Milhares vão às ruas após sumiço de 43 alunos, levados pela polícia após protesto, e posterior descoberta de 28 corpos carbonizados no sul do país. Caso provoca críticas à ação do governo contra violência.

 

O México está em estado de choque diante dos indícios de um massacre de estudantes no estado de Guerrero, no sul do país. Em 26 de setembro, 43 alunos de uma mesma escola desapareceram depois que, durante um protesto, policiais dispararam contra os jovens em Iguala, terceira maior cidade do estado, matando um deles e levando os restantes.

Após a descoberta neste fim de semana de valas comuns com 28 corpos na periferia da cidade, organizações estudantis e o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) se solidarizaram com os parentes das vítimas e anunciaram que vingarão os assassinatos.

“Estamos planejando uma ação radical”, anunciou um normalista da escola de magistério Ayotzinapa, em entrevista ao jornal espanhol El País. “Se necessário, vamos invadir o palácio do governador de Guerrero”. Nesta quarta-feira (08/10), milhares de pessoas participaram de passeatas em várias cidades mexicanas.

“A raiva deles é a nossa raiva”

A descoberta dos 28 corpos carbonizados, cujas identidades ainda não foram esclarecidas, colocou o México em uma espécie de transe. E expôs mais uma vez a ferida aberta do país de 120 milhões de habitantes: a crescente violência. O aumento da criminalidade e da violência, resultantes dos entrelaçamentos crescentes entre poder estatal e crime organizado, espalha o medo por todo o país.

“Os familiares devem saber que não estão sozinhos com sua dor”, disse subcomandante Moises, do EZLN, em um comunicado escrito divulgado para a imprensa. “A dor deles é a nossa dor, a raiva deles é a nossa raiva.”

A busca pelos responsáveis pelo desaparecimento dos 43 estudantes da escola Ayotzinapa se tornou uma questão política. O presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, é cada vez mais criticado por sua estratégia de segurança nacional. Parte dela inclui um Programa Nacional para Prevenção do Social do Crime e da Violência, dotado de 7,6 bilhões de euros, assim como avaliações dos policiais.

Na cidade de Iguala, Exército e polícia assumiram o controle da segurança: as forças de segurança locais foram desarmadas. De acordo com a Embaixada do México em Berlim, até agora 26 suspeitos foram presos. A investigação foi transferida para a Procuradoria Geral do México.

Colaboração da polícia com crime organizado

A princípio, os parentes dos 43 desaparecidos desde o final de setembro ainda tinham esperança de voltar a vê-los com vida. Mas, depois das confissões de um policial e de um assassino de aluguel da organização criminosa Guerreiros Unidos, de Iguala, essa esperança quase se apagou. Os dois detidos confessaram ter assassinado 17 de um total de 43 normalistas desaparecidos.

De acordo com informações do procurador público do estado de Guerrero, Inaky Blanco, o ataque aos estudantes foi executado juntamente pela polícia e pelos criminosos. A polícia inicialmente abriu fogo contra os três ônibus que os estudantes haviam sequestrado durante um protesto. Após a prisão, eles teriam entregado os jovens aos criminosos. O massacre teria sido ordenado pelo chefe regional dos Guerreiros Unidos.

Organizações de defesa dos direitos humanos culpam a impunidade generalizada e o controverso combate contra o tráfico de drogas pela escalada da violência no México.

“O massacre de Iguala mostra como o Estado mexicano se interessa pouco pelos direitos humanos”, diz Perseo Quiroz, diretor da Anistia Internacional no México. “Ele coloca a culpa no crime organizado, para fugir de sua própria responsabilidade.”

Para o cientista político mexicano Carlos Pérez Ricart a repressão brutal contra estudantes rebeldes “não é incomum”.

“A questão é saber quantas Igualas devem ser ainda reveladas antes que algo mude”, explica. “A situação lembra os acontecimentos nos Bálcãs há 20 anos, quando novos massacres eram descobertos um após o outro. Na época, era como hoje no México: ninguém aparece como responsável.”

Diferentes estatísticas

Há um mês, em 2 de setembro de 2014, Peña Nieto apresentou estatísticas durante o lançamento do seu segundo relatório do governo no Palácio Nacional na Cidade do México. Segundo elas, a taxa de homicídios caiu em 15% de janeiro a agosto de 2014 em relação ao mesmo período em 2013. Sequestros teriam diminuído 9%, e extorsões, 22%.

A Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) do México apresenta outros números. Ele registrou no ano passado 600% mais relatos de tortura e maus-tratos por parte da polícia e soldados do que há dez anos – resultado do aumento das operações militares contra o tráfico de drogas. O desaparecimento violento de militantes dos direitos humanos aumentou 60% em comparação com o governo anterior, de Felipe Calderón.

No Índice Global da Paz de 2014, o México está na posição 138, de um total de 162 países pesquisados. “Desde o início das operações militares contra os poderosos cartéis no final de 2006, a violência no México aumentou dramaticamente”, afirma o relatório do Instituto de Economia e Paz Relatório. Por causa da luta contra o tráfico de drogas, os cartéis foram à procura de novo ‘negócio’, como sequestro ou extorsão.

Segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), a taxa de homicídios no México cresceu consideravelmente e agora está em 21,5 vítimas por 100 mil habitantes. Em regiões dominadas pelos cartéis, ela chega a 100 mortes por 100 mil habitantes. A média mundial é de 6,2.

“O massacre de Iguala é uma das mais cruéis e mais graves violações dos direitos humanos sob o governo do presidente Enrique Peña Nieto”, afirma o diretor da Anistia, Perseo Quiroz. “Há indícios claros de que as forças de segurança do governo estavam envolvidas.”

 

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