Dois novos relatórios revelam a dimensão do apoio militar dos Estados Unidos e dos seus aliados a Israel antes e depois de 7 de Outubro de 2023, assim como uma década de constantes reduções da ajuda à Palestina. Simplificando: os EUA e seus aliados desvalorizam e destroem a Palestina com uma política de entrada de armas e de saída das ajudas.

Na véspera de 7 de Outubro de 2023, os EUA davam a Israel US $59 em apoio militar por cada US $1 que davam à Palestina em ajuda humanitária bilateral. Desde essa data, os EUA já deram a Israel mais de 23 mil milhões de dólares em armas, e desfinanciaram a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), a maior fonte fornecedora de ajuda e de apoio aos palestinos.

O relatório “Who’s Arming Israel (Quem está armando Israel), publicado  pelo Instituto de Jornalismo e Mudança Social em parceria com a “Action on Armed Violence” (Ação contra a violência armada), assim como o relatório “International aid for Palestine (Ajuda internacional à Palestina), também publicado pelo Instituto para o jornalismo e a Mudança Social, revelam o papel dos EUA na violência há longa data contra e na negação dos meios de vida para os palestinos, em particular para aqueles que vivem na faixa de Gaza.

O armamento americano para Israel é um facto bem conhecido. Entre 2019 e 2023, os EUA contribuíram com cerca de 69% das importações de armas por parte de Israel, com base num acordo de 10 anos assinado em 2016 que os obriga a fornecer a Israel US $3,8 mil milhões de dólares em ajuda militar anualmente. O que é menos conhecido é o facto de que, durante uma década, os governos norte-americanos, independentemente da sua filiação republicana ou democrata, desfinanciaram todos a ajuda humanitária aos palestinos.

Entre 2013 e 2022, os EUA reduziram os seus fluxos bilaterais de ajuda para a Faixa de Gaza e a Cisjordânia em mais de 90%. Os aliados dos EUA seguiram o mesmo exemplo: um corte de 74% na ajuda por parte do Reino Unido, e um corte de 30% por parte do Canadá.

Globalmente, e na década em questão, os fluxos anuais de ajuda para a Palestina provenientes de doadores oficiais diminuíram cerca de 15%. A Palestina é o único país na Ásia Ocidental que viu cair anualmente os seus fluxos de ajuda recebida. E esses fluxos teriam caído ainda mais, se não fossem as contribuições de outros países terem aumentado, principalmente por parte do Catar, que reportou mais de US $1,3 mil milhões de dólares em ajuda para a Cisjordânia e Gaza apenas entre 2019 e 2022.

Este programa específico de desfinanciamento sistemático por parte dos EUA e dos seus aliados, surgiu numa altura de grandes necessidades em que 80% da população de Gaza estava dependente da ajuda internacional, de acordo com a ONU. Antes do 7 de Outubro, e de acordo com grupos de direitos humanos, a maior parte da água de Gaza era considerada “intragável” e que “envenenava lentamente as pessoas”.

Desde o dia 7 de Outubro, esta tendência “arms in, aid out” (as armas entram, a ajuda sai) intensificou-se ainda mais, apesar do aumento colossal das necessidades em Gaza e da tomada de posição do mais alto tribunal do mundo, que considera que Israel poderá estar a cometer um genocídio. Em resposta às acusações infundadas do governo israelense contra a equipe da UNRWA, nove dos maiores doadores da agência, que representam mais da metade do financiamento total, incluindo os EUA e o Reino Unido, anunciaram que iriam suspender ou rever seu apoio financeiro.

Em contrapartida, aumentou o fluxo de equipamento militar de apoio a Israel. Desde 7 de Outubro, os acordos de armamento dos EUA ultrapassaram os 23 mil milhões de dólares, tendo sido aprovadas mais de 100 vendas militares desconhecidas a Israel desde então.

A Alemanha é agora o segundo maior exportador de armas para Israel. Em 2023, a Alemanha aprovou a venda de 326,5 milhões em munições para Israel, um aumento de dez vezes em relação ao ano anterior. Esta semana, a Alemanha foi levada ao Tribunal Internacional de Justiça, acusada pela Nicarágua de “facilitar a prática de genocídio” contra os palestinos em Gaza. Os advogados da Nicarágua disseram ao mais alto tribunal do mundo que a Alemanha é “patética” em dar ajuda aos palestinos, mas que vende armas a Israel.

Apesar do governo do Reino Unido afirmar que não forneceu ajuda letal a Israel desde 7 de Outubro, empresas britânicas como a BAE Systems continuam a fornecer componentes militares para aviões de combate israelitas, incluindo F-35. Publicações online do exército israelita mostram F-35 a bombardear alvos em Gaza.

Entre Maio de 2015 e Agosto de 2022, o governo britânico aprovou mais de 448 milhões de libras em armas a Israel, incluindo aeronaves, mísseis e várias outras tecnologias militares letais. Na sequência duma contestação legal apresentada por Al-Haq, uma organização Palestina de direitos humanos, foi revelado existirem 28 pedidos aprovados e outros 28 pedidos pendentes de equipamento militar ao Reino Unido que poderiam ser utilizados pela Força Aérea israelita em Gaza. Não se sabe a que firmas esses pedidos foram dirigidos.

No início de Abril de 2024, mais de 600 personalidades jurídicas escreveram ao governo do Reino Unido pedindo a suspensão das exportações de armas para Israel, a imposição de sanções contra aqueles que incitam a um possível genocídio, e a restauração do financiamento à UNRWA para garantir que a ajuda humanitária chegue a Gaza.

A 9 de Abril de 2024, o Ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, David Cameron, afirmou que o Reino Unido não suspenderia a venda de armas a Israel, após “ter revisto o seu mais recente parecer jurídico.” Os funcionários públicos que supervisionam as exportações de armas para Israel, estão a ponderar uma eventual paralisação do trabalho, devido a preocupações sobre a sua responsabilidade legal.

Os fabricantes de armas que receberam contratos de venda, estão a reportar ganhos recordes,  e os seus executivos estão a lucrar com a venda das suas ações pessoais.

Por exemplo, a BAE Systems reportou lucros brutos de 2,7 mil milhões de libras para 2023, com base em vendas que somaram 25,3 mil milhões. No início de 2024, houve um aumento acentuado nos valores das ações das empresas que vendiam armas às Forças Armadas Israelenses. A Northrop Grumman e a Lockheed Martin, principais fornecedores da Força Aérea israelita, tiveram aumentos significativos no valor das suas ações: as ações da Northrop Grumman subiram 11,43%, e as da Lockheed Martin quase 9% desde 7 de Outubro passado.

O “Who’s Arming Israel”, falando  dalguns dos principais fabricantes de armas do mundo que estão listados como vendedores de armas para Israel, identificou executivos que recentemente lucraram pessoalmente com vendas substanciais de ações. Os principais executivos da BAE Systems General Dynamics, da Rheinmetall e da L3harris Technologies, receberam milhões extra com a vendas das suas ações devido ao aumento do valor das mesmas desde 7 de Outubro.

Enquanto esses enormes lucros continuarem a existir, a destruição da Palestina e a desapropriação do povo palestino também continuarão. É por isso que o agir contra a máquina de guerra de Israel e a sua cadeia de abastecimento global é tão vital.

Cidadãos de todo o mundo estão exigindo que os seus governos acabem com a venda de armas a Israel. Segundo pesquisas recentes, 56% dos britânicos querem um embargo de armas, e apenas 17% se opuseram a isso. Nos EUA, os números são semelhantes, com 52% a apoiar e apenas 27% a opor-se.

Ativistas estão confrontando diretamente a máquina de guerra — e isso está funcionando. A Ação Palestina já conseguiu fazer encerrar fábricas inteiras, e já interrompeu as atividades da Elbit Systems, a maior empresa de armas de Israel.

Ao desmantelar a máquina de guerra, podemos inverter e transformar “arms in, aid out” (as armas entram, a ajuda sai) em: “occupation out, liberation in” (ocupação para fora, libertação para dentro)

Solidariamente,

O Secretariado da Internacional Progressista


Tradução do inglês por André Souza para a PRESSENZA