OLHARES

 

 

Por Clementino Jr.

 

 

“Difícil dizer o que incomoda mais, se a inteligência ostensiva ou a burrice extravasante.”
(Stanislaw Ponte Preta)

 

Episódio 1 — O Ovo
Em um momento da vida, em alguma série, aprendi sobre a história. Sim, aquela contada à moda europeia, em que aquele europeu que encobriu a América, o Colombo, em um banquete acerca desta “encoberta”, foi questionado sobre ter feito algo que qualquer um poderia fazer. Daí ele desafiou aos presentes que conseguissem colocar um ovo em pé. Todos acharam fácil, mas não conseguiram colocar o ovo em pé na mesa. Ele, então, fez o truque que se perpetuou: pousar o ovo na mesa com força suficiente para rachar a extremidade de baixo, criando uma base que o sustentasse. Diante das indagações no estilo “assim até eu faria!”, ele teria mencionado: “mas precisou alguém fazer primeiro para que todos o soubessem como fazer”. E aí notem que, para ele fazer isso, alguém fez antes. Só assim ele soube como utilizar e se apropriar do uso do truque para transformar numa metáfora e, desta metáfora, uma argumentação diante de um questionamento. O homem do ovo em pé era cheio de truques e enrolou muita gente. E seu truque maior matou mais gente ainda, levando doença e morte ao “novo continente”, em busca de riquezas e em nome de Deus.

Episódio 2 — O Cacau
Cada chocolate que é consumido no mundo vem do Cacau extraído, em sua grande maioria, de 4 países africanos. Nestes países, as grandes empresas nada fazem — visando o lucro — para acabar com a exploração de mão-de-obra escrava nestes países, em grande parte realizada por crianças e adolescentes, que nem conseguem ir à escola para estudar em função do volume de produção. Tudo isso para garantir que, na segunda páscoa pandêmica, as mães pobres (pretas, em sua maioria, assim como seus filhos) se aglomerem diante de lojas, como, por exemplo, uma homônima à encoberta pelo “navegador do ovo em pé”. Isso tudo para garantir uma alegria de algumas horas para crianças pobres e pretas, como aquelas que não estudam para garantir esse produto que não se configura como um alimento essencial e nem cristão, como a missão do europeu, ou de um dos assassinos que o sucedeu nas navegações e levou mudas deste fruto sagrado para os Astecas até o continente africano.

Episódio 3 — O Rabo Preso
Ao contrário do termo popular “sair com o rabo entre as pernas”, onde alguém que foi humilhado, exposto ou superado, por medo de persistir no sofrimento, assim como um cão medroso, sai com o rabo entre as pernas e a coluna arqueada, o termo “rabo preso” é menos referenciado ao povão, mas às figuras poderosas e impunes. Aquelas que não se veem em situações, mesmo em denúncias graves, de humilhação, pois quem poderia puni-las está de rabo preso com elas. Em suma, também tem o “teto de vidro” e podem ser denunciadas. Aí, para não “perder a piada”, puxo uma frase descontextualizada — um clássico na argumentação de defesa dos políticos — para fechar a definição do “rabo preso”, dita por um histórico técnico e futebolista: “O empate é o melhor resultado”.

Epílogo — E o burro?
Assim como o “encobridor” do novo mundo, o burro teve a necessidade de fazer algo que ninguém tinha feito antes, mesmo desprovido de caráter e criatividade, para que outros fizessem depois, como ele crê que façam. Para ele, não se faz omelete sem quebrar uns ovos. Sendo assim, ele não racha apenas o ovo para deixá-lo em pé. Ele quebra vários protocolos estabelecidos para que nem as crianças tenham pais para comprar ovos de Páscoa, pois, afinal, nos cálculos brilhantes do burro, ele esquece que quem fabrica ou quem trabalha também é um consumidor. E se os consumidores morrem, quem, ao final das contas, pagará os chocolates? Vão quebrar as franquias de chocolates com essas e outras atitudes, não? Se ao menos as demandas dos mercados, por si só, acabassem com o trabalho escravo e infantil nos países produtores, ou até em nosso território… Mas é só diminuição do público consumidor mesmo. Mas o rabo, que fisicamente só existem em outros animais, inclusive no burro, está bem amarrado e não há com o que o burro se preocupar, pois, no máximo, seus algozes vão chamá-lo do que ele é com mais algum adjetivo ou comentários jocosos. E pensar que o Jacaré virou o bicho símbolo dos novos tempos, simbolizando liberdade de opção, e que até o opositor do burro “já-careou”… e olha que o rabo do jacaré é maior que o do burro, assim como a boca. E agora ele está livre. Provavelmente o próximo passo para o burro é, além do rabo, ser preso, para que eu possa concluir com Sergio Porto:

“Política tem esta desvantagem: de vez em quando o sujeito vai preso em nome da liberdade.”
(Stanislaw Ponte Preta)