O sistema eleitoral norte-americano — como aliás também o britânico — torna quase impossível o aparecimento de terceiros partidos que possam concorrer a sério contra o partido dos “Republicanos” ou o dos “Democratas”. O principal problema é que, qualquer destes dois partidos, está firmemente na mão de oligarcas; As classes trabalhadoras dos EUA, manipuladas pelos média mas também indiretamente beneficiadoras dos privilégios do Império há pelo menos 100 anos, lutam agora pela sobrevivência do mesmo para poderem manter o seu nível de vida, muito embora isso as vá afundar ainda mais…

Este artigo vai ser publicado hoje, a três dias das eleições de 5 de Novembro de 2024 nos EUA. Mas o que vem escrito a seguir é válido independentemente de quem irá ganhar as eleições presidenciais desse dia: Kamala Harris pelos “Democratas” ou Donald Trump pelos “Republicanos”! Porquê?

  • A “guerra civil” a frio entre os “Democratas” e os “Republicanos” nos EUA irá de qualquer forma continuar. Para não falarmos já de que, nesse mesmo dia, serão reeleitos também 1/3 do Senado e 100% da Câmara dos Representantes, duas eleições tão — senão ainda mais — importantes do que as próprias eleições presidenciais.
    A divisão interna dos EUA irá assim como assim aprofundar-se ainda mais depois das eleições. Uma divisão que poderá conduzir a curto prazo a focos de guerra civil localizados e, a longo prazo, até à separação/cisão de alguns Estados da Federação em que se encontram integrados agora.
  • As estratégias dos “Democratas” e dos “Republicanos”, apesar de distintas, são apenas duas estratégias diferentes dentro das classes dominantes, que se encontram portanto divididas.

É sobretudo sobre essas diferenças que quero falar, para percebermos melhor o que está em jogo (e que continuará em jogo depois das eleições):

O partido dos “Democratas” de Kamala Harris, representa atualmente o clássico “deep-state” norte-americano. Baseia-se no sistema da globalização económica e financeira do capitalismo neoliberal (preparado nos anos 198x e implementado em força a partir dos anos 199x) e no complexo industrial-militar expansivo e agressivo para o exterior. É o partido da continuação do “status quo” atual…
De facto, para forçarem a globalização desejada a partir dos anos 1989 (quando o “Muro de Berlim” caiu e o poder dos EUA atingiu o seu auge), os EUA começaram a transferir as suas indústrias para países mais pobres e mais baratos, o que trouxe por um lado mais desenvolvimento para muitos países do chamado “terceiro-mundo”, mas por outro também muitos constrangimentos económicos e sociais para os trabalhadores do “primeiro-mundo” dos ricos. Para consolidarem essa transferência, os EUA precisavam de a acompanhar com mais guerras, o que reforçou as tendências expansionistas e agressivas dos seus militares. Foi assim que – no espaço de apenas cerca de 20 anos! — desencadearam ou provocaram inúmeras guerras por todo o mundo (Sérvia, Afeganistão, Iraque, Líbia, Síria, Ucrânia, etc.), quase todas elas ilegais e contra países bastante mais fracos, mas mesmo assim guerras que os EUA acabaram por perder e que foram acelerar a sua decadência!
Em contrapartida, em termos de política interna os “Democratas” foram liberalizando cada vez mais a sociedade norte-americana, pois precisavam de paz na retaguarda para se concentrarem na sua globalização, e com isso foram inventando cada vez novos campos de diversão, novas liberdades individuais como as questões da sexualidade, do género ou os telemóveis para manterem as pessoas entretidas…

O partido dos “Republicanos”, que até há mais ou menos 10 anos defendia uma política semelhante à dos “Democratas” mas um pouco mais conservadora, virou num partido claramente de extrema-direita desde então. Isso foi resultado do descontentamento da população com a desindustrialização do país e com o aumento da inflação, assim como com a velocidade da introdução das novas “liberdades” individuais para a população, liberdades essas que ofendem as almas mais conservadoras do país, em especial no campo das chamadas Igrejas Evangélicas, que sempre tiveram uma grande influência nos EUA.
Essa reação levou a uma enorme radicalização do partido dos “Republicanos” nos EUA, agora completamente sob o controle de Trump e de forças religiosas e fascistoides, autoritário e iliberal. A maneira de conseguirem votos é bem clara: protecionismo económico, reindustrializar os EUA, combater o défice comercial com o resto do mundo, baixar os impostos … e ao mesmo tempo reduzir os direitos das mulheres e das minorias, sobretudo dos imigrantes, que passam a ser o principal bode expiatório.
De forma a terem as mãos livres para conseguirem tudo isso, os “Republicanos” optaram por uma política externa mais isolacionista e menos intervencionista, uma espécie de “retirada tácita” para não perderem mais guerras, com o que também poderão poupar dinheiro e baixar os impostos.
No entanto, isso não significa que as guerras no mundo se irão reduzir automaticamente se o Trump ganhar! Na Ucrânia, a guerra por procuração da OTAN contra a Rússia deverá antes passar a ser paga e conduzida pelos europeus e, no Médio-Oriente, Israel deverá receber um “salvo-conduto” dos EUA para fazer o que quiser com os palestinianos e o Irão! Por outras palavras: As guerras americanas passarão antes a ser mais frequentemente “outsorced” para as mãos dos fiéis vassalos do Império!

Resumindo e concluindo: os “Democratas” vão continuar a ser mais ativamente agressivos para o exterior dos EUA e mais “liberais” para o interior, e os “Republicanos exatamente ao contrário! E o Império, para sobreviver, vai precisar sempre dessas duas “alternativas”: se a primeira falhar, tem sempre a segunda alternativa da “retirada tácita” no exterior para reganhar forças no interior.

Não nos esqueçamos de que o fascismo sempre foi “o plano B” do capitalismo!