Por Praveen S./ Brasil de Fato
O vazamento de gás de uma fábrica de produtos químicos LG Polymers deixou pelo menos onze mortos e milhares de cidadãos hospitalizados no estado de Andhra Pradesh, sul da Índia, na manhã desta quinta-feira (7).
A unidade pertence ao conglomerado sul-coreano LG, conhecido no Brasil pelos eletroeletrônicos. A empresa informou que investiga as causas do incidente.
Mais de mil pessoas estão hospitalizadas na região de Visakhapatnam, distrito onde ocorreu o vazamento. A maioria delas apresenta náusea e tontura, e quase 100 ficaram desacordadas.
“Estamos avaliando a extensão dos danos causados aos moradores da cidade e tomando todas as medidas necessárias para protegê-los”, afirmou a LG Chem, proprietária da LG Polymers, em comunicado à imprensa.
A unidade onde foi registrado o incidente estava com as atividades suspensas por conta das medidas de isolamento para contenção do coronavírus.
O gás químico vazou de dois tanques de 5.000 toneladas que estavam sem a devida vigilância, e se espalhou por um raio de até 5 km.
Cerca de 20 trabalhadores estavam no local no momento. Eles preparavam a fábrica para retomar as atividades após 40 dias de bloqueio.
Uma das substâncias encontradas em maior quantidade naquela indústria é o estireno, classificado como possível substância cancerígena pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC).
A Agência Americana de Proteção do Ambiente (EPA) acrescenta que essa toxina pode afetar o funcionamento respiratório e digestivo. Esse gás também provocaria alterações no sistema nervoso central, o que explica os sintomas relatados pelos pacientes hospitalizados nesta manhã.
O primeiro-ministro Narendra Modi convocou uma reunião de emergência para tratar do caso e se pronunciou nas redes sociais, informando que a situação está sendo “monitorada de perto”. O governo central liberou 10 milhões de rúpias, o equivalente a R$ 670 milhões, para reparar os danos causados à população de Visakhapatnam.
Tragédia anunciada
Ex-secretário de assuntos econômicos da Índia, o ativista E. A. S. Sarma está na cidade onde ocorreu o vazamento e conversou com a reportagem do portal indiano Newsclick. Segundo ele, não há clareza sobre as substâncias que vazaram durante a madrugada.
“Eu acessei os documentos disponíveis na página da LG Polímeros. De acordo com as informações, o gás que vazou seria o pentano. Trata-se de um hidrocarboneto com alto poder calorífico, com estrutura semelhante à do gás de cozinha. É um gás muito explosivo, que afeta os olhos, a respiração e a pele. Se inalar uma dose excessiva, a pessoa pode desmaiar e até morrer. É letal. Porém, conversei com alguns cientistas que disseram que o gás que pode ter vazado é o estireno, que seria ainda mais tóxico. Então, prefiro aguardar os exames periciais”, explica.
Para o ativista, o incidente poderia ter sido evitado com mecanismos de fiscalização mais rígidos, que dependem de vontade política.
“Nos últimos cinco anos, na região de Visakhapatnam, temos notícia de 30 a 40 grandes acidentes industriais. Em todos os casos, trabalhadores perderam a vida, moradores do entorno foram afetados. Venho questionando o governo sobre as ações que precisam ser tomadas contra as indústrias, por negligência criminosa, e mesmo os funcionários do estado, que deveriam fazer o monitoramento da segurança industrial e da poluição. Mas nunca houve resposta por parte deles. O próprio Ministério do Meio Ambiente da Índia vem flexibilizando a fiscalização ambiental de indústrias farmacêuticas e químicas, o que não é nada prudente”, afirma E. A. S. Sarma.
O governo vem sendo extremamente brando com empresas que violam leis ambientais, direitos humanos e a legislação de modo geral, sem nenhuma reação. Nunca encontrei um único promotor que tenha denunciado alguma dessas indústrias onde já ocorreram acidentes. Em nome dos negócios, estamos colocando em risco a vida das pessoas em toda parte.
A história se repete
Em 1984, a Índia foi palco do maior crime industrial da história, justamente em um vazamento de gás tóxico de uma indústria química. Na ocasião, a substância que vazou foi o isocianato de metila. De lá para cá, estima-se que 600 mil pessoas foram afetadas na cidade de Bhopal, onde estava instalada a fábrica de agrotóxicos da companhia estadunidense Union Carbide.