Os eleitores franceses decidiram dar uma última oportunidade aos políticos, concordando, uma vez mais, em bloquear a RN (Rassemblement National, ou “União Nacional”, partido da extrema-direita).

Desafiando todas as sondagens, os eleitores preferiram voltar-se para a NFP (Nouveau Front Populaire, ou “Nova Frente Popular”), que obteve 182 lugares, contra 168 lugares do Ensemble (“Juntos”, do campo presidencial, a ampla direita) e 143 lugares da RN (exrema-direita, incluindo dissidentes dos LR). Os LR (a direita histórica dos Les Républicains, ou “Os Republicanos”, partido conservador) obteve 46 lugares, o resto da direita 14 lugares e o resto da esquerda 13 lugares. Não houve maioria absoluta, o que teria exigido no mínimo 289 lugares.

A taxa de participação na segunda volta foi de 66,63%, a mais elevada dos últimos 27 anos para uma segunda volta das eleições legislativas. A taxa de abstenção registou uma descida acentuada, passando de 53,8% em 2022 para 33,37% este ano. Confrontado com o mundo, o povo francês recusou ser rotulado de racista e de extrema-direita.

Foi uma derrota para Macron, que perdeu a sua maioria relativa na Assembleia Nacional, e uma vitória para a Nova Frente Popular, que ninguém previu que pudesse chegar ao primeiro lugar.

Após o anúncio dos resultados, e para manter a pressão sobre Presidente francês, a Nova Frente Popular reivindicou do mesmo que escolhesse um novo Primeiro-Ministro da Nova Frente Popular.

Como acontece após todas as eleições legislativas, o Primeiro-Ministro Gabriel Attal apresentou a sua demissão ao Presidente Macron na manhã desta segunda-feira, 8 de Julho. Sem surpresa, este recusou-a, tendo pedido a Attal para continuar a ser Primeiro-Ministro “por enquanto”. O Presidente prefere esperar primeiro pela eleição do novo Presidente da Assembleia Nacional, antes de escolher um Primeiro-Ministro para formar o novo governo.

A eleição do novo Presidente da Assembleia Nacional terá lugar a 18 de Julho. O que está em causa: é provável que o Primeiro-Ministro seja do mesmo grupo político que o novo Presidente da Assembleia Nacional. No entanto, esta escolha só pode ser feita com base em alianças, uma vez que nenhum grupo tem uma maioria absoluta: mas alianças de quem com quem?

Macron espera e deseja uma rutura dentro da NFP (Nova Frente Popular), e há muitas divergências de opinião entre os seus membros, apesar de a NFP ter conseguido o que ninguém esperava: unir vários partidos da esquerda para as eleições legislativas, e ter conquistado o primeiro lugar nessas eleições, muito embora sem ter obtido uma maioria absoluta. Desde as eleições presidenciais de 2017, a grande direita e os principais meios de comunicação social veem castigando incessantemente o partido mais forte da NFP, a LFI (La France Insoumise, “A França Insubmissa”, partido de esquerda radical), principalmente o seu líder Jean-Luc Mélenchon, apresentando-o como um inimigo da República. Os políticos da grande direita dizem que estão prontos para formar uma coligação com os socialistas ou os ecologistas [que também fazem parte da NFP], mas não com a LFI. Neste ponto, são unânimes: não trazer a esquerda radical para o governo.

Se o PS (Partido Socialista), os EELV (Ecologistas) e o PC (Partido Comunista, este também parte integrante da NFP, mas só por si sem deputados suficientes para formar um grupo próprio na Assembleia Nacional), se aliarem ao campo presidencial (grande direita), a face política da França transformar-se-á radicalmente, através da criação de uma coligação política entre a grande direita e as esquerdas moderadas.

Será que os partidos políticos da Nova Frente Popular vão cumprir as suas promessas, não se deixando dividir, que recusarão estigmatizar a LFI e resistirão às sirenes do poder? Os truques sujos já começaram…

O partido que trair a Nova Frente Popular da esquerda, trará consigo a derrota das esperanças dum povo. Este é um momento histórico, vêem-se já os primeiros sinais do que poderá vir a acontecer nas eleições presidenciais de 2027. O povo não perdoa. Macron, que pretendia resolver um impasse político dissolvendo a Assembleia Nacional, irá reforçar a extrema-direita. O homem que se gaba de ser o bombeiro número um da França é, na verdade, o incendiário número um!

Estamos, pois, numa situação deste tipo: aquele que perde, fica a ganhar. Não nos enganemos: a RN (extrema-direita) saiu destas eleições mais forte do que nunca. Em 2017, tinha alcançado apenas 8 lugares, em 2022 conseguiu 89 lugares e, agora, em 2024, acaba de ganhar 143 lugares na Assembleia Nacional. A “barragem contra a extrema-direita” está a enfraquecer, e poderá mesmo esmoronar-se em 2027. Devido ao sistema de votação, a RN constitui o terceiro maior bloco na Assembleia Nacional, mas é o maior em termos do número de votos expressos, com mais de 10 milhões de votos obtidos, ou seja, 32,05% do total.

A situação política em França é incerta e a grande questão que se coloca neste momento é a seguinte: quem será o próximo Presidente da Assembleia Nacional e, consequentemente, quem será o Primeiro-Ministro?