Ao mesmo tempo em que quase todos (93%) os paulistanos são contra a diferença de salários por gênero, a maioria (61%) também vê Bolsa Família como um estímulo à preguiça, aponta pesquisa.
por Sarah Fernandes, da RBA
São Paulo – “Eu concordo com o casamento gay, acho que cada um tem o direito de fazer o que quer. Já o Bolsa Família eu não acho certo. Lá no Nordeste pode fazer alguma diferença, mas aqui em São Paulo, não. Eu acho que acaba funcionando como uma compra de votos.” A opinião do porteiro Divanir dos Santos, de 38 anos, representa bem o perfil político do paulistano, de acordo com uma pesquisa da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp), lançada hoje (3): em um híbrido de conservador e progressista, os moradores da cidade tendem a defender a conquista de direitos individuais, mas rechaçam as políticas públicas de inclusão social.
Ao mesmo tempo que 54% dos 1.288 entrevistados discordam que toda família deve ser composta necessariamente por um homem e uma mulher, 61% dos ouvidos acreditam que “direitos humanos deveriam ser só para pessoas de bem”. Quase todos (93%) os paulistanos são contra a diferença de salários por gênero, mas 61% veem o Bolsa Família como um estímulo à preguiça – apesar de a maioria (67%) reconhecer que o programa é um caminho para a inclusão social. Ao todo, 87% discordam que a homossexualidade seja uma doença, porém 52% acreditam que as cotas para negros em universidades são uma forma de discriminação.
“Isso vem da trajetória histórica de São Paulo e de como o paulistano construiu o imaginário da cidade, como um lugar de oportunidades e emprego. Há uma espécie de espírito bandeirante ressignificado por trás disso: é uma cidade que se abre para aqueles que, a partir do mérito ou do esforço individual, conseguem se inserir no mercado de consumo”, explica o responsável pela pesquisa, Willian Nozaki. “Isso dá o acento ao progressismo nas liberdades individuais, porque se acredita que para construir uma trajetória de ascensão é preciso ter liberdade de fazer escolhas. É uma ideia de ascensão pautada no mérito.”
“Por trás disso há uma ideia de Estado”, continua Nozaki. “Não é aquele que tem que implantar políticas públicas e garantir condições para que todos possam ascender. Ele tem que assegurar a ordem e garantir a propriedade privada. Por isso, quando se pergunta sobre outras políticas, como a de cotas ou o Bolsa Família, se caminha para um rechaço geral. O Estado não é o promotor de políticas públicas, mas o assegurador da ordem.”
Seguindo o perfil censitário da cidade, a maioria dos entrevistados (40%) tinha entre 20 e 29 anos, eram homens (51%), brancos (44%), cursando o ensino superior (28,75%). Ao todo, 38% dos entrevistados não souberam definir sua tendência política, 22% se consideraram de esquerda e 11%, de direita. A pesquisa identificou um percentual maior de pessoas com perfil considerado conservador entre os jovens e os estratos de renda mais baixos.
“Esse conservadorismo dos mais jovens tem que ser observado com cuidado: a juventude tende a achar, pelo seu espírito rebelde, que deve sempre se voltar contra o governo. Então, vão dando esse acento conservador, já que as políticas do governo não são tão conservadoras”, diz Nozaki. “Já o conservadorismo entre os mais pobres é um traço da história brasileira. Quando você está em uma sociedade muito desigual, quem esta em uma situação de vulnerabilidade não pode se dar ao luxo de correr riscos. Então acaba introjetando uma defesa do status quo.”
Em geral, o paulistano acredita que a democracia é a melhor forma de governo (63%), porém, uma parcela significativa (28%) avalia que em certas ocasiões uma ditadura pode ser a melhor opção. A maioria (61%) concorda com o uso do exército para combater a criminalidade, com prisão perpétua (59%) e com a redução da maioridade penal (62%). Ao mesmo tempo, a maior parte dos paulistanos (76%) defende que devem existir políticas públicas de reinserção de presos e que a maconha deve ser legalizada (52%).
“Eu concordo com a legalização da maconha. Já o Bolsa Família acaba sendo também uma estratégia do governo para aumentar o consumo e também melhorar a economia do país. Ajuda, mas beneficia bastante o governo, até como uma compra de votos, por aqueles que não tem uma opinião formada”, defende o estudante Isabel Rocha, de 19 anos. “A classe média acha que sustenta o pobre, mas não acho que seja assim. A gente que tem chuveiro quente e cama em casa, não sabe o que é só ter arroz com farinha para comer, se muito”, contrapõe a também estudante Gariela Turella.
Fonte: Rede Brasil Atual