A Chamada Global para a Ação Contra a Pobreza organizou um debate internacional para discutir o acesso mundial a tecnologias em saúde no combate à pandemia. A mensagem a seguir foi escrita por Marianella Kloka, membro da equipe editorial da Pressenza Grécia.

Olá, amigos. Saudações de Atenas, Grécia. Serei o mais objetiva possível.

Visto que somos a Aliança Europeia para Pesquisa e Desenvolvimento Responsável e Remédios Acessíveis (em tradução livre), tivemos a oportunidade – desde o primeiro dia de pandemia – de ressaltar que “uma resposta eficaz requer que todos os recursos médicos necessários estejam isentos de cobrança no local de entrega, especialmente para populações vulneráveis” e que “as instituições da União Europeia (UE) e as autoridades nacionais devem implementar medidas de segurança voltadas ao coletivo e ao bem público, como, por exemplo, transparência no financiamento público, cláusulas de acessibilidade e licenças não exclusivas para a exploração de produtos finais em investimentos atuais e futuros”.

Desde o início da pandemia, os líderes europeus tiveram um discurso confuso, pois às vezes tratavam das vacinas como “bens públicos”, mas em outras a Comissão Europeia (CA) debatia se era pertinente assistir a iniciativa C-TAP da OMS. A C-TAP (Acesso Conjunto a Tecnologias contra a Covid-19) é uma plataforma de solidariedade lançada pela OMS em maio de 2020 que visa compartilhar conhecimento científico, dados e propriedade intelectual.

Quando a produção de vacinas deu seus primeiros sinais de desenvolvimento, a CA estabeleceu pela primeira vez um mecanismo de aquisição conjunta com o intuito de discutir com a indústria ocidental como um mercado único. Essa foi a única conquista da CA durante a pandemia, que se aplica apenas para as vacinas. Em vez de chamar a atenção da indústria farmacêutica para o fato de que os contribuintes europeus assumem os riscos da pesquisa e do desenvolvimento desses novos recursos médicos, os preços e a equivalência entre investimento público e retorno público não foram nada transparentes. A questão das flexibilidades do Acordo TRIPs (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, em português, o mais importante instrumento multilateral para a globalização das leis de propriedade intelectual) encontrou forte oposição entre os líderes da UE, mesmo após o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, se declarar “a favor”. Como resultado, o índice de vacinação nos países da União Europeia é de 75%, mas eles vêm sofrendo com as variantes que requerem doses de reforço da vacina a cada 3 ou 6 meses, o que faz com que ainda mantenham medidas restritivas. Uma pesquisa publicada pela Eurobarometer revela que apenas 53% dos entrevistados aprovam (completa ou parcialmente) a maneira como a UE executa sua estratégia de vacinação. Esses números deveriam levar os líderes políticos a uma séria reflexão.

Em março de 2022, a CA, os EUA, a Índia e a África do Sul finalmente decidiram debater sobre o Acordo TRIPs e suas flexibilidades. Essa iniciativa partiu de uma outra, idealizada pelos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a qual inaugura o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Vacinas do BRICS. O órgão tem como objetivo principal o compartilhamento das melhores práticas e o fortalecimento da cooperação em pesquisas, desenvolvimento, produção e distribuição de vacinas, a fim de garantir sua máxima disponibilidade, já que os BRICS representam 40% da população mundial. Como organizações da sociedade civil europeia, nós recebemos de braços abertos essa mudança tardia na liderança europeia quanto às flexibilidades do Acordo TRIPs, embora a Alemanha pareça relutante. Apenas defendemos que essa iniciativa seja aplicada a todos os recursos médicos (e não apenas às vacinas). Então, como diz Dimitri Eynikel, do Médicos Sem Fronteiras (MSF): “Pedimos que todos os membros da Organização Mundial do Comércio permaneçam atentos ao fato de que esse texto vazado contém sérias limitações e precisa ser melhorado com urgência”.

Sobre ações dentro da UE:

Pedimos a todos que considerem apoiar nossa campanha com os cidadãos europeus, chamada “Sem lucros na pandemia” (em tradução livre), por meio do abaixo-assinado em nosso site oficial. Nossa meta é conseguir um milhão de assinaturas.

A Médecins du Monde apresentou duas observações de patentes de terceiros contra duas solicitações de patentes sobre vacinas para COVID-19 da BioNTech no Instituto Europeu de Patentes. Eles acreditam que ambas as patentes não sejam merecedoras, uma vez que a BioNTech implementou diretamente um conhecimento existente proveniente de vacinas já desenvolvidas para outros coronavírus e vacinas de mRNA. Assim, claramente não há um passo inventivo, já que a ciência já estava ali.

Por último, pedimos que naveguem por esse site, desenvolvido pela Internacional de Ação em Saúde (HAI), e compartilhem-no com legisladores, decisores políticos, pesquisadores e com o público, para que possam entender como usar as flexibilidades do Acordo TRIPs para melhorar o acesso a recursos médicos patenteados. A informação está atualmente limitada aos países-membro da UE e com enfoque no uso de Licença Compulsória, mas o escopo geográfico e pontual será maior no decorrer do tempo.

Solidariedade é um conceito utilizado de maneira indevida. Estamos longe de entender os desafios comuns da humanidade, atualmente divididos e sofrendo com os males de “interesses pessoais” das pessoas ricas e de “interesses regionais” dos países desenvolvidos. Particularmente, acredito que essa consciência global, tão necessária para superar os desafios globais como pandemias, guerras, fome, crise climática, crise energética, catástrofes nucleares, vidas sem sentido etc, tomará forma mais cedo ou mais tarde. Caso contrário, não haverá futuro para este planeta. Portanto, eu me mantenho positiva, paciente e trabalhando duro em prol dos direitos humanos e para que todas as pessoas tenham boas condições de vida, independente de raça, classe social, sexualidade, religião, vida financeira ou qualquer outro status.

Muito obrigada pela atenção.


Traduzido do inglês por André Zambolli / Revisado por Graça Pinheiro