Depois de perder a oportunidade de dialogar com as novas gerações na política, fórum precisa derrubar visão equivocada de oposição ao Estado para ter papel protagonista na construção de projetos.
por Emir Sader publicado 18/01/2016
A irrupção do neoliberalismo como novo modelo de capitalismo foi fulminante, atropelando tudo o que havia e se propagando com uma velocidade nunca vista. Rapidamente se transformou no modelo hegemônico, euforicamente, promovendo valores de mercado, destruindo direitos e regulações estatais.
A década de 1990 foi a de seu auge, combinando o eixo Estados Unidos-Inglaterra com a adesão da social democracia europeia, o fim da URSS, a adoção pela China de um modelo de mercado. Uma ofensiva que buscava se consolidar com o Consenso de Washington e o pensamento único.
Como setores amplos da própria esquerda aderiram ao novo modelo, a resistência ao neoliberalismo foi protagonizada por alguns partidos de esquerda, mas essencialmente por movimentos sociais. Essa resistência assumiu, inicialmente, a forma de manifestações de protesto contra o Fórum Econômico Mundial de Davos.
Até que as forças que protagonizavam esses protestos resolveram organizar um fórum alternativo, que assumiu o tema social no lugar do econômico, como símbolo dos conteúdos contrapostos dos dois fóruns.
Decidiu-se que deveria estar no Sul do mundo, vítima privilegiada das políticas neoliberais. Que deveria estar na América Latina, onde havia mais lutas de resistência e em particular no Brasil, país do PT, do MST, da CUT, do orçamento participativo. Por isso, a cidade escolhida foi Porto Alegre.
Os primeiros fóruns já surpreenderam pela quantidade e diversidade de participações, tanto da América Latina como também da Europa e, complementarmente, da Ásia, da África e dos Estados Unidos. O lema do Um outro mundo é possível significava a luta contra o pensamento único e as normas do Consenso de Washington.
O caráter amplo do Fórum Social Mundial (FSM) foi sendo limitado ao longo do tempo, conforme ONGs impuseram normas restritas, excluindo forças políticas, governos, partidos. Isso foi feito marginalizando os componentes representativos na direção do FSM, como a CUT e o MST. Além disso, pela visão equivocada de oposição ao Estado, com a ilusão de que seria possível mudar o mundo sem apropriação do Estado e mudança do seu caráter.
Conforme foram se elegendo governos antineoliberais na América Latina – especialmente com os primeiros, de Hugo Chávez na Venezuela em 1998, de Lula no Brasil em 2002, de Néstor Kirchner na Argentina em 2003, de Tabaré Vázquez no Uruguai em 2004 – foi ficando claro que a construção de alternativas ao neoliberalismo – que devia ser objetivo do FSM – passava por esses governos.
Governos que privilegiam o social no lugar do ajuste fiscal, a integração regional no lugar do livre comércio e dos seus tratados, e resgatam o Estado para afirmar direitos excluídos pelos governos neoliberais. Esses governos não tinham lugar no FSM. Naquele realizado em Belém, em 2009, o último importante e representativo do FSM, o maior ato foi protagonizado por presidentes latino-americanos – Chávez, Lula, Rafael Correa, Evo Morales, Fernando Lugo – e teve de ser feito fora da programação oficial do FSM.
As ONGs se opuseram sempre a que houvesse propostas alternativas ao neoliberalismo, preferindo que o espaço fosse apenas de intercâmbio de experiências.
A partir daí se desviaram os caminhos de quem constrói alternativas aos neoliberalismo – governos sul-americanos – e as forças que apenas intercambiam experiências. O FSM perdeu transcendência, as novas gerações – as do Ocupa, dos indignados, do Podemos, do Syriza nem conhecem o FSM.
Nesta semana será realizado um FSM temático em Porto Alegre – as ONGs se opuseram a que o FSM se desse nessa cidade, preferindo fazê-lo no Canadá –, que pode ser importante se puder discutir alternativas futuras para o Brasil – como as atividades do projeto O Brasil que queremos, no acampamento da juventude.
Fonte: Rede Brasil Atual