O dia 1 de Dezembro foi durante muitos anos feriado em Portugal. De acordo com o calendário oficial, celebra-se neste dia a Restauração da Independência, obtida em 1640, que interrompeu um ciclo histórico de 60 anos sob domínio da Coroa espanhola.
O Governo atual, formado por conservadores e liberais, sacrificou este feriado, entre outros, ao altar da Troika (Comissão Europeia, Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e Fundo Monetrário Internacional), como prova do seu empenho em cumprir o programa de ajustamento orçamental imposto pela mesma, na sequência do pedido de resgate que lhe foi endereçado.
É certo que, no âmbito da concertação social, ficou estabelecido que a suspensão deste feriado seria temporária, em paralelo com o que aconteceu com dois feriados religiosos, mas a verdade é que os portugueses desconfiam do Governo neste domínio. Aliás, a suspensão deste feriado foi defendida com o falso argumento de que Portugal teria feriados a mais, quando esse facto não correspondia à verdade no contexto dos países membros da União Europeia.
Por tudo isto, a oposição parlamentar tem vindo a prometer repor o feriado já no próximo ano de 2015 – aproveitando o facto de ir haver eleições legislativas – secundado pelos adeptos da causa monárquica e outros patriotas, que pugnam pela necessidade de defender os símbolos e as datas históricas nacionais.
Contudo, se alguma relevância deve ser ainda dada ao dia 1 de Dezembro de 1640, para além da retórica nacionalista, foi que a Restauração abriu a porta ao estabelecimento da língua portuguesa como o único idioma oficial do Reino. Com efeito, embora esse seja um facto pouco conhecido, até então e mesmo antes da perda da independência em 1580, a nobreza portuguesa, especialmente no seio da Corte, falava castelhano entre si, enquanto o clero usava sobretudo o latim. O idioma português era, até então, a língua do povo, a língua da rua, corruptela do galaico-português antigo, apesar de já ter alguma expressão na literatura, como as obras de Gil Vicente (1465-1536?) e de Camões (1524-1580), por exemplo, atestam.
Assim, essa rotura com a Coroa espanhola teve o condão de alcandorar o português a única língua oficial do Estado e, por tabela, do império de então. Como consequência, o português veio a tornar-se a língua comum de mais de 200 milhões de pessoas em todo o mundo, distribuídos por quatro continentes, desde Timor-Leste ao Brasil, passando por Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, convivendo com os dialetos nativos de alguns destes países.
Por isso, apesar de tudo, mesmo sem feriado, o dia 1 de Dezembro é motivo de celebração da cultura popular e da diversidade linguística, em sintonia com a aspiração humanista de um mundo múltiplo e convergente.
Um dia para celebrar a cultura popular
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