em meses, mas, anos, os agravos à saúde vão paulatinamente emergindo.

Assim, podemos afirmar que o desastre está em andamento, mesmo passados 1 ano e 5 meses, os danos às comunidades atingidas não findou, são complexos e precisam ser monitorados, sobretudo subsidiados pela empresa causadora de tais danos.

Tais ocorrências desastrosas não devem se repetir. Hoje, aproximadamente 45 mil habitantes do Município de Brumadinho/ MG, sofrem as consequências ciclópicas deste desastre e não podemos precisar quanto tempo os agravos durará.


¹ Humanista, Atingida pela mineração, Ativista, Ambientalista, Defensora de direitos humanos, Empreendedora Social. Email: nanapoliveira@gmail.com