Por Petur Gudjonson
Não há nada de novo na mudança de paisagens. Isso acontece durante a vida do indivíduo quando eles têm uma certa paisagem quando crianças, e outra quando adolescentes, e assim por diante.
Se perguntasses a um adolescente se gosta de brincar com carrinhos ele te olharia com desconfiança, porque essa fase já não se encaixa na sua nova paisagem.
Não são apenas os indivíduos que mudam de paisagem. É também a sensibilidade de, por exemplo, um país, de nações ou grupos de pessoas que, num momento rejeitam certas coisas, e em outro as aceitam.
Nas revoluções, são aceites coisas novas que nunca o foram antes, e depois, o mesma coisa acontece: as coisas que aconteceram antes, já não se encaixam.
Essas são as mudanças mecânicas das paisagens dentro de nós. Também podemos chamar de um tipo diferente de sensibilidade, algo como um espaço em que certas coisas se encaixam e outras não. Agora parece haver, no entanto, uma abertura para uma paisagem completamente nova que tem a ver com algo mais profundo: o ser humano a manifestar-se.
Em outras palavras, é como se aquilo que é profundamente humano, estivesse a começar a tornar-se normal e desejado.
Isso está a suceder agora no Chile, não através de intenções pessoais, não através da meditação, mas algo aconteceu e fez com que as pessoas dessa cultura se conectassem profundamente. Sim, eles estavam a protestar contra um sistema opressivo, mas havia muito mais do que isso. Isso pode ser observado pela forma em que as pessoas se tratavam…com bondade, com ajuda, desfrutando da companhia um do outro, interagindo com vizinhos e outros, algo que não acontecia antes.
Todo esse protesto é realizado pela maioria no âmbito da não violência e também, às vezes, sem medo. Quanto tempo isso vai durar é difícil dizer, mas o importante é que já surgiu um sinal do futuro. O que está a suceder agora no Chile, onde as pessoas se relacionam de forma diferente entre si, a forma como se olham e como se sentem, é o que vai acontecer em todos os países nos próximos 3 ou 4 anos.
Haverá uma revolta, uma conexão em que as pessoas se sentirão saturadas do sistema opressivo que, no momento, já não terá encaixe, já não corresponderá à nova paisagem. Neste novo cenário, presidentes, políticos, líderes empresariais, figuras religiosas não se encaixarão, eles pertencem a uma paisagem antiga. Portanto, no Chile, eles não estão apenas a tentar livrar-se do presidente, estão a tentar livrar-se do sistema, do sistema neoliberal.Aparentemente, isso é o que está a acontecer, mas além disso e o que realmente está a mover tudo, é algo mais, algo profundo dentro do ser humano que está clamando por se liberar, algo essencial que toca no íntimo dum grande número de Chilenos.
Então, o que está a suceder no Chile é algo além das intenções pessoais, talvez uma intenção profunda, que talvez não seja percebida como tal. Por esse motivo, pode não durar muito tempo. Portanto, haverá uma lembrança duma nova paisagem e, em seguida, a antiga aparecerá novamente, algo que realmente não se encaixa.
(O que há de tão especial no Chile? Basicamente, três coisas: o país pegou fogo do norte ao sul na maioria das cidades, espontaneamente, sem coordenação, e um país com a extensão dos Estados Unidos, ou 4.500 km.
Segundo, o protesto vem acontecendo há semanas e, apesar das repressões, ainda existe o mesmo clima emocional excelente e uma bondade permeando as relações. Terceiro, porque o Chile é o mais improvável de todos os lugares para se ter um despertar espiritual. Se isso aconteceu ali, poderá acontecer em qualquer lugar).
O que aconteceria se houvesse um grande número dos nossos em diferentes partes do Chile? Talvez mais pessoas se dariam conta de que não se trata apenas da rejeição dum sistema opressivo. Se dariam conta de que algo realmente fantástico e positivo está prestes a manifestar-se.
Dessa forma, um novo horizonte, um novo tipo de futuro apareceria e o povo do Chile e, posteriormente, em outros lugares, trabalhariam para lá chegar. Ter um sentido, como ser mais humano. Sentindo o que é profundo neles, transcendental e imortal e que isso terá o maior dos pesos. As pessoas perceberão que terão que trabalhar para que aquilo se torne mais permanente.
Há uma diferença entre novas paisagens mecânicas e paisagens intencionais.
Como criaríamos uma nova paisagem? Ou como poderíamos experimentar isso?
Seríamos capazes de experimentá-lo de alguma forma soltando o tempo, e depois, soltando o espaço à medida que caíssemos mais para dentro e, claro, soltando o clima de ‘eu mesmo’. Nesse momento, poderíamos sentir essa fronteira entre o mundo ilusório e o mundo da não-ilusão. À medida que fossemos mais para dentro, começaríamos a sentir indicadores específicos de estar no mundo da não-ilusão, onde algumas coisas se encaixam e outras não, ou seja, um cenário completamente novo.
Na quietude da não-ilusão, tomamos consciência de que essa paisagem possui vários níveis de profundidade, de modo que também soltamos esse belo sentimento, essa abertura, esse silêncio. Então, chegaríamos a algo que pareceria ser um ser interior e exterior, interagindo simultaneamente. Aí, nessa paisagem, não aparecem coisas do mundo das ilusões e nem mesmo o belo sentimento de silêncio. Soltamos ainda mais e penetramos ainda mais e lásentimos o que poderíamos chamar de energia que está em toda parte, tudo está cheio de energia: os oceanos, as estrelas e nós vibrando com ela.
Estar lá é fantástico, sentir essa energia por dentro e por fora, uma existência e paisagem completamente diferentes. Sabemos que poderíamos ir muito mais longe, soltando essa energia maravilhosa e caindo ainda mais para dentro, chegando a algo desconhecido, ao qual teríamos que nos arriscar.
Há uma fronteira entre o que somos e ao que nos lançamos e, nesse momento, poderíamos perguntar: “Como posso experimentar essa bela paisagem nova que está a caminho” e esperamos que isso aconteça. Percebemos que esse novo cenário é lançado desde o fundo e sentimos o poder dele agora e também sentimos a gentileza, a conexão com o que poderíamos chamar de nós e de outros e, além disso, da inteligência.
Não vamos mais longe agora, mas percebemos que essa coisa fantástica que sentimos é algo acessível. Talvez as pessoas não sintam isso completamente. Talvez eles sintam o que fizemos, quando deixamos o tempo e o espaço e também o clima de ‘mim mesmo’. Quando deixamos o mundo das ilusões e entramos num espaço completamente novo, sim, todos com um pouco de prática podem fazê-lo.
Fazer isso dará direção e sentido a essa nova paisagem que as novas gerações já sentem, em todos lados. Enquanto esta paisagem ainda não se tenha manifestado plenamente, muitos jovens sentem-se perdidos, sem esperança, mas sabendo exatamente o que rejeitam da paisagem antiga.
Estas novas gerações podem então esperar um lindo futuro cheio de sentido, na medida em que a mente se vai abrindo.