Por Camilla Hoshino/Brasil de Fato
Colégio Estadual do Paraná, maior escola pública do estado, foi ocupado nesta quinta-feira (6), em Curitiba
Com a ocupação do Colégio Estadual do Paraná (CEP), realizada por dezenas de estudantes na noite desta quinta-feira (6), por volta das 22h, já são pelo menos 44 escolas ocupadas no estado. As ações, que não param de crescer, desde a noite de segunda-feira (3), quando cerca de 200 alunos ocuparam o Colégio Estadual Padre Arnaldo Jansen, em São José dos Pinhais, na região Metropolitana de Curitiba, são contra as reformas no ensino médio propostas pelo governo de Michel Temer (PMDB), por meio da Medida Provisória (MP) 746/2016.
Em virtude do crescimento da resistência dos secundaristas pelo estado, entidades estudantis e organizações que apoiam o movimento estão reunindo informações com nome e local de novas escolas ocupadas de forma colaborativa por meio do Mapa das Escolas Ocupadas do Paraná.
De acordo com o aluno do ensino médio do CEP, Oruê Brasileiro, de 15 anos, a intenção é que as ocupações conscientizem os estudantes, além de pressionar contra a aprovação das propostas que afetam diretamente a educação pública no país. “O estudantes secundaristas têm muita força e estão dispostos a mudar as coisas, indo para as ruas ou parando as escolas do país”, defende.
Outra denúncia dos secundaristas é relacionada à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que institui o Novo Regime Fiscal, estabelecendo limites para os gastos públicos em educação e saúde por 20 anos. A primeira votação da PEC no Plenário da Câmara, prevista para a próxima segunda-feira (10), será adiada. O motivo foi não ter havido, por falta de quórum, uma sessão obrigatória nesta sexta-feira (7), após a aprovação de ontem do parecer favorável ao seu texto-base em uma Comissão Especial da Câmara Federal.
“Isso é um desmonte da educação pública. A não obrigatoriedade de disciplinas [prevista na MP do ensino médio] que tinham sido retirada nos anos da ditadura e que foram conquistadas em 2006, por exemplo, é um absurdo”, afirma o professor de Filosofia Marcos Ridiniski. Segundo ele, é preciso reformas na educação, mas elas devem ser feitas em diálogo com a sociedade.
Professores do CEP têm ajudado os estudantes, levando materiais de primeiros socorros, colchonetes, cobertores, materiais de higiene e alimentos, segundo Ridiniski. “Os estudantes estão muito bem organizados e unidos. Eles conseguiram fazer, em muito pouco tempo, uma divisão de tarefas que permite que a ocupação funcione”, descreve. Apesar da organização, a preocupação do professor é em relação à segurança dos estudantes, principalmente em caso de reintegração de posse.
Organizada pelo grêmio e por outros alunos do movimento estudantil, a ocupação do CEP paralisou as aulas e as demais atividades da escola, trancando os quatro andares da área administrativa. Em assembleia realizada na noite de ontem, os estudantes se dividiram em cinco comissões: limpeza, segurança, alimentação, saúde e agitação. Em conversa com a direção do colégio, segundo informações dos secundaristas, foi acordado que será permitida a entrada de alguns funcionários em troca do uso da cantina.
A agenda dos próximos dias na ocupação do CEP inclui aulões sobre as propostas em pauta, debates sobre variados temas, entre eles consciência negra e história, além de atividades culturais como teatro, dança e cinedebates.
Reintegração de posse
Até o momento não foi identificado pedido de reintegração de posse para o CEP e os estudantes afirmam que não há prazo para deixar o local. O advogado Ramon Bentivenha explica que, assim como qualquer outro prédio público do estado, é necessário que um eventual pedido de reintegração seja feito pela Procuradoria Geral do Estado (PGE). “No caso das ocupações de São José dos Pinhais e de Ponta Grossa, há escolas que são estaduais, mas que estão em espaços do município. Nestes casos, é a Procuradoria do Município quem solicita a reintegração”, afirma.
O problema, de acordo com Bentivenha, é que as reintegrações geralmente são cumpridas por força policial. Este é um dos motivos pelo qual advogados populares têm acompanhado as ocupações para fornecer auxílio jurídico e evitar qualquer possibilidade de violência. Por se tratar de menores de idade, segundo o advogado, é necessário um procedimento específico, com a presença do Conselho Tutelar, além do acompanhamento por grupos especializados do Ministério Público e da Defensoria Pública.
Apoio de entidades
Também ocorreram durante a semana denúncias de que diretorias e representantes de Núcleos Regionais de Educação teriam tentado pressionar os estudantes a desocupar algumas escolas, mas não houve repercussão de nenhum caso grave até o momento. Após o pedido de apoio dos secundaristas ao movimento que se espalha, dezenas de entidades se manifestaram. Em nota, a Frente Paranaense contra a Privatização da Saúde e a Frente Paranaense em Defesa da Seguridade Social e das Políticas Públicas defenderam a oferta de políticas públicas no campo da educação e da saúde a partir de um debate amplo com a população usuária destes serviços.
“Somos aliados dessa juventude por entendermos que um dos pontos de conexão entre várias medidas do governo federal é a tentativa de destruição do serviço público, com graves consequências para o povo em geral e para o funcionalismo público”, diz o texto publicado pelo Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba (Sismuc), também em solidariedade à luta estudantil.
MP do Ensino Médio
A Medida Provisória (MP 746/2016) do ensino médio, que tem gerado polêmicas nacionalmente, incentiva a adoção do ensino em tempo integral nas escolas. Isto significa que o que atualmente soma 800 horas por ano, de acordo com o MEC, deve ser ampliado pata 1,4 mil, em sete horas por dia. A expectativa é de que essas mudanças comecem a ser aplicadas a partir de 2017, conforme a capacidade de cada rede de ensino.
Em relação ao conteúdo obrigatório, ele será diminuído para privilegiar cinco áreas do conhecimento: ciências naturais, linguagens, matemática, ciências humanas e formação técnica e profissional. As disciplinas de espanhol, arte, educação física, sociologia e filosofia permanecem na Base Nacional Curricular Comum (BNCC), mas deixam de ser obrigatórias. A inclusão ou não dessas disciplinas nos currículos do Ensino Médio dependerão das Secretarias de Educação de cada estado.
Além disso, profissionais não licenciados poderão trabalhar como professores nas escolas, o que a medida identifica como “notório saber”. Eles atuariam na modalidade profissionalizante.