“Eu me sinto estranha quando sinto que estou sendo escolhida para representar o feminismo negro. E por que aqui no Brasil vocês precisam buscar essa referência nos Estados Unidos? Eu acho que aprendo mais com Lelia Gonzalez do que vocês poderiam aprender comigo”, Angela Davis, em São Paulo, 2019.
Quais são as feministas da América Latina que vocês conhecem? Algumas delas são mulheres negras? Quantas intelectuais lésbicas da América Latina você conhece? Quando a Angela Davis falou sobre a Lélia Gonzalez, comecei a refletir sobre essas questões e percebi que conhecia mais as feministas negras norte-americanas do que as daqui.
Óbvio, não existe problema nenhum em estudar, conhecer ou admirar feministas negras norte-americanas ou as brancas europeias por exemplo. A questão é que o colonialismo construiu essa ideologia em nós de que tudo o que vem de fora daqui é superior e isso inclui os debates sobre feminismos.
Além disso, não existe uma única forma de ser mulher, muito menos de ser negra e nem um único movimento feminista ou negro (inclusive alguns movimentos de mulheres negras não se consideram feministas). Essa visão de que mulher negra é uma coisa só acaba criando estereótipos que nos aprisionam e nos limitam na descoberta de nossas pluralidades coletivas ou individuais.
Aqui no Brasil, ser mulher negra (cis ou trans), hétero ou LBTQIP+ nos coloca diariamente na mira de diversas opressões: racismo, machismo, LBTQIP+fobia, classismo, gordofobia (não podemos esquecer das manas gordas) e etc. Quando começamos a nos movimentar coletivamente ou individualmente, rompemos com as narrativas dominantes que impõem o silêncio sobre os nossos corpos.
Pretendo na minha coluna falar do meu lugar enquanto mulher negra, sapatão e gorda sobre diversos assuntos ligados ao racismo, questões de gênero, sexualidade, comunicação e política. E não apenas falar sobre os temas que as pessoas esperam que eu fale, principalmente aquelas que lembram apenas que lésbicas só existem em agosto e mulheres negras em novembro.
Até a próxima!