POEMA
Por Alfredo Soares*
Jequitibá, jequitibá
Debaixo de sua copa frondosa
Descanso meu corpo exausto
Labutei o dia todo
Nem tive pausa pra matutar
Minha mão calejada
A sangrar
Minha coluna enferrujada
Quem nem a pá da minha enxada
Com cabo forte de jacarandá
Jequitibá rosa
Rosa é Flor
Tem cheiro bom
Flor acalenta
Então
Deixe me deitar aqui
Bem perto das suas raizes
Tão fortes que te mantém de pé
Na chuva e na ventania
Peço um pouco mais de energia
Já, já o sol se põe
Sol ingrato de tão quente
Caminharei até o engenho
No alto do morro
Guardarei meu facão enferrujado
Pendurarei meu pertences
São poucos e puídos
Darei um trago na cachaça forte
Pra só então mascar
Meu naco de carne seca com farinha
Alívio dessa lida diária sofrida
Amanhã
Antes do galo cantar
Cá estarei
Com meu lombo retinto
De tanto sol
De novo à prova
Não tenho medo da lida
Mas meus braços estão pesados
Jequitibá
Você é testemunha
Aí dos seus galhos
Tem a imensidão de alqueire
Tudo vê até perder de vista
Vê também o povo preto a sofrer
Pra gozo do senhor
Desse jeito muitos não aguentam
Vão cedo para os braços de olorum
Quando loucos e corajosos não ficam
A ponto de fugir
E serem pegos
Rebelados são esfoliados
Morrem por desonra
Indignos homens pretos do canavial
Direito não tem
Nem nome ou sobrenome
Ancestrais só na memória
Religião nem pensar
Parece que só servem pra sofrer e capinar
Deixa eu cochilar
Jequitibá
Não conta pra ninguém que cá estou
É que contigo posso me confessar
Não verei a vitória.
* Jornalista, radialista, escritor. Teresopolitano radicalizado em Campos/RJ. Instagram: alfredosoares49
** Pintor, cartunista e ilustrador. Também é professor de desenho. Instagram