O maior sucesso da Operação Lava Jato foi o controle da narrativa dos fatos, dos tempos e dos modos com os quais esses mesmos fatos eram direcionados “para os devidos fins”. O controle da informação e, principalmente, de sua divulgação, nunca seguiram os padrões jurídicos ou as regras do sistema penal. Episódios execráveis como a infantil apresentação de PowerPoint como “prova” do envolvimento de Lula em todo tipo de falcatrua, ou os vazamentos seletivos de informações colhidas ilegalmente, direcionaram não somente as investigações, mas a opinião pública condicionando a política do País.
As entrevistas, as opiniões emitidas pelos magistrados durante o andamento dos processos, a tomada de posicionamento a respeito de fatos em via de apuração, formaram e abasteceram o caldeirão de ódio servido quente a um País sedento de vingança e sangue. O resultado foi o nascimento e a proliferação desastrosa do bolsonarismo, movimento ao qual os principais expoentes da Operação Lava Jato aderiram.
Dezenas de juristas de fama internacional insurgiram denunciando ao mundo tamanha aberração jurídica. O processo farsa que condenou o presidente Lula foi amplamente contestado por Luigi Ferrajoli, um dos maiores juristas do mundo, perante a comissão dos assuntos exteriores do parlamento italiano, com a intenção de informar a comunidade internacional e fomentar uma campanha em favor da democracia jurídica e do respeito das regras processuais amplamente violadas. Veja o vídeo:
Durante muito tempo, ouvimos o juiz Moro comparar a operação Lava Jato em sua ação contra a corrupção, à Operazione Mani Pulite, a grande investigação italiana que revelou a fragilidade do sistema de controle democrático sobre os partidos de governo. Durante muito tempo ouvimos o juiz Moro ser comparado, ou até mesmo, se comparar com Giovanni Falcone, o magistrado italiano assassinado pela máfia em 1992. Falcone, Moro, Mani Pulite e Lava Jato, eram assim apresentadas como um unicum histórico, cujas ações e efeitos eram (e muitas vezes ainda são) comparados e avaliados sem alguma cognição das verdadeiras – e pouquíssimas – semelhanças e, principalmente, das reais e enormes diferenças.
Giovanni Falcone, na década de 1980, indagou e desmantelou a Cosa Nostra, a Máfia siciliana, a partir das revelações de “colaboradores de justiça”, mafiosos que decidiram falar para obter descontos de pena e a proteção do Estado. Suas investigações desvendaram aquilo que todos sabiam, mas que ninguém tinha tido a capacidade de destrinchar: a união entre o poder político e as associações mafiosas. Centenas foram presos e condenados no maior processo contra a Máfia já realizado na Itália. Mas o monstro estava vivo. Uma bomba explode à passagem do juiz que morre na hora com a mulher e os homens da escolta. Era 23 de maio de 1992, na proximidade de Palermo, a capital da Sicília.
A Operazione Mani Pulite, Operação Mãos Limpas começa em Milão em 1992, deflagrada por um episódio de corrupção que envolvia uma “normal” troca de favores entre um expoente local do partido da situação e um empresário cansado de pagar propina. A escuta e a câmera escondida revelaram aquilo que no Brasil estamos cansados de ver: maços de notas saírem de um bolso para entrar em meias, cuecas e em obscuras anatomias. Só que desta vez foi diferente.
O político local, preso, decidiu falar. Revelou assim um complexo esquema que chegava até direção nacional do partido, onde a propina e as transações ilegais envolviam o orçamento geral do Estado. A investigação foi em frente, até o governo, o primeiro ministro, às forças políticas que desde a fundação da República Italiana, governavam o país. O sistema político desmoronou, os partidos históricos se dissolveram.
A principal força da esquerda, o Partito Comunista Italiano, havia deixado de existir desde 1991, sob a onda do fim da União Soviética. Desta desestruturação sistêmica, desse cataclismo institucional, surgiu a vontade de algo novo, antipolítico, que falasse a linguagem simples das pessoas e desse prioridade não mais a tudo que está aí, mas à honestidade. O resultado foi a eleição de… Silvio Berlusconi.
Isto posto, declaro que:
– A relação entre Sergio Moro e Giovanni Falcone, não existe.
– A Lava Jato sequer chegou a assustar os partidos e o sistema enquanto tal, como a Mãos Limpas. Pelo contrário, sendo ela mesmo uma operação corrupta pela sanha justiceira, permitiu ao “sistema” se aproveitar disso para fortalecer e amarrar os laços impenetráveis que protegem, e favorecem, o eterno renovar-se do fisiologismo e do tráfico de influências.
– O juiz Moro se tornou ministro, ajudou na edificação do fascismo, compartilhou do horror, e pediu pra sair quando viu seu ambição bater de frente com a incontinência verbal do seu chefe.
– As revelações do site The Intercept, não surtiram efeito, a narrativa vendida pela Lava Jato continua tal e qual.
Resumindo. Mani Pulite e Lava Jato, nada a ver. E que antes de falar do juiz Giovanni Falcone, herói italiano na luta contra a máfia, à imprensa estude, ou pelo menos, procure no Google. E que Sergio Moro, o ignóbil, lave sua boca e meça as palavras.