Por Brasil de Fato
Decisão afirma que não foram apresentadas provas que ligam os acusados à ocupação de propriedade da empresa Benetton
Seis líderes mapuches do grupo Pu Lof em Resistência, da comuna rural de Cushamen, acusados de ocupar ilegalmente parte de uma propriedade da companhia transnacional italiana Benetton, foram absolvidos nessa segunda-feira (18). A sentença foi emitida pela juíza Karina Estefanía, da cidade de Esquel, ao nordeste da província de Chubut, no sul da Argentina.
Foram liberados das acusações Facundo Jones Huala, Andrea Millañanco, Sergio Ruiz Huenchupan, Matías Santana, Rodrigo Jaramillo e Nicolás Hernández Huala. Os seis também eram acusados de furto de gado.
Estefanía afirmou que nunca foram apresentadas provas que demonstram que os seis imputados eram os responsáveis pela ocupação. “No dia em que os integrantes da comunidades foram presos [27 de maio de 2016], não foram apreendidos telefones ou roupas para comparar com as fotos do dia em que entraram no acampamento”, afirmou a magistrada em sua decisão.
Ainda segundo ela, não ficou comprovado se “houve roubo de gado, nenhuma evidência foi oferecida para entender como esse crime poderia ter sido cometido. E, a título de reflexão, digo o seguinte: eu aviso sobre possíveis violações a pactos internacionais [pelo modo que o conflito foi levado adiante]”.
Durante as audiências, a juíza colheu diversos testemunhos de policiais de Chubut – que fica na Patagônia argentina, territõrio historicamente mapuche –, que confessaram que as prisões foram efetuadas sob pressão da companhia Benetton. Segundo Víctor Osvaldo Veloso, um dos membros da polícia local, a empresa lhe pediu para “fazer coisas ilegais”.
A investigação feita pela magistrada implica ainda políticos, advogados e ao menos três magistrados. A averiguação aponta que Fernando Rivarola e María Bottini, ambos promotores, pressionaram a polícia de Chubut para que prisões fossem efetuadas. Além disso, a juíza Estefanía pediu a abertura de uma investigação contra Oscar Oro, o primeiro promotor responsável por impulsionar uma denúncia contra os membros da Pu Lof.
Pressão do Estado argentino
O caso contra os seis líderes mapuches não pode ser considerado um processo judicial qualquer. A ocorrência foi usada pela ministra da Segurança da Argentina, Patricia Bullrich, para elaborar um relatório sobre a Resistência Ancestral Mapuche (RAM), em 2017. Bullrich afirmou que os seis membros da Pu Lof faziam parte da RAM, considerada um grupo terrorista.
A existência do grupo, no entanto, nunca foi comprovada. Em 2017, o presidente da Argentina, Mauricio Macri, afirmou possuir provas de que a RAM existe e é financiada por organizações inglesas. Jornalistas, líderes religiosos e políticos afirmam que o suposto grupo serve, na verdade, para tentar criminalizar os militantes mapuche. Segundo Estefanía, os seis líderes “sempre disseram que não pertenciam à RAM e não tenho motivos para não acreditar neles.
Entre os 96 casos supostamente vinculados à RAM por Bullrich, 84 não tiveram autores identificados e 18 deles tentavam vincular membros da Pu Lof a casos de terrorismo.
Facundo Jones
Um dos absolvidos, Facundo Jones Huala, possui um longo histórico de lutas em defesa do território mapuche, localizado por todo Wallmapu, região que abarca tanto parte da Argentina quanto do Chile.
Embora tenha sido considerado inocente da acusação de ter participado da ocupação na propriedade da empresa Benetton, o líder mapuche segue preso no Chile por suposto envolvimento em outro caso.
Huala foi condenado por porte de armas e participação no incêndio de fazenda, em janeiro de 2013. Na ocasião, outros cinco mapuches também foram considerados culpados por terem participação no caso. Organizações argentinas afirmam que a prisão dos líderes, na verdade, teve como objetivo desarticular a luta contra a instalação da hidrelétrica de Pilmaiquén.