Por Leonardo Ferreira do Brasil de Fato
Desde que o cacique xavante Mário Juruna deixou o Congresso Nacional, no fim de 1986, nunca mais o país teve um índio no parlamento. Com uma população de 890 mil pessoas, os indígenas representam cerca de 0,4% da população brasileira, proporção que não se repete nos espaços de poder.
Dos 25.919 candidatos e candidatas, apenas 83 são indígenas em todo o país, sendo 51 candidatos a deputado estadual, 24 a deputado federal e apenas 3 para o Senado. Para presidente da República e governador de estado, não há nenhum candidato indígena. Nem mesmo entre os vice.
No Brasil, existem pelo menos 305 povos, com 274 línguas diferentes faladas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A valorização dos conhecimentos e tradições de povos tradicionais, que envolve várias gerações dentro das aldeias pode fortalecer as comunidades, preservando a riqueza dessas culturas. É o que defende Sonia Guajajara, da Coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
“Para nós é mesmo uma questão de reafirmação da identidade. Se a gente tivesse a nossa representação indígena dentro do parlamento, a gente poderia contribuir muito inclusive para o Brasil reconhecer e respeitar essa diversidade étnica, cultural”, sugere.
Marcos Tupã, Coordenador da Comissão Guarari Yvyrupa, considera necessário que o país garanta representação das populações tradicionais no Parlamento como forma de expressar as reivindicações específicas.
“O Brasil é pluricultural. Deveria respeitar a Constituição Federal. E toda hora, todo momento os parlamentares anti-indígena estão apresentando propostas e projetos de lei para mudar a Constituição e muitas vezes estão batendo de frente com a legislação já garantida.”
Reforma política
Sonia Guajajara fala da urgência de o Brasil corrigir essa distorção marcada pela sub-representação nos espaços institucionais, pois “somente uma mudança no sistema político pode ser bem sucedido. Só um representante indígena mesmo pode fazer essa defesa com legitimidade.”
A capacidade de proposição dos indígenas não se limita a pautas específicas. Tupã destaca que é possível contribuir em todas as áreas relacionadas ao desenvolvimento do país.
“Nós temos condição de discutir meio ambiente e conservação. Infelizmente a questão econômica e o capitalismo acabam engolindo os menos favorecidos porque a maioria das questões envolve interesses financeiros para empresas e representantes do agronegócio”, comenta Tupã.
País racista e excludente
Com a sub-representação, a garantia de direitos dos indígenas tem ficado refém da influência de setores do agronegócio e da mineração. A ofensiva sobre os Territórios Indígenas resulta em aumento dos conflitos no campo.
As populações indígenas têm sido excluídas dos processos de tomada de decisão. Além disso, em muitos casos, são frequentemente tratadas de forma pejorativa e discriminatória. Para a integrante da APIB, a exclusão é uma forma de racismo.
“O Brasil demonstra que a ordem que se prega é excluir essas representações das minorias, tanto de indígenas como de negros e mulheres. Aí fica muito claro que o que manda mesmo é o poder econômico, o dinheiro. Fica declarado um país racista e excludente.”
Este ano, no estado de Roraima, em assembleia na reserva Raposa Serra do Sol, caciques de diversas etnias iniciaram uma articulação para eleger dois deputados, um federal e um estadual.
Roraima é o estado que proporcionalmente possui a maior população indígena no país. Segundo o último Censo do IBGE, dos 450 mil habitantes do estado, 49,6 mil se declaram indígenas. A articulação busca levar um indígena ao Congresso depois de 28 anos sem um representante genuíno.