MÚSICA
Por Brenno Sarques
Too old to rock n’roll but too young to die. O rock vinha sendo uma das minhas maiores fontanas musicais, se não a maior, e matriz cultural de minha formação de caráter e visão de mundo nos últimos 28 anos. Vinha. Mas o desencanto que vez por outra precisa abater o ser humano para que possa limpar as lentes da vida e se reinstalar no tempo veio-me arrancando as máscaras que vestia para o público e para minha consciência e, por incrível que pareça, faz-me muito bem.
Não se trata de dizer que o rock morreu, que o rock é rebeldia, é liberdade, é isso ou aquilo. Isso é só propaganda. O papel que o rock ocupou no cenário cultural amplo – das artes, dos costumes, da sintonia com o tempo histórico – tem sua importância carimbada pela própria sociedade. Porém, seja pela enorme incapacidade interpretativa de boa parte da nossa população, seja pela pecha que o rock carrega desde woodstock ou, principalmente, pelo fato de que o mundo mudou mais nos últimos dez anos do que nos 50 anos anteriores, rock n’roll is not pollution, mas hoje representa o atraso, o arcaico, o reacionário e uma tremenda falta de criatividade musical.
Há exceções, claro, tanto nas bandas quanto nos seus ouvintes. Mas a verdadeira ojeriza que criei acerca desse universo cultural, visto que o rock vai muito além da música, deixa pouco espaço e paciência para seguir curioso sobre as novidades do mercado.
Falo porque ainda resta um voto de respeito ao rock, e me vi empolgado em assistir o clipe do novo single do AC/DC, “Shot In The Dark”. Feito amnésia em um coração ferido, acessei o link e me descontentei ao assistir pouco menos que um minuto da novidade. O riff de Angus Young me levou de imediato a um loop em que todos os riffs e canções se misturam, formando uma só melodia, o que, de fato, está bem perto de ser. Fora o mesmo riff de sempre, o mesmo figurino, o mesmo passinho com a guitarra, o mesmo layout de 45 anos de banda. Chega!
Chega de velhos infantilizados acordando meu filho com suas harleys sem escapamento. Coisa de um mau-gosto tremendo, uma falta de educação e empatia com que precisa dormir ou não quer ser incomodado de madrugada com um mini-trator sobre duas rodas. Chega de grupelhos de motoqueiros malvados em bando, mas covardes, reacionários e que ainda brincam de gangues em pleno século 21. Chega de gente dizendo que o bom era o rock dos anos 80, porque ele, e não o rock, era jovem, e de lá pra cá sua vida se tornou vergonhosamente desinteressante e monótona. Chega de dedinhos em forma de chifre do capeta e língua de fora. Chega!, as suas ideias não correspondem mais aos fatos.
Quem teve a oportunidade de ir a um show do Roger Waters em 2018 no Brasil, em plena campanha eleitoral para presidente, pode ver que grande parte dos “roqueiros” nunca soube do que o rock se trata. Defenestram a justiça social, relativizam as lutas das minorias representativas, esqueceram de ouvir o Cazuza quando disse que “todo mundo é igual quando sente dor” e antipatizam com a dor alheia. Viveram e vivem na onda da indústria cultural, aparentemente felizes, cheios de certezas. Não entendem o que os artistas dizem, mas também não se preocupam com isso. Seus símbolos estampados na pele e no metal são meros enfeites estéreis. God gave rock n’roll to you, mas não adiantou muita coisa.
* Jornalista, mestre em Comunicação-UFG