É inegável a importância das telas no mundo hodierno. A maioria de nós, de tão habituada a contemplá-las, não consegue sequer cogitar a ideia de ficar algumas horas distantes delas. Dias, então, nem pensar! Será que esse “fenômeno” é, em parte, nocivo ou tudo não passa de excesso de zelo?
Um estudo conduzido pela Annie Intelligence mostra que o brasileiro passava, em média, quase 6 horas por dia defronte às telas. Durante a pandemia, quando houve um aumento involuntário do uso de internet, uma condição profícua para passarmos ainda mais tempo diante delas, passamos a contabilizar mais de 10 horas diárias colados nos atraentes focos de luz.
Os perigos mais óbvios são relacionados à visão. Quando estamos concentrados, nossos olhos tendem a não piscar e esse comportamento antinatural acaba por trazer muitos problemas. A maneira como interagimos com telas e monitores é diferente da forma como lemos e escrevemos em papel. O brilho, a baixa definição e os reflexos podem gerar uma carga extra que eventualmente provoca ou agrava problemas oculares. Existe, inclusive, uma doença chamada Síndrome da Visão de Computador, que é mais comum do que pensamos.
Contudo, há também problemas tão graves quanto os de visão: os neurológicos. E as crianças e os jovens fazem parte do grupo dos mais afetados.
Em 2022, a dependência de videogames e redes sociais tornou-se oficialmente uma nova doença, tendo o seu próprio CID (Código Internacional de Doenças) registrado. Isso, por si só, já demonstra a crescente preocupação da comunidade médica com a questão.
Diversos pesquisadores ao redor do globo alertam para os impactos negativos que o uso exagerado dos monitores ocasiona no desenvolvimento cerebral. Na França, já correlacionaram a redução do Q.I (coeficiente de inteligência) ao uso de meios digitais.
O Neurocientista francês Michel Desmurget, responsável pelo estudo do Q.I infantil, alerta que pela primeira vez na história temos crianças e adolescentes com coeficiente de inteligência menor do que os da geração anterior. E para o especialista, o responsável é muito claro: a superexposição a telas.
Outros estudos consistentes no mesmo campo determinam que crianças menores de dois anos jamais deveriam ser submetidas a ecrãs. Não haveria um tempo de uso determinado como seguro. A exposição diante deles faria com que as crianças sofressem com um cérebro “menos competente“ para se adaptar.
As “telinhas” nos “agraciaram” com um problema que atinge boa parte da população adulta do planeta: a nomofobia, que é o medo irracional de ficar desconectado ou distante por muito tempo de uma tela. Apesar de não ser oficialmente uma doença, alguns especialistas já cravaram o termo “Síndrome da Dependência Digital” para ela.
Contudo, ainda não é hora de atirar seus televisores, celulares ou computadores pela janela. Apesar de vilões para nossos olhos e cérebros, a indústria das telas investe milhões em tecnologias que possam amenizar os danos que elas mesmas nos causam. É uma mordida com sopro, mas vale tentar.
Hoje, já temos nos computadores e celulares tecnologias como o Night Shift que consiste numa adaptação de luminosidade para um nível adequado aos olhos dependendo da hora do dia e a quantidade de lúmens – unidade de medida de fluxos luminosos – captados pelos sensores dos aparelhos. Não chega a ser um colírio para os olhos, mas é um refresco. E refresco nos olhos é melhor que pimenta.
Há também aplicativos que limitam a quantidade de horas que passamos nos smartphones e computadores. Esses programas podem ser usados para auxiliar os usuários a não se perderem no tempo, bem como podem ser aliados importantes dos pais no controle de horas que seus filhos passam na frente das telinhas e telonas.
Sendo assim, não acho que essas tecnologias sejam descartáveis. Pelo contrário. Neste momento, você, leitor, estará lendo este ensaio no monitor de seu computador ou celular, já que este veículo não possui uma versão impressa. A tela é única opção. E não há nada errado nisso, desde que nos municiemos do bom senso e da parcimônia.
Os ecrãs nos seduzem e nos fazem penetrar em seus sinuosos caminhos, perdendo-nos em seus desfiladeiros e labirintos de hiperlinks, sorvendo cada segundo como um vampiro faminto. Eles têm uma magia única e hipnótica, devo admitir. E há coisas, é claro, que só podemos fazer nas telas e com elas. Não há como ficar completamente alheio. Porém, sempre que for possível, que tal tentarmos dar uma escapadinha dessas “prisões digitais” e olharmos o mundo ao vivo e em cores, mesmo que seja da janela? Acredite: não há resolução melhor. Experimente.