por Vinícius B. C.
O Movimento Escola sem Partido, que promove pelo Brasil um projeto de lei que busca censurar os professores em pleno exercício de sua função, está realizando uma verdadeira caravana pelo interior do Estado de São Paulo e do Brasil inteiro. O curioso é não ver nenhuma mobilização por parte deste movimento no caso da aprovação do ensino confessional em escolas públicas feito pelo STF e nos diversos casos de escolas privadas que promovem o apoio a candidatos de direita. Para essas manifestações não há censura. O movimento pretende censurar os que vão contra as suas ideias de educação. Contra um dado modelo educacional que é conservador.
Nos debates promovidos pelos integrantes deste grupo aparecem todo o tipo de gente – Militares, religiosos, munícipes, menos os professores. Tudo isso porque a maioria da classe dos docentes é contra a medida. Ora, quem é mais apto para falar do assunto, um integrante da guarda municipal, um religioso ou um educador? Certamente o educador.
Nenhuma preocupação foi vista com relação as condições da escola pública brasileira. Com o baixo salário dos professores. Com relação a esses pontos o movimento prefere se omitir. Aparentemente não está preocupado com isso.
A divulgação é feita nas regiões em que o projeto está sendo discutido com panfletagem e com militantes do movimento Escola sem Partido e de outros simpatizantes – Movimento Brasil Livre, por exemplo – tentando persuadir as pessoas a serem favoráveis ao projeto.
Em sua página do Facebook é possível ver chamadas para os defensores do PL (projeto de lei) participarem das votações presencialmente nas Câmaras Municipais. Os apoiadores comparecem em peso nas votações, intimidando vereadores e os que se manifestam contra a lei.
Lista das cidades em que o projeto da Escola sem Partido está tramitando na câmara municipal ou foram aprovadas, de acordo com conteúdo disponível na página do movimento –
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Durante a votação do projeto no município de Jundiaí professores foram hostilizados e, segundo informações obtidas, ficaram com receio de sair da câmara dos vereadores e serem agredidos. Para que isso não ocorresse, esperaram os pró-escola-sem-partido saírem.
O projeto foi aprovado na câmara de Jundiaí mesmo com o parecer da OAB de Jundiaí alegando a inconstitucionalidade da lei, pois a mesma fere a liberdade de cátedra que está prevista na Constituição Federal.
As ações não são isoladas. O movimento percorre o interior brasileiro pois é mais fácil conseguir a aprovação da medida nas esferas municipais. Nos Estados e no âmbito federal, o projeto de lei encontraria como adversário uma grande mobilização. O que dificultaria a aprovação da legislação.
O movimento escola sem partido em conjunto com outros setores de direita tem feito uma verdadeira caravana pelo interior, tentando vencer nos municípios para conseguir vencer nos estados.
Os professores têm resistido a estes ataques. No Facebook a página do coletivo Professores Contra o Escola sem Partido soma mais de 70 mil curtidas. O movimento monitora os projetos de leis que se orientam sob a ótica da escola sem partido. O grupo convoca os docentes para a mobilização. Além do coletivo “Professores contra o Escola sem Partido”, há também outros movimentos de resistência como o “Escola sem censura” e “Escola sem Mordaça”
Há sites como o Pesquisando o Escola sem Partido que compila projetos do Brasil todo e que trazem mais informações sobre o tema.
Apesar de todo o trabalho de propaganda dos pró-censura, no município de Taubaté o projeto foi suspenso pelo presidente da câmara por recomendação do Ministério Público.
A princípio o projeto se apresenta para os pais como o dispositivo legal (a lei) que vai impedir professores de determinadas ideologias “doutrinarem” os seus filhos. De fato ocorre que o projeto de lei ajuda a perpetuar sérios problemas brasileiros. Como não falar de gênero e sexualidade em um país com um alto número de feminicídio? Ou de relações raciais em uma nação com um racismo cultural ?
As reações com a vinda da filósofa norte-americana Judith Butler ao Brasil foi marcada pela revolta de certos setores da sociedade, os mesmos apoiadores do Escola sem Partido.
Quais são os interesses do MBL e dos setores de direita em geral que promovem essa lei pelo país? Melhoras a educação pública? Aumentar o salário dos professores? Promover debates que promovam o debate sobre as diversas desigualdades sociais brasileiras, como as com relação a renda, etnia, gênero, sexualidade?
O MBL defende abertamente o fim do ensino público. Em seu lugar, quer instaurar um sistema de vauchers no qual o governo dá para os pais uma quantia – via isenção de impostos ou um vaucher – para colocar seus filhos em escolas privadas. Na teoria criada pelo economistam Milton Friedman – em 1955 – as escolas privadas competiriam entre si. Essa competição elevaria a qualidade do ensino do sistema educacional no país.
Tal projeto visa privatizar. Um dos mais evidentes é o governo alimentar uma rede de escolas privadas, que visam o lucro, ao invés de criar um sistema público de qualidade. Trump tem essa proposta de educação para os EUA. Especialistas, como Luis Huerta, fizeram estudos que demonstraram que o modelo não traz melhorias para a educação.
Em entrevista para o jornal Gazeta do Povo, o especialista em educação Sebástian Donoso Díaz, que é chileno, disse que o sistema de vauchers que foi implementado no país vizinho não trouxe melhorias para a educação. A competição entre as escolas não é sinônimo de qualidade. E as escolas chilenas, segundo o especialista, selecionam seus alunos. As escolas que adotam o sistema tendem a não permitir a entrada de alunos que têm baixas notas, para manter o seu grau de qualidade. O que dificulta o ingresso desses alunos em escolas.
O Chile foi o laboratório de diversas políticas neoliberais, como um sistema previdênciário baseado em fundos de investimento privados. Segundo Sebástian, essas reformas só foram possíveis de serem implementadas durante a ditadura. A educação baseada em vauchers, por exemplo, encontraria uma grande resistência por parte dos professores em períodos democráticos.
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Essa reação tem relação com as ocupações ocorridas em 2015 nas escolas estaduais de São Paulo. Essas ocupações promovidas por estudantes segundanistas assustaram os dono do poder. Conseguiram reverter o fechamento das escolas e mostrar o poder da mobilização social.
Após as ocupações de 2015 vários coletivos feministas, por exemplo, começaram a surgir dentro das escolas. Um outro tipo de educação apareceu. Com aulas públicas, com a participação dos estudantes. Um novo modelo de escola que vai contra o status quo. Esse incomodo fez com que esses setores conservadores se sentissem incomodados. Não com os baixos salários dos professores ou com a melhoria da alimentação de nossas crianças. Mas com a possibilidade de novas mobilizações sociais que barrassem políticas de retrocesso.
Resistir é preciso. Em Jundiaí, no dia 17/11, a justiça barrou o projeto de lei que coloca uma mordaça nos professores aprovado na câmara municipal. Há formas de impedir mais esse retrocesso. A lei é inconstitucional. Fere o direito a liberdade de cátedra. Se não houver mobilização por parte dos setores contrários, mais e mais leis baseadas no projeto do Escola sem Partido serão aprovadas nas pequenas cidades do interior.
Saiba o que fazer em caso de ataque, este vídeo produzido pelo QuatroV traz um manual de defesa para docentes –