OLHARES

 

 

Por Clementino Jr.

 

 

The big bang, took and shook the world
Shot down the rising sun
The end was begun, it would hit everyone
When the chain reaction was done
The big shots, try to hold it back
Fools try to wish it away
The hopeful depend on a world without end
Whatever the hopeless may say

big bang, veio e sacudiu o mundo
Atingido pelo sol nascente
O fim começou, iria atingir a todos
Quando a reação em cadeia foi feita
Os grandes planos, tente segurá-lo
Os tolos tentam ignora-lo
Os esperançosos dependem de um mundo sem fim
O que quer que os desesperados possam dizer
(Manhattan Project — Rush — Power Windows — 1985 — tradutor deepl)

Acredito que o primeiro raio de luz a fazer o maior ensaio fotográfico do mundo foi o chamado Big Bang. A tal explosão, ou reação, que gerou o universo deve ter disparado uma luz tão intensa que “queimaria qualquer filme”, até porque foi uma luz, se pensarmos em Deus, muito bem pensada para o primeiro retrato do universo.

fotografia costuma congelar o tempo a partir de momentos mortos. Enquanto escrevo, o momento de meu dedo na tecla da letra anterior já se foi, mas fora a lembrança de ver este momento e guardá-lo na memória, só uma fotografia para preservar esse momento para “além da vida”. Sim, os momentos morrem, pois o tempo progride, o relógio segue e a fila anda. Mas as representações deste momento permanecem e, por vezes, um retrato e, antes da fotografia, uma escultura ou pintura eram as formas de manter vivas as representações do real para além da vida desta “realidade”.

Por este raciocínio, posso falar que toda a fotografia de alguma maneira fala sobre vida e morte, pois, mesmo em registros de uma rua ou praça no século passado, ou por um selfie de hoje à tarde, aquele momento morreu no real e persiste enquanto representação, enquanto referência para o futuro.

O que me faz visitar nesse momento essas reflexões, que costumo usar em aulas de introdução ao cinema quando falo sobre ótica, ou sobre documentário, ou até sobre atenção ao objeto de cena, foi o gatilho — ou disparador — vindo das redes sociais. A morte do momento no retrato está cada vez mais metaforizada no resgate desse momento morto para anunciar o obituário de pessoas queridas diariamente nas redes. Esse ano de pandemia, respeitando ou não o distanciamento social e os protocolos de saúde, transformou os espaços típicos da vaidade ou do chamado “hedonismo” em espaço de lamentar, de expor suas dores e perdas. Exceto os serumaninhos cuja essência é tão ruim, egoísta e sem valor ou moral, do tipo que nem o vírus quer se instalar nesses corpos, todos que conheço em algum momento nos últimos meses já postaram uma foto anunciando um familiar, amigo ou pessoa que morreu por consequência de contaminação pelo COVID-19. Estamos em um momento em que, ao ver uma foto de um aniversariante, já nos preparamos para escrever as condolências até perceber que a foto ali, quase como uma exceção à regra, é a celebração da vida de uma pessoa em meio à catástrofe. Ou de celebração de alguém que superou aquele contágio.

interpretação das fotos tem sido tão rasa e veloz como a dos textos nas redes e, mesmo quando escrevo textos assim, sei — como nos clichês de quem segue as correntes nas próprias redes — que nem todos costumam ler até o fim. No entanto, é importante respirar antes de interpretar o que significa a postagem daquela foto e se o texto que a acompanha demonstra que o retrato não está ali “retratando o óbvio”, mas um momento de alguém que, naquele momento, tem um significado que se deve ter uma atenção.

Este momento, palavra aqui tão repetida e frágil, exige exatamente isso: atenção e uma reação sempre positiva, nunca aguardando o que julgamos óbvio. Uma foto em rede social, pode não anunciar a morte, mas pode ser um pedido de socorro, um anúncio de superação, uma referência de algo que está mudando com uma pessoa, uma família ou um grupo. Atenção. A mesma atenção que, em um momento certo, pode produzir uma foto linda que servirá para boas lembranças, para abrir oportunidades ou para você estar vivo e refletir sobre o que houve entre o registro e a observação dele.

No espiritismo, o flash que começou tudo é também o caminho de saída — ou quem sabe de retorno. Sendo assim, se o que chamamos de fade out no cinema, o apagar das luzes, se faz frequente, utilizemos nossos flashes para garantir as memórias e, quem sabe com esses disparos luminosos, fazer cada foto de um feed alimentar um ambiente onde tudo o que pensamos planejado pelo tal Big Bang se fez antes do caos.

A foto é uma representação, mas se o real não está bom para todos, mudemos o ângulo, a lente, pensemos a fotografia antes do disparo. Os serumaninhos citados serão lembrados mesmo não estando em quadro na hora da foto, mas o enquadramento que faremos sem eles será ideal para que as melhores memórias, relacionadas à vida e à esperança sejam as mais curtidas.