O 2º Encontro Plurinacional das que Lutam que aconteceu na Universidade de Santiago no Chile nos dias 10, 11 e 12 de janeiro de 2020 é atualmente o maior encontro feminista do pais. Ele é organizado pela Coordenadora Feminista 8M em conjunto com várias organizações feministas do Chile, dentre elas, nossas parceiras da Secretaria de Mulheres Migrantes e a Coletiva Negrocentricxs.

O encontro reuniu três mil mulheres e dissidências (sexuais e de gênero) de todo o território chileno (migrantes e nacionais), assim como 150 mulheres de 28 países que viajaram especialmente para o encontro.

Já no primeiro dia, no evento inaugural, ocorrido na sexta-feita à noite, tivemos uma grata surpresa ao ver nossa parceira Paola Palacios, mulher migrante e negra da coletiva Negrocentricxs, como mestre de cerimônia. Ter essa classe de protagonismo em um evento feminista é algo que as migrantes no Brasil ainda só sonhamos. Numa Aula Magna cheia, houve consignas tais como “se sente, se escuta, arriba as que lutam!”, “liberdade, liberdade às pressas por lutar” (aludindo às jovens presas por se manifestarem desde o 18 de outubro de 2019) e “alerta, alerta, alerta racista, América latina será negra e feminista!” dentre outras. Ouvimos também música pela Orquestra de Mulheres, orquestra que luta contra o machismo no âmbito da música clássica chilena, elas tocaram música clássica e música da Violeta Parra e o, já hino, O direito de viver em paz de Víctor Jara.

Nos dias sábado e domingo, tivemos as mesas de discussão temática. Nós, da Warmis, participamos da mesa de Feminismos Transfronteiriços e da mesa de Migração e Refúgio.

A mesa de Feminismos Transfronteiriços foi nova neste encontro e surgiu pela necessidade de articular e fortalecer as diversas organizações feministas no mundo, especialmente no território do Abya-Yala (América Latina) entendendo que a força das mulheres e das dissidências é uma das maiores forças neste momento para dar resposta e superar a crise do modelo atual no mundo inteiro. Nesta mesa expusemos a importância de escutarmos às migrantes quando se trata dos conflitos nos países de origem delas, pois as migrantes sempre temos a cabeça, e o coração, em dois lugares (pelo menos) o de origem e o de residência, e além dos especialistas internacionais que possam ser convidados, as migrantes ativistas bem podem falar destas situações com toda propriedade. Expusemos a necessidade imperiosa de nos colocarmos contra as guerras como resolução de conflito entre as nações e alertamos do perigo, real e atual, das armas nucleares. Nesta mesa participamos mulheres e dissidências (nacionais e migrantes) do Wallmapu (território Mapuche no Chile), Chile, Bolívia, Argentina, Brasil, Alemanha, Itália, Espanha, França, Noruega e Colômbia. Deste intercâmbio surgiu o Primeiro Encontro de Feminismo Transfronteiriço a realizar-se em São Paulo, Brasil, no ano de 2020, em data ainda por definir.

Na mesa de Migração e Refúgio trocamos ideias e experiências sobre as dificuldades burocráticas, a xenofobia e o racismo e as soluções para essas dificuldades nos diferentes territórios do Abya-Yala. Sobre o Chile as companheiras migrantes expuseram as diferenças entre a condição de migrante e a de refugiada e da necessidade de criar uma Lei de Migração com enfoque em Direitos Humanos, além da importância de capacitar aos funcionários públicos no atendimento às migrantes. Discutimos a necessidade de abrir às fronteiras, da libre circulação das pessoas. As migrantes no Chile denunciaram às práticas fascistas do Estado chileno quando expulsa crianças chilenas filhas de migrantes, ou quando cria retornos “humanitários” de migrantes racializados (especialmente Haiti). Exigiu-se também a imediata expulsão e processo criminal aos soldados da MINUSTAH (Missão da ONU em Haiti) pelos estupros de meninas. Desde Brasil denunciamos a perseguição da comunidade migrante e o aumento da xenofobia e o racismo por parte da população respondendo aos discursos do governo e as autoridades atuais.

O encontro finalizou com a leitura em assembleia da síntese das mesas e do plano de luta 2020 e com diversas apresentações artísticas.

Foi um encontro muito renovador e muito inspirador, onde o respeito, a escuta e o bom tratamento entre pares foi a normalidade. Curtimos muito ouvir as experiências das companheiras migrantes no Chile e das chilenas nos diversos países para vermos que a luta contra a violência, o machismo, o racismo e a xenofobia é global e que temos muito a fazer estando conectadas e articuladas.

Esperamos muito ansiosamente o encontro em São Paulo e o 3º encontro plurinacional das que lutam.

Andrea Carabantes
Equipe de Base Warmis – Convergências das Culturas
www.warmis.org

Veja algumas fotos do encontro

Rede de Mulheres Mapuche
Houve espaço de cuidado para crianças
Não estamos todas, faltam as presas.

Fotos: Coletivo Negrocentricxs, ANRed e Guadalupe Scotta (LATFEM)