Problemas que ameaçam países hoje são causados pela “financeirização” e por interesses das grandes corporações que controlam a economia do planeta, afirma o economista Ladislau Dowbor.
São Paulo – “Temos todo o necessário hoje para construir um mundo que faça sentido. O problema não é falta de recursos, é falta de governança.” Assim o economista Ladislau Dowbor, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, iniciou palestra ontem (26) em congresso internacional realizado pela Fundacentro, Alal (Associação Latinoamericana de Advogados Laboralistas) e Ministério Público do Trabalho (MPT), que ocorre na Faculdade de Direito da USP.
Ele foi enfático ao discorrer sobre as origens e responsabilidades pela atual crise econômica mundial. “A totalidade das chamadas commodities – grãos, petróleo, gás e minérios – está nas mãos de 16 tradings globais”, disse, ao referir-se à queda nos preços desse segmento nos últimos 12 meses. “Quando se pensa que os principais bens do planeta estão com 16 corporações, vemos que há um controle da economia mundial sem que se tenha um governo mundial.”
O professor citou estudo do Instituto Federal Suíço de Pesquisa Tecnológica, segundo o qual 737 empresas controlam 80% do sistema corporativo mundial. “Isso é gente que se conhece, nem precisa se procurar para conspirar. Trata-se de um verdadeiro oligopólio planetário, e 65% desse sistema corporativo é formado por bancos.”
Para Ladislau, esse controle e financeirização da economia resultou em uma dinâmica que hoje multiplica um sistema de quebradeira nos mais variados países: “O que hoje está acontecendo na Grécia, antes aconteceu no sudeste asiático e, antes disso, no México, e também já aconteceu na Argentina”.
Com essa introdução sobre economia mundial, o professor abordou os desafios à consolidação do estado social democrático na América Latina, tema em debate na tarde de terça-feira 25, até sexta-feira 28. Também participou da mesa o ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim.
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“Contribuição” dos bancos
Ladislau Dowbor destacou o papel dos bancos na crise brasileira, a partir de dados do Banco Central sobre o endividamento das famílias, que em 2005 correspondia a 19,3% da renda e em abril último pulou para 46,5% da renda. “Isso trava a economia”,afirmou, lembrando os exorbitantes juros bancários no país. “Um crediário no Brasil tem 100% de juros, na Europa é 13%. O rotativo do cartão de crédito alcança em média 300% ao ano. O cheque especial no Brasil chega a 200% ao ano, enquanto que na Espanha é 0% até seis meses. Hoje temos mais de R$ 20 bilhões empatados em dívidas de gente que está pagando cheque especial. Ou seja, crediários, cartões de crédito e juros bancários para pessoa física travam a demanda, pois o comprador paga em dobro pelo produto, assim endivida-se muito comprando pouco.”
Ele também criticou os altos juros para pessoas jurídicas. “Para completar esse quadro, a alta da Selic provoca a transferência de centenas de bilhões dos nossos impostos para os bancos, o que trava a capacidade do Estado de investir em infraestrutura e expandir políticas sociais”, disse, referindo-se aos títulos da dívida pública, indexados pela taxa básica, a Selic. “Assim completa-se o quadro dessa bandidagem absolutamente fenomenal que está drenando recursos do nosso país.”
Interesses na crise
O economista lembrou avanços sociais do país nos últimos anos, com o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) crescendo 31% entre 1980 (0,549) e 2011 (0,718), desempenho que foi puxado pelo aumento na expectativa de vida (de 62,5 anos para 73,5 anos), pela melhora na média de anos de escolaridade (4,6 anos a mais) e pelo crescimento da renda nacional bruta per capita (quase 40% entre 1980 e 2011). “E vamos dizer que o país está quebrado?”, questionou.
“Os resultados são gigantescos, muito sólidos, essa crise não é uma crise econômica, é uma crise levada por interesses políticos. Temos uma aliança do sistema financeiro, da mídia e de parte do Judiciário. E não vamos nos esquecer do Congresso que é eleito por corporações, por isso temos a bancada ruralista, a dos bancos, a das empreiteiras, das montadoras… Fica-se à procura da bancada do cidadão.” E completou. “Tivemos isso em 54 (ano em que Getúlio Vargas se suicidou). Tivemos também em 64 (ditadura) e estamos tendo isso de novo hoje. Não passa pela goela das nossas oligarquias que haja uma democracia, e isso não só nos ameaça aqui, como nos ameaça no continente latino-americano e no mundo.”
Com reportagem de Andréa Ponte Souza, do Sindicato dos Bancários de São Paulo
Fonte: Rede Brasil Atual