ARTES VISUAIS
Por CWeA Comunicação
A Multiarte e a Pinakotheke Cultural, em colaboração como Instituto Victor Brecheret, apresentam a exposição “Victor Brecheret e a Semana de Arte Moderna de 1922”, de 15 de março a 22 de abril de 2022, na Galeria Multiarte, em Fortaleza.
Com aproximadamente 50 obras, oito delas integrantes do histórico evento no Theatro Municipal de São Paulo em 1922, a exposição destaca, em quatro módulos, raros e emblemáticos trabalhos de Victor Brecheret (1894-1955) e de outros artistas modernistas: Anita Malfatti (1889-1964), Vicente do Rego Monteiro (1899-1970), Zina Aita (1900-1967), Helios Aristides Seelinger(1878-1965) e Tarsila do Amaral (1886-1973).
Outras raridades são as esculturas em terracota “São Francisco com bandolim” (década de 1940) e “Cabeça feminina” (década de 1940), de Brecheret; o desenho “Cabeça de homem (verde)”, 1915-1916, de Anita Malfatti; e três desenhos que Di Cavalcanti fez entre 1917 e 1924 para seu lendário álbum de gravuras “Fantoches da meia-noite”: “Fantoche com baralho”, “Fantoche com leque” e “Fantoche no piano”.
A exposição tem curadoria de Max Perlingeiro e é acompanhada de um catálogo com 84 páginas, com as imagens das obras e textos de Max Perlingeiro e da pesquisadora Daysi Peccinini.
BIOGRAFIAS
VICTOR BRECHERET
Brecheret nasceu em 15 de dezembro de 1894, na cidade de Farnese, província de Viterbo, na Itália, e muito criança ficou órfão de pai e mãe, indo morar com os tios Augusto e Paulina Nanni. Desde pequeno adorava fazer bonecos de barro, que queimava no forno de sua casa. Num certo dia, enquanto caminhava pela rua, encontrou no chão uma revista com ilustrações fotográficas de obras de Auguste Rodin; a descoberta lhe deu inspiração para o que queria ser no futuro: escultor!
Aos 18 anos, começou a frequentar o curso do Liceu de Artes e Ofícios, tendo aulas de desenho, modelagem, entalhe em madeira. Durante o dia, trabalhava na fábrica de sapatos do tio, e à noite, ia ao curso. Após quase dois anos de estudos, um dos professores do Liceu chamou sua tia e lhe disse: “Senhora, nós não podemos mais ensinar nada para esse menino. Ele tem um talento fantástico. Se vocês pudessem levá-lo para Roma ou Paris, ele poderia aprender o que quer. Ele tem muito talento, eu acho que valeria a pena”. A família lhe comprou uma mala nova e uma passagem de navio para a Itália. Em Roma, começou como aprendiz de Arturo Dazzi, escultor clássico e famoso na arte italiana da época. Brecheret amassava o barro, fazia armações para blocos. Aprendeu com Dazzi anatomia humana e animal, a arte de esculpir e ainda a técnica e a maestria na escolha dos materiais. Além de desenhar, Brecheret também fazia suas próprias esculturas num cantinho do ateliê. Durante a noite, frequentava como ouvinte a Escola de Belas Artes. Aprendeu muito com a arte de escultores famosos: Bourdelle, Maillol, Rodin, Ivan Mestrôvic – e este último, iugoslavo, muito influenciou as linhas e o relevo de Brecheret. Sob o impacto de Rodin, o nosso artista se tornaria outro escultor: aprendeu uma nova maneira de conceber a forma, de jogar com a luz. E aos poucos, foi se aprofundando na direção da modernidade.
Em 1919, após 13 anos vivendo, aprendendo, criando e crescendo como artista, voltou ao Brasil. Pediu então a Ramos de Azevedo, diretor do Liceu, um ateliê e este conseguiu numa das salas do Palácio das Indústrias, ainda em construção. Brecheret esculpia solitariamente até que em 1920 foi descoberto por acaso pelos modernistas. Oswald de Andrade, Di Cavalcanti, Helios Seelinger e Menotti del Picchia tinham ido até lá para rir do novo artista que chegara àquele prédio e ficaram, de imediato, fascinados por sua arte. Havia chegado, então, o grande momento de Brecheret.
Naquele mesmo ano, participou do concurso para o Monumento às bandeiras, saindo-se vitorioso. Mas, ao invés de iniciar a construção da obra, por causa da falta de dinheiro do governo para executar o projeto, ganhou um “prêmio de consolação” para estudar em Paris.
Parte em 1921, deixando aqui as 12 peças que exporia na Semana de Arte Moderna de 1922. Ficaria na França, entre vindas e idas, por 15 anos. Neste longo período, expôs individuais em São Paulo e no Rio, participou dos Salões Franceses e ganhou inúmeros prêmios internacionais: com a obra “Sepultamento”, em 1923, no Salon d’Automne; menção honrosa em 1925 no Salon des Artistes Françaises; Cruz da Legião de Honra da França, no campo das Belas Artes, no Grau de Cavaleiro, em 1934. Foi sócio-fundador da Sociedade Pró-Arte Moderna, SPAM, em 1932.
Em 1936, finalmente, iniciou a construção do Monumento às bandeiras, e só o finalizaria em 1953. Brecheret administrava o seu tempo para executar outros trabalhos, fazendo também, neste período, “Graça I” e “Graça II” para a Galeria Prestes Maia, “Depois do Banho”, que se encontra no Largo do Arouche, “Monumento a Duque de Caxias”, no Parque Princesa Isabel. Em 1951, foi convidado para a I Bienal Internacional de São Paulo, ganhando o Prêmio Nacional de Escultura, com a obra “O Índio e a Suaçuapara”.
Os projetos de Brecheret eram muitos, tinha forças inesgotáveis para produzir e criar. Sempre sério, dizia que o artista marca sua passagem nesta vida através dos monumentos que deixa para a posteridade. Estava certo. Faleceu em 1955, de infarte. Mas suas obras, espalhadas pela cidade de São Paulo, transmitem-nos o espírito, a genialidade e a grandiosidade deste escultor.
Fonte: IVB – Instituto Victor Brecheret
ANITA MALFATTI
(1889-1964)
Depois de três anos na Academia de Belas-artes em Berlim, de 1910 a 1913, foi aos Estados Unidos, ao final de 1914, para continuar seus estudos, já que a Europa se encontrava em guerra. Em Nova York, frequentou a Art Students League e a Independent School of Arts entre 1915 e 1916. De volta ao Brasil em 1917, realizou uma exposição cujo resultado desse período de experimentação pode ser visto. Deixou de utilizar o rótulo de “estudos” para afirmar-se como “pintora moderna”, já a partir do título Exposição de Pintura Moderna Anita Malfatti. As obras ali apresentadas revelaram uma nova abordagem da atividade da artista em relação ao período alemão, com um distanciamento cada vez maior do aspecto natural dos motivos, exibindo deformações acentuadas e cores fortes, contrastantes e expressivas, ainda pouco familiares ao ambiente artístico paulistano. Mostrava uma nova pintura, de difícil acesso, mesmo para os espíritos mais cultos do momento.
Na polêmica exposição apresentou 53 obras, entre elas, algumas que se tornaram clássicos, como A estudante russa (1915), Mulher de cabelo verde (1915-1916) e O homem amarelo (1917). A mostra foi um marco para a renovação das artes plásticas no país. A crítica do escritor Monteiro Lobato, sobre a arte expressionista, publicada no jornal “O Estado de S. Paulo”, intitulada Paranoia ou mistificação? serviu de estopim para o Movimento Modernista no Brasil.
Nos anos 1920, abalada com as críticas, a pintora passa a residir em Paris. Depois de um ano longe da pintura, Anita voltou a ter aulas, quando estudou as técnicas da natureza-morta. Nessa época, conhece Tarsila do Amaral. Incentivada pelos amigos, participa da Semana de Arte Moderna.
Integra, ao lado de Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade e Menotti De Picchia, o Grupo dos Cinco.
Em 1928, retornou ao Brasil e passou a ensinar desenho no Mackenzie College e na Associação Cívica Feminina, em São Paulo, atividade interrompida em 1933 e retomada em 1941. Participou da I Bienal de São Paulo em 1951, com sala especial em 1963. Faleceu em São Paulo, em 1964.
EMILIANO DI CAVALCANTI
(1897-1976)
O pintor, ilustrador e caricaturista carioca transferiu-se, em 1917, para São Paulo, onde realizou sua primeira individual e frequentou o curso de Direito, iniciado no Rio de Janeiro. Trabalhou intensamente na imprensa paulista dos anos 1920, tendo participado da Semana de Arte Moderna. Di Cavalcanti era uma figura proeminente na cena cultural de São Paulo e, em 1922, junto com os amigos Mário de Andrade e Oswald de Andrade, idealizou a Semana de Arte Moderna no Theatro Municipal da cidade. Criou para o evento suas peças promocionais, como o catálogo e o programa. Além disso, expôs 11 telas.
Morou em Paris, Rio de Janeiro e Recife, realizando vários trabalhos para jornais da época. Em 1926, no Rio, fez a ilustração da capa do livro O losango cáqui, de Mário de Andrade. Tempos mais tarde, ilustrou livros de Vinicius de Morais e Jorge Amado. Entre os anos de 1936 e 1940, Di Cavalcanti voltou a morar na Europa, muito provavelmente fugindo das perseguições políticas, devido a seus ideais comunistas. Na Europa, expôs trabalhos em Bruxelas, Amsterdã, Paris e Londres e ainda pode conviver com artistas como Picasso e Matisse.
Em 1951, o artista participou da Bienal de São Paulo e, nos anos seguintes, ganhou o prêmio de melhor pintor brasileiro. Na Itália, recebeu o prêmio da mostra Internacional de Arte Sacra de Trieste. Di Cavalcanti foi um dos primeiros pintores a abordar assuntos da cultura brasileira e temas sociais como o samba, os operários e as festas populares, por exemplo. Também abusou de temas que abordavam a sensualidade tropical do Brasil. Entre suas, estão: Pierrete (1922); Pierrot (1924); Samba (1925); Mangue (1929); Mulheres com frutas (1932); Músicos (1963); Rio de Janeiro noturno (1963); Mulatas e pombas (1966) e Baile popular (1972).
Di Cavalcanti faleceu em 1976 no Rio de Janeiro. No ano de seu centenário, em 1997, foram inauguradas exposições de sua obra no Rio de Janeiro (Centro Cultural Banco do Brasil, Museu de Arte Moderna e Museu Nacional de Belas Artes) e em São Paulo (Dan Galeria).
HELIOS SEELINGER
(1878-1965)
Nascido no Rio de Janeiro, foi pintor, desenhista e caricaturista. Formou-se na Escola Nacional de Belas Artes – Enba (1891 e 1896) e frequentou o ateliê dos irmãos Bernardelli: Henrique (1858-1936) e Rodolfo (1852-1931), que o orientam a estudar no exterior. Seelinger partiu para a Alemanha em 1896 e lá estudou de 1897 até 1900. Frequentou as Academias Azbe e de Munique, sendo aluno do pintor Franz von Stuck (1863-1928), por quem foi fortemente influenciado. Nesse período, Stuck também tem como alunos Vassily Kandinsky (1866-1944), Paul Klee (1879-1940) e Franz Marc (1880-1916), artistas com os quais Seelinger possivelmente convive. Incorporou aspectos da estética de Stuck, e seus trabalhos logo ganharam cunho alegórico, povoando-se de figuras do folclore alemão e da mitologia helênica – faunos, centauros e ondinas. Logo inseriu uma iconografia brasileira que se afinava com o espírito panteísta que tinha desenvolvido. Surgiram, então, seus quadros abordando as lendas indígenas brasileiras e as manifestações culturais populares, como o carnaval e a “macumba”, motes que ele explorou até o fim da vida.
Em 1902, já no Brasil, realiza uma exposição individual na redação da revista “O Malho”, com boa parte da produção realizada em Munique. A partir desse ano, participa das Exposições Gerais de Belas Artes e é premiado diversas vezes. Em 1903, conquista o prêmio de viagem ao exterior com o quadro Boêmia, no qual retrata intelectuais do meio carioca, como Gonzaga Duque (1863-1911), Fiúza Guimarães, Luís Edmundo (1878-1961), João do Rio (1881-1921) e Rodolfo Chambelland (1879-1967).
Na segunda viagem à Europa, orientado novamente por Bernardelli, fixa-se em Paris, aperfeiçoando-se com Jean-Paul Laurens (1838-1921). Com o fim da pensão, retorna algumas vezes à Europa até às vésperas da Primeira Guerra Mundial, quando se estabelece definitivamente no Rio de Janeiro. Por volta de 1907, trabalha como assistente de Eliseu Visconti (1866-1944) em Paris. Em 1911, realiza pinturas decorativas para o Clube Naval, no Rio. Atua como ilustrador e caricaturista em publicações como “O Malho”, “Leitura para Todos”, “Careta” e “Fon-fon”, entre outras. É por vários anos funcionário do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), que em 1943 organiza exposição retrospectiva do artista. Faleceu no Rio de Janeiro em 1965.
VICENTE DO RÊGO MONTEIRO
(1899- 1970)
Pintor, desenhista, muralista, escultor e poeta. Os primeiros estudos de arte foram com sua irmã, Fédora, também pintora. De 1911 a 1914, residiu em Paris, onde frequentou a Académie Julian. Em 1914, retornou ao Brasil, fixando-se no Rio de Janeiro. Em 1920, expôs aquarelas em São Paulo e ligou-se aos modernistas Anita Malfatti, Brecheret e Di Cavalcanti. Ainda em São Paulo, conheceu Pedro Alexandrino.
Em 1921, viaja novamente a Paris, deixando aos cuidados do poeta Ronald de Carvalho oito obras que viriam a figurar na Semana de Arte Moderna, em 1922. A partir dos anos 1920, viveu em Paris e viajou por diversos países da Europa, em companhia de seu amigo, o sociólogo e escritor Gilberto Freyre. De volta ao Brasil em 1930, em companhia de Géo-Charles, trouxe a exposição da Escola de Paris, apresentando-a em Recife, no Teatro Santa Isabel; no Rio de Janeiro, no Palace Hotel; e em São Paulo, no Palacete Glória. Fixou-se novamente em Pernambuco por volta de 1932.
Com o Estado Novo, em 1938, foi nomeado diretor da Imprensa Oficial e professor de desenho do Ginásio Pernambucano. Alguns de seus filmes foram exibidos na França. Em 1939, editou junto com Edgar Fernandes, a “Revista Renovação”, dedicada à educação popular. Promoveu em Recife e em Paris congressos de poesia, com a colaboração dos poetas João Cabral de Melo Neto, Ariano Suassuna, Carlos Moreira e Edson Régis. Em tais cidades publicou diversos livros de poesia. Sua obra integra importantes acervos de museus brasileiros e europeus.
Até os anos 1950, alternou residência entre Paris e o Brasil. Em 1957, foi contratado como professor da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Pernambuco. Vicente do Rêgo Monteiro faleceu no Recife em 1970. Em 1971, o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo montou uma retrospectiva de seu trabalho. Nova retrospectiva foi inaugurada em 1986 na Villa Géo-Charles, em Échirol-les (França). Em 1987 e 1994, Jean Boghici organizou duas exposições do artista em sua galeria, no Rio de Janeiro. Em 1997, o MAC-USP inaugurou nova mostra, sob a curadoria de Walter Zanini.
ZINA AITA
(1900-1967)
Tereza, chamada Terezina, depois simplesmente, Zina, nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais. Estudou em Florença, entre 1914 e 1918, com Galileo Chini (1873-1956) na Accademia di Belle Arti di Firenze. Quando retorna ao Brasil, faz contato com Manuel Bandeira (1886-1968) e Ronald de Carvalho (1893-1935) e amizade com Anita Malfatti (1889-1964) e Mário de Andrade (1893-1945). Realiza a primeira individual em Belo Horizonte, em 1920, sendo considerada precursora do modernismo em Minas Gerais. Faz nova individual na livraria O Livro, em São Paulo, e participa da Semana de Arte Moderna, ambas de 1922. Nessa época, realiza ilustrações para a revista “Klaxon”. Sua produção é pouco conhecida, e grande parte de suas obras não tem data. Em tal período, aproxima-se do movimento Art Nouveau e do pós-impressionismo. Participa do 1o Salão da Primavera, no Rio de Janeiro, em 1923. Em 1924, muda-se para a Itália e reside em Nápoles, onde dirige uma fábrica de cerâmica. Nos seis anos seguintes, realiza estudos em Roma, Florença, Milão e Veneza.
Em 1990, o Museu de Arte da Pampulha (MAP) apresenta a mostra Zina Aita: 90 anos. Walter Zanini, na publicação de Jeanne Milde,, por ocasião desta mostra, diz o seguinte: “[…] Desde logo se delineara uma tendência decorativista em sua produção – fruto, é certo, do aprendizado com Chini – como indicam os títulos de três das oito obras exibidas na Semana de Arte Moderna: a de no 47, Paisagem decorativa, a de no 48, Máscaras siamesas e a de no 51, Painel decorativo”. O material apresentado dispersou-se, mas a pequena e conhecida cena de operários calçando uma rua, que subsistiu, documenta o uso de defasada técnica divisionista. Yan de Almeida Prado trouxe o testemunho de Zina Aita como expositora de 1922 que mais agradou ao público. É bem provável que, para isso, concorresse o lado decorativista da pintora, um traço característico de sua personalidade. Desse interesse que suscitou é evidência ainda a bem-sucedida mostra na livraria de Jacinto Silva. A artista faleceu em Nápoles, em 1967.