Querido Micky, como muita gente, estou atônita ao ver o nível de violência empregado pelos militantes do Hamas contra cidadãos israelenses: todos esses atos de barbárie são aterrorizantes!

Mas, em retaliação, a resposta do Estado israelense ao declarar o estado de sítio a todos os palestinos de Gaza é inaceitável e ilegal em termos de direito internacional humanitário. O estado de sítio está colocando em risco a saúde e a segurança alimentar de várias centenas de milhares de pessoas.

Estive pensando em algumas das questões que você levantou em seu último artigo. No entanto, apesar da tragédia que está ocorrendo, acredito que ainda há esperança e, acima de tudo, coisas que podem ser feitas para acabar com toda essa violência.

O meu primeiro ponto diz respeito às relações entre as autoridades israelenses e palestinas. Na verdade, para sair deste círculo vicioso de “violência e vingança”, tanto o povo israelense como o palestino devem compreender que os seus destinos estão ligados. A violência que hoje vivem com tanta intensidade nunca poderá desaparecer se os representantes que estes povos elegem para governar utilizarem a violência nas suas relações com os povos com os quais têm disputas históricas para resolver. Por exemplo, a questão da divisão territorial entre Israel e Palestina está pendente há mais de 50 anos.

De fato, são os governos israelenses e os grupos paramilitares palestinos que escolheram mutuamente, durante várias décadas, manter as relações por meio da violência, da guerra e da agressão e, muitas vezes, as pessoas apoiaram essa maneira de agir.

Acho que é necessário que as pessoas entendam que existem outras maneiras de fazer as coisas. Porque, tragicamente, se as coisas continuarem nesse rumo, parece bastante claro que esses dois povos estão indo direto para mais destruição e caos. Obviamente, é provável que as perdas no lado palestino sejam muito altas, dada a sua situação.

Sabemos que os dirigentes do Hamas e a maioria dos representantes do governo israelense continuarão a utilizar a violência nas suas negociações, sobretudo porque contam com o apoio de vários Estados que também promovem a violência em vez do diálogo e da aproximação.

Você questiona a segurança dos israelenses. Pessoalmente, penso que o povo israelense nunca estará seguro se o Estado de Israel perpetuar a violência nas suas relações com os Estados vizinhos, mesmo que disponha do sistema de vigilância mais sofisticado do mundo. O mesmo acontece com a segurança do povo palestino e de outros países vizinhos que optem pela desconfiança e violência em suas relações com Israel.

O meu segundo ponto diz respeito às pessoas que estão estreita ou remotamente ligadas às autoridades israelenses e palestinas e não desejam que meios violentos nas relações entre os dois povos sigam sendo utilizados. É preciso abrir os canais de expressão. Nos meios de comunicação, nos Estados Unidos, só temos acesso à informação sobre os pontos de vista oficiais que propõem a violência e a guerra. Considero importante difundir outros pontos de vista e mostrar que existem formas não violentas de resolver as disputas e os conflitos.

Pressenza poderia divulgar esses pontos de vista. Talvez poderíamos entrevistar pessoas que propõem formas não violentas. Estou a sua disposição para ajudá-los com entrevistas em vídeo.

Por último, o meu terceiro ponto diz respeito à difusão de práticas de não violência ativa humanista que podem ser propostas a grupos e pessoas na Palestina e em Israel.

Tenho alguns anos de experiência neste campo. Quando eu era membro da Rede Humanista Internacional, fui convidada a trabalhar com vários grupos antagônicos para desenvolver uma rede de formadores em não violência ativa humanista e para desenvolver meios não violentos de resolução de conflitos locais.

Durante esses cursos de formação, juntamente com outros amigos humanistas, pudemos reunir em várias ocasiões indivíduos de grupos que não estavam acostumados a iniciar um diálogo e que eram bastante antagônicos. Por exemplo, policiais e estudantes no Haiti, ou soldados e várias mulheres no Burundi que viveram a guerra civil e a violência nas mãos do exército. No Canadá, trabalhamos com pessoas de diferentes grupos religiosos.

Essas experiências me permitiram entender que, mesmo em situações de forte polarização política, social ou religiosa, sempre há pessoas que querem superar suas diferenças e estão dispostas a conversar com pessoas de outros grupos. Essas pessoas estão dispostas a aprender a resistir à violência e, com o tempo, a se tornarem líderes da não violência ativa. Em suma, reconhecem que seu destino está ligado ao destino de outras pessoas de outros grupos, e que o diálogo e o compromisso são as melhores maneiras de alcançar a paz e melhores condições de vida para seus entes queridos e gerações futuras.

Se você quiser oferecer cursos de formação sobre a não violência ativa humanista em Israel, posso ajudá-lo; por exemplo, poderíamos oferecê-los por videoconferência em inglês.

Espero que esses poucos pontos e sugestões ajudem na sua reflexão. Apesar da tragédia que está ocorrendo ao seu redor, desejo-lhe um excelente dia. Paz, força e alegria!

Anne Farrel, do Canadá


Traduzido do espanhol por Graça Pinheiro