“Acuso o homem branco de ser o maior assassino da face da Terra. Acuso o homem branco de ser o maior criminoso que há neste Planeta. Não há lugar neste mundo em que o homem branco possa ir e que possamos dizer que criou paz e harmonia. Onde quer que o homem branco vá, ele cria o caos. Onde quer que o homem branco vá, ele causa destruição”, disse Malcolm X, fazendo um resumo eloquente – e preciso – dos últimos 300 anos do imperialismo ocidental.
Por Maitreya Bhakal
Recentemente, poucos são os exemplos dessa barbárie Ocidental que melhor se enquadram nessa fala do que a invasão dos EUA ao Afeganistão. Embora não nas mesmas proporções da invasão que promoveu ao Sudeste Asiático, ainda assim, foi altamente devastadora. Os EUA não implantaram armas químicas no Afeganistão (até onde sabemos) como fizeram no Laos e no Vietnã. Enquanto os bombardeios estadunidenses no Afeganistão foram brutalmente destrutivos, já os bombardeios no sudeste da Ásia continental foram absolutamente genocidas (ressalve-se que ele perdeu essa guerra também).
Hoje, ao serem finalmente forçados a deixar o país em que passaram 20 anos destruindo, os Estados Unidos conseguiram que o país ficasse no pior estado possível. Foi o chute pelas costas dos EUA em uma nação e no povo que não conseguiu subjugar – esse último ato de crueldade custou caro a milhões de civis afegãos inocentes.
Aos olhos da opinião pública, a invasão ao Afeganistão foi empreendida como forma de vingança pelos ataques de 11 de setembro, sobre o qual os EUA alegam terem sido realizados pela Al-Qaeda e por seu líder, Osama Bin Laden, que se acreditava estar sob a proteção do Talibã, o regime que governava o Afeganistão na época. Outro fator que também ajudou foi a localização geopolítica estratégica daquele país.
As guerras do povo
De acordo com os dados oficiais dos EUA, 2.996 pessoas morreram devido aos ataques de 11 de setembro, dos quais 2.605 eram cidadãos estadunidenses. O governo dos EUA imediatamente enxergou nesse ato como uma oportunidade. Explorou os ataques e as mortes – e a simpatia global que geraram – como desculpa para aumentar sua influência geopolítica e a presença física no Oriente Médio.
Mesmo antes da contagem de mortos, o governo entrou em cena e canalizou, com sucesso, o choque e a raiva da opinião pública em apoio às ações militares. O consentimento foi dado quase imediatamente. Uma pesquisa realizada apenas um mês após os ataques revelou que 88% da população apoiavam uma invasão do Afeganistão.
O que não chega a ser uma surpresa. A guerra tem sido frequentemente popular nos EUA – desde que poucos estadunidenses sejam mortos, ao contrário do que aconteceu no Vietnã. A grande maioria da população dos EUA também apoiou a invasão do Iraque, em 2003. Recentemente, um em cada três estadunidenses afirma que apoiaria uma invasão à Coreia do Norte, até um ataque nuclear, mesmo sabendo que isso mataria um milhão de pessoas.
Malfeitores e mal perdedores
O nível de maldade dos EUA é compatível com a sua incompetência. Apesar de serem viciados em guerra, os EUA venceram poucas delas. Desde a Segunda Guerra Mundial, as forças armadas estadunidenses, sempre com o dedo no gatilho, têm experimentado uma sucessão de derrotas e objetivos fracassados, seja na Coreia, no Vietnã, no Iraque, no Afeganistão, na Síria ou em quaisquer outros lugares no mundo.
No Afeganistão, uma das metas que estabeleceram era pôr as mãos em Osama Bin Laden. E eles conseguiram – só que no Paquistão. No entanto, a Al Qaeda ainda está viva (embora enfraquecida) – apenas sob nomes diferentes. Os EUA também afirmaram que queriam transformar o Afeganistão e do Iraque em “democracias”. O que se alcançou, em grande parte, foi o oposto a esse objetivo; ambos os países dificilmente se enquadrariam como belos exemplos de democracia, hoje em dia.
A “Guerra ao Terror” lançada pelos EUA – da qual a guerra no Afeganistão foi um pilar fundamental – só fez aumentar o terrorismo. Além disso, dizimou um milhão de pessoas e deslocou outros 37 milhões. Mais ainda, serviu para criar o ISIL (Estado Islâmico do Iraque e do Levante). A guerra fracassou por não acabar com a Al Qaeda e possivelmente criou mais grupos terroristas do que os que conseguiu destruir. Toda a região foi devastada, e milhões de vidas foram arruinadas.
Era quase como se os EUA tivessem um toque de Midas às avessas: tudo o que eles tocam se transforma em pó.
Cérebro, músculos e orçamento
A retirada do Império dos Estados Unidos do Cemitério de Impérios representa uma admissão colossal de derrota. É profundamente humilhante para a superpotência não alcançar a vitória mesmo após 20 anos de guerra e ocupação, um país que detém as forças armadas mais poderosas e ricas do mundo. O governo provavelmente pensa que, uma vez que a guerra já deixou o foco da opinião pública no país, sua utilidade como distração para os problemas domésticos passou a ser limitada. Matar aqueles muçulmanos malvados no Afeganistão já não tem mais a serventia de antes.
O regime Talibã que o governo dos EUA prometeu destruir, está mais forte do que nunca. Os EUA e a OTAN gastaram milhões de dólares treinando e equipando as forças de segurança afegãs. Em vez disso, o que eles conseguiram foi torná-los tão incompetentes quanto seus instrutores.
Atualmente, o Talibã agora controla cerca de um terço das províncias e centros administrativos distritos e centros distritais do Afeganistão. Muitos deles foram conquistados sem luta; o Exército afegão simplesmente se rendeu e fugiu.
A ocupação dos EUA pode ter acabado, mas para o povo afegão, há pouco alívio. Os EUA deixam o Afeganistão em um estado pior do que encontraram ao ocupar o país. A nação afegã será novamente governada pelo próprio regime que os EUA prometeram derrubar. Depois de 20 anos e 200 mil mortes, o Afeganistão está de volta à estaca zero.
Nota do Editor: Maitreya Bhakal é um comentarista indiano que escreve sobre a China, a Índia, os EUA e sobre questões globais. O artigo reflete as opiniões do autor e não necessariamente as opiniões da CGTN.
O artigo original pode ser encontrado aqui
Traduzido do inglês por Doralice Silva / Revisado por José Luiz Corrêa