Publicamos a Nota de repúdio e denúncia dos coletivos LGBT que lutam para conscientizar e superar a discriminação em Recife (Brasil)

Na próxima semana, do dia 12 ao 16 de maio, acontecerá o II Seminário de Gênero e Sexualidade da UFPE, com painéis, minicursos, oficinas e intervenções previstas para acontecer em vários centros da Universidade, incluindo o Centro de Ciências Jurídicas. O Seminário foi construído pelo Diretório Acadêmico de Ciências Sociais – DACS em conjunto com o Movimento Zoada, o Coletivo Feminista Diadorim, o Coletivo LGBT Toda Forma – FDR e o Grupo de Pesquisa de Gênero e Sexualidade Diversiones.

Na última quinta-feira, no entanto, tivemos a notícia de que a reserva de espaços na Faculdade de Direito do Recife (CCJ), feita pelos grupos da Casa envolvidos na construção do evento, foi cancelada pela Direção sem qualquer justificativa. Buscamos informações com o Setor Administrativo sobre os motivos desse cancelamento e tivemos a surpresa de saber que, supostamente, todos os eventos previstos para o Centro estavam suspensos até a quarta-feira, dia 14 de maio, quando ocorrerá uma reunião extraordinária do Conselho Departamental referente à regulamentação de eventos na Faculdade.

Ao conversar com a Direção, foi-nos explicado que somente eventos “diretamente ligados” à academia e ao Direito poderiam ser livremente realizados até a data prevista. Argumentou-se que os eventos têm ocorrido com grande frequência “atrapalhando” as aulas, segundo se apontou, essas sim o verdadeiro foco do ensino jurídico. Foi dito que os eventos vêm causando tumulto, afastando os/as estudantes das aulas e incomodando professores/as e funcionários/as, gerando até problemas com a segurança da Faculdade. Apesar de todos os pontos elencados, em conversa posterior com membros do DADSF, tivemos conhecimento de que outros eventos, organizados pelo próprio Diretório e por professores/as não foram cancelados.

Diante de toda a situação, algumas questões surgem como necessárias para reflexão: a quem serve uma universidade pública e a quem cabe o poder de limitar seu diálogo com outros conteúdos supostamente “não-acadêmicos”? Por quê a presença de pessoas e pautas às quais o Direito historicamente nega direitos é tão incômoda? E, finalmente, o que simboliza o impedimento do II Seminário de Gênero e Sexualidade dentro da Faculdade de Direito do Recife, senão uma lamentável demonstração de homofobia, machismo e descaso para com o tripé constitucional da Universidade?

É digna de nota a restrita perspectiva de Universidade que alguns/mas professores/as da Faculdade possuem. Muito embora estejamos entre juristas e disponhamos de uma norma constitucional que elenca o ensino, a pesquisa e a extensão como elementos constitutivos da Universidade Pública, alguns/mas dos/as docentes ainda insistem em tratar a Universidade como um cursinho profissionalizante, um lugar para onde se vai só e unicamente assistir aulas e tão melhor se forem assistidas em silêncio. Devendo-se ressaltar também a postura frequentemente autoritária e anti-dialógica adotada pelos/as mesmos/as, abusando-se de um poder do qual se creem tão detentores/as, negando a relevância e até a existência de interesses e necessidades dos/as estudantes.

Com maior razão ainda fica demonstrado o preconceito que repousa sobre o Centro de Ciências Jurídicas, se lembrarmos o histórico recente de ações contra o Coletivo LGBT Toda Forma. Assistimos consternados/as a retirada da bandeira-símbolo do movimento durante a I Semana LGBT sem que qualquer retratação fosse empreendida pela Faculdade.

De igual modo, vem se enfrentando uma enorme dificuldade para efetivar a Semana da Visibilidade Trans. Em que pesem os grandes esforços de diálogo do Toda Forma, a avaliação feita pelo Conselho Departamental foi recheada de argumentos vazios e formais para sua não aprovação. Na mesma linha, durante a II Semana da Mulher, organizada pelo Coletivo Feminista Diadorim, alguns/mas professores/as não tiveram sequer a cautela em esconder o machismo que carregam em seus discursos, debochando da causa feminista e humilhando algumas companheiras dentro das salas de aula.

Podendo soar exagerado para o senso comum teórico e para o conservadorismo tradicionalista, infelizmente ainda bastante presentes e atuantes no âmbito de nossa Faculdade, esses casos escancaram o machismo e a homo-lesbo-bi-transfobia alimentados e reproduzidas na Universidade. É preciso lembrar que essas opressões não se operacionalizam apenas através da chamada violência real, com agressões físicas ou mesmo insultos. É sobretudo no campo do não nomeado e do não pensável que atuam como mecanismos produtos e produtores de violências simbólicas, hierarquização e normatização. Estes são os motivos os quais parecem perenemente motivar alguns/mas professores/as da Casa a pressionar a Direção contra os/as estudantes.

Encerramos esta nota, questionando o tipo de universidade pública que nós, estudantes, queremos, a universidade é pública para que público? Tendo em vista os atos descritos acima, pode-se pensar que não é para o povo, nem para as mulheres e muito menos para os/as LGBTs. Tão importante quanto, é a preocupação com a democracia, que se mostra brutalmente atacada com frequência em NOSSA Faculdade, com a arbitrariedade com que se veta e se cala a voz do/a estudante em privilégio das vontades de uma parcela conservadora dos/as professores/as. Instaura-se, pois, um clima belicoso entre o corpo docente e o discente com tentativas desesperadas da Direção de agir como árbitro neste duelo de poder.

É nesta conjuntura que convocamos todos os coletivos, grupos de pesquisa e de extensão, movimentos estudantis, estudantes, professores/as e funcionários/as a somar forças na nossa luta contra a censura e a inferiorização das pautas estudantis, contra as opressões de gênero e sexualidade e contra um ensino hierárquico e acrítico! O II Seminário de Gênero e Sexualidade vai acontecer, sim, e convidamos todos e todas a participarem e se unirem a nós na luta por uma universidade popular, dialógica e participativa! Juntos/as seguiremos por uma universidade de e para todos/as. Como disse a teórica feminista e LGBT Judith Butler: “Se a esperança é uma demanda impossível, então nós demandamos o impossível.”

Assinam esta nota:

Movimento Zoada

Coletivo LGBT Toda Forma

Coletivo Feminista Diadorim

 

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