No artigo “ Algumas verdades sobre a mentira”, do psicólogo e mestre em psicologia social, Hugo Rodrigues, o autor levanta algumas características da personalidade de um mentiroso. E um ponto importante destacado no texto é justamente o que caracteriza a mentira como uma estratégia de resolução de problemas no âmbito de uma interação social, além, é claro dos traços de psicopatia na persona do indivíduo mentiroso. O estudo é complexo, mas mostra claramente um rastro, de como a mentira faz parte da história da humanidade. E, se nos aprofundarmos no tema, poderemos até dizer, quem sabe, que a nossa é história é baseada em mentiras.
Como disse o compositor Cazuza, “ mentiras sinceras, me interessam”. Mas, é bom lembrar também do chinelo em punho da mamãe que dizia em alto tom: “ não minta que vai ser pior”. E de fato, a mentira pode nos levar a uma sucessão de equívocos ou erros para mantê-la com ares de verdade.
Às vezes, quando expomos um pensamento ou um ponto de vista sobre determinado assunto, estamos mentindo – para nós ou para quem desejamos seduzir. Nossa cultura é cheia de heróis mentirosos, que construíram uma verdade sobre si mesmo e pagaram caro para que ela fosse mantida através do tempo. Muitos estão hoje vivos, dando nomes a cidades, ruas, escolas e até eternizados em bronze nas praças públicas ou encarcerados nos museus espalhados pelo mundo.
A história nos mostra, sem sombra de dúvidas, que as chamadas “Fake News” não nasceram na era da tecnologia. A mentira, as distorções, as fofocas e boatos sempre estiveram em nosso meio- para o bem e para o mal. Me lembro das histórias de meu avô paterno, que sempre contava as aventuras políticas no interior das Minas Gerais, onde candidatos a prefeitos, vereadores, governadores e presidentes, promoviam emboscadas contra si mesmo para ganhar votos nos seus currais eleitorais, através da comoção provocada pela mentira. Qualquer semelhança com fatos atuais no Brasil de 2018 é mera coincidência.
Muitos brasileiros estão confundindo o direito à liberdade de expressão e a livre manifestação do pensamento crítico, garantidos na nossa Constituição Federal, como uma porteira aberta para a propagação de mentiras e notícias construídas com a finalidade de destruir reputações e construir uma nova realidade, de acordo com as distorções de seus pontos de vista, baseados em achismos e toxidades egoicas.
Vivemos em um momento extremamente delicado para a sobrevivência de modelos econômicos, sociais, políticos ou até mesmo para a vida no planeta terra. E em momentos delicados como esse, onde o conjunto de pensamentos, filosofias, leis, religiões, lideranças não conseguem dialogar é mais do que necessário rever os passos que nos trouxeram até à porteira do caos. Erros não são mentiras, mas, se analisarmos com a lupa da consciência, vamos ter a capacidade de enxergar que a manutenção das práticas errôneas, configura sim, uma grande mentira – os domínios da hipocrisia. Onde há dolo é preciso haver lei e a lei é a verdade que precisamos seguir, sem se perder em interpretações calcadas em interesses individuais ou de grupo.
A estrada trilhada no jornalismo me ensinou muito sobre a responsabilidade social na divulgação dos fatos. E a bússola que sempre me guiou foi a ética. Mas, no mundo da “virilização”, a ética está sendo sufocada pela necessidade de likes, visualizações, compartilhamentos e irresponsabilidades.
Quem cria, divulga, compartilha e, até quem curte, sem uma checagem prévia, uma notícia falsa, está incorrendo em crime.
Em tempos de pandemia, uma receita sobre um medicamento cheio de efeitos colaterais ou até mesmo, de um simples e inofensivo chá é uma prática criminosa e dever ser tratada com os rigores da lei. Sobre o medicamento não é preciso aprofundar muito para entender o dolo, mas o chazinho da vovó, anunciado como garantidor da cura ou da imunização do contagio do vírus pelo organismo tem o mesmo potencial criminoso. Assim, como é criminosa também, a prática do marketing e da publicidade que disseminam a uso de placebos como remédios para as nossas dores econômicas, sociais, políticas e existenciais. E é por isso, que o marketing e a publicidade precisaram de uma regulação e fiscalização constante.
A desinformação é geradora da ignorância e pode causar, muitos transtornos na vida do indivíduo ou de grupos, e até, em última instância, guerra e morte.
A desinformação como ferramenta na criação de Pânico social
No afã de me educar, minha avó sempre lançava mão de ditos populares e dizia constantemente -“ de boas intenções, o inferno anda cheio”. Agora, imaginemos, um mundo todo trancafiado, com acesso à ferramentas de disseminação de informação em massa e um vazio ruidoso na alma. De que seríamos capazes para tentar ecoar nossos ruídos da alma e construir, pelo menos para nós mesmos, a falsa ideia de utilidade da nossa vida, parca de conhecimentos científicos sobre o novo corona vírus e cheia de vontade de ajudar? O resultado dessa ajuda pode ser nefasto, apesar, de hipoteticamente, ter sido produzido cheio de boas intenções.
Sobre mentiras e verdades durante a pandemia a um vasto arsenal e precisamos estar atentos para não nos enganar ou nos colocar a serviço da desinformação e do caos.
A crise de desinformação é tão grave que existem hoje, milhares de organismos, promovendo pesquisas diárias na internet e nas redes sociais para classificar o que é falso ou verdadeiro com relação ao corona vírus. A desinformação ajuda a criar pânico ou também um ambiente de relaxamento do cidadão sobre os reais perigos do contágio.
O quadro deixa claro que existe, proporcionalmente, muito mais desserviço sendo compartilhado e, justamente por isso, as autoridades precisam estar atentas para reprimir a prática, imputando aos criminosos, as devidas penas e responsabilizações.
Câmara Federal tem pressa para punir quem propaga notícias falsas
Um projeto de lei, de autoria do deputado federal Orlando Silva, do PcdoB prevê penas de 1 a 5 anos de prisão para quem vender, patrocinar ou usar ferramentas externas, que tenham a função de ampliar a disseminação de conteúdo falso na internet. De acordo com o autor do projeto, o que se quer é ter uma alternativa à proposta do senador Alessandro Vieira, do Cidadania, que trata do mesmo tema e que já está sendo discutida no Senado Federal.
As duas propostas, seguem em discussão, paralelas ao inquérito das fake news, que apura ameaças aos ministros do Supremo Tribunal Federal e que está sendo conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes. A intenção é promover uma legislação específica sobre o tema, incluindo penalizações a quem estiver disseminando ou pagando a atores com dinheiro público ou particular para abastecer a rede de desinformação.
A proposta inclui ainda, uma nova qualificação dentro da Lei de Improbidade Administrativa, mirando claramente o chamado Gabinete do Ódio, ligado ao presidente Bolsonaro e a seus filhos. A partir da implementação, as plataformas de redes terão que dar transparência na divulgação de conteúdo eleitoral ou políticos que pagam para ser impulsionados, obrigando-as a dar publicidade ao valor recebido, a identificação do anunciante e informações detalhadas sobre o público a ser atingido.
Com a nova proposta, os provedores manterão o sigilo dos contratantes, mas terão que fornecer as informações sobre os mesmos à justiça, sempre que requerido pelas autoridades.
O deputado Orlando Silva esclarece que a regulação sobre as redes sociais terão foco na transparências das plataformas. “ A luz deve ser posta mais sobre a conduta dos usuários do que sobre os conteúdos, para o bem da liberdade de expressão”, justificou.
Nos bastidores se percebe uma intensa negociação sobre o projeto, envolvendo, principalmente, parlamentares do chamado Centrão, que querem tirar a tensão na relação do Executivo com o Supremo Tribunal Federal. Se for aprovado, o texto da Câmara, as regras não serão aplicadas em casos em andamento na justiça.
O ministro Alexandre de Moraes já determinou uma ações que podem ter um efeito catastrófico sobre a rede de fake news sustentada por simpatizantes da família Bolsonaro. Foram expedidos dezenas de mandados de busca e apreensão e quebra de sigilo bancário de empresários apoiadores do governo. Alexandre de Moraes acredita que as provas colhidas no inquérito sigiloso, até agora, apontam para uma associação criminosa envolvendo o chamado “Gabinete do Ódio”.
Já na esfera eleitoral da justiça, tramitam duas ações que pedem a cassação da chapa Bolsonaro Mourão. De acordo com a denúncia, publicada pelo Jornal A Folha de São Paulo, existiria uma rede de empresários bolsonaristas, que teria fraudado os CPFs de idosos para registrar chips de aparelhos telefônicos e disparar, através de aplicativos, mensagem em massa contra o candidato do PT no segundo turno das eleições.
O desserviço das chamadas fake news está sendo tratado, depois do leite derramado, como um atentado à segurança coletiva, pois, a mentira afeta a vida das pessoas e em um momento, como numa pandemia, onde toda informação deve ser colocada em benefício de todos, uma notícia falsa ou um comportamento errôneo massificado podem causar sérios prejuízos à sociedade.
No projeto da Câmara, ainda está previsto pena para crimes que estejam relacionados ao delito principal como:
- Exposição da saúde ou vida de terceiros ao risco – detenção de três meses a um ano;
- Captação de dados pessoais das vítimas – detenção de três meses a um ano, além de multa.