O Projeto de Lei, proposto pela presidenta Dilma Rousseff, garante 20% das vagas dos concursos aos candidatos negros. A regra valerá por dez anos.
Por Antonio Lassance (*) publicado no Portal Carta Maior
O Senado aprovou (terça-feira, 20 de maio) a reserva de vagas para pretos e pardos em concursos públicos dos órgãos da administração federal.
O Projeto de Lei, proposto pela presidenta Dilma Rousseff, garante 20% das vagas dos concursos aos candidatos negros. A regra valerá por dez anos. O texto segue agora para a sanção presidencial.
Embora seja restrito à esfera federal, espera-se que ocorra uma avalanche de projetos estaduais e municipais para se adotar o mesmo modelo nessas demais esferas.
Pelo projeto, os candidatos deverão se auto-declarar negros na inscrição do concurso. Uma informação importante é que são considerados negros, pela lei (art. 2º), os autodeclarados pretos e também os pardos – ou seja, os descendentes de negros. A classificação usada pelo IBGE nos censos tem sua história contada em sua página (Leia mais http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/caracteristicas_raciais/notas_tecnicas.pdf).
Os órgãos deverão fiscalizar a veracidade dessas informações. Por sua vez, os candidatos que fizerem declaração falsa serão não só eliminados do concurso como poderão sofrer outras sanções, como a de responder a processo por falsidade ideológica.
A cota interfere na classificação, e não na aprovação. Ou seja, a qualidade do recrutamento a ser feita pelos concursos continua preservada, pois todo e qualquer candidato precisa alcançar a pontuação mínima estabelecida pelos editais, podendo ser eliminados com base nos critérios definidos para todos.
Se, eventualmente, não houver candidatos negros habilitados, as vagas serão preenchidas pelos demais que estiverem melhor posicionados na ordem de classificação.
Mais da metade da população brasileira é composta de pretos e pardos auto-declarados. Ou seja, a cota não é para uma minoria, mas para uma maioria pouco representada no serviço público.
Tradicionalmente, os negros são excluídos por critérios que escondem desníveis socioeconômicos profundos e seculares. Esses desníveis continuam existindo, mas passam agora a pesar um pouco menos.
As cotas são um avanço, mas estejamos preparados para o fato de que a nova regra será objeto de muita polêmica – o que é próprio do debate democrático.
Uma parte da sociedade acha que o racismo é algo superado no Brasil. Outra diz que políticas afirmativas são contraproducentes – reforçariam um racismo que, supostamente, não existiria mais.
A tese é desmentida pela estatística dos cargos do serviço público, que mostra uma proporção de pretos e pardos bem abaixo da que existe na sociedade. Como lembrou a Senadora Ana Rita (PT-ES), relatora do projeto na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, entre os diplomatas, apenas 5,9% são pretos ou pardos; entre auditores da Receita, são 12,3%; e na carreira de Procurador da Fazenda Nacional, 14,2%.
Os que são contrários não precisam se preocupar tanto: 80% das vagas estão livres do novo critério.
A lei é um grande passo, mas a caminhada ainda é longa. É preciso, de agora em diante, uma vigilância atenta sobre os editais, para evitar que eles sejam injustos e incluam exigências que tornem letra morta o texto aprovado.
Será preciso também o controle social sobre os órgãos, para que se estabeleçam critérios claros de definição da veracidade de informações. Tão importante quanto a lei é evitar que a conquista seja fraudada por quem não entendeu sua importância e ache que racismo é brincadeira.
(*) Antonio Lassance é cientista político.