Advogados das famílias falou sobre a continuidade da luta por justiça e punição dos responsáveis pela violenta desocupação da ocupação Pinheirinho
Matéria de Luciana Candido e Raíza Rocha, do Opinião Socialista publicada pelo Brasil de Fato
Um ano após quase 2.000 famílias serem expulsas de suas casas, o Opinião Socialista conversou com Antônio Donizete Ferreira, o Toninho, da direção do PSTU e advogado do Movimento de Ocupação do Pinheirinho. Toninho falou sobre a continuidade da luta por justiça e punição dos responsáveis pela violenta desocupação. O advogado reafirmou que o Pinheirinho continua vivo na luta por moradia.
Opinião Socialista – Após a desocupação do Pinheirinho, uma série de iniciativas jurídicas e políticas foram tomadas. Como andam estas ações depois de um ano?
Toninho – Em primeiro lugar, a desocupação foi um festival de irregularidades. Em termos judiciais, inclusive, está absolutamente tudo errado. O processo não terminou. Não deixamos que ele fosse arquivado. A batalha jurídica ainda segue por alguns motivos. Primeiro porque a liminar que nós tínhamos na época impedia a desocupação. Além disso, nós entramos com mais de mil ações pedindo ressarcimento das perdas, por dano moral e material. Os moradores do Pinheirinho perderam tudo. Suas casas, seus móveis, tudo o que tinham nos seus lares se perdeu, ficou nos escombros. E, além do mais, perderam o seu baú de recordação, uma foto antiga, discos, roupas, bichinho de pelúcia. Ainda foram submetidos a uma violência desumana quando às cinco e meia da manhã foram acordados com um batalhão da polícia na porta da sua casa, com gás lacrimogêneo sendo lançado dos helicópteros. Alguém precisa ressarcir, precisa compensar isso tudo. O Estado, a prefeitura ou a massa falida. Alguém vai ter que pagar por isso que aconteceu. Neste sentido, fizemos também uma representação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que sejam apuradas as responsabilidades do juiz Ivan Sartori, presidente do Tribunal da Justiça de São Paulo, de Rodrigo Capez, assessor do presidente do TJ – SP e da juíza Márcia Loureiro de São José dos Campos. A representação ainda não foi decidida, mas vai agora para o pleno. Alguém precisa ser responsabilizado por toda a violência que foi. Nós achamos que quem aperta o gatilho tem responsabilidade, mas quem manda apertar o gatilho também é culpado. Fizemos também uma representação na Organização dos Estados Americanos (OEA), assinada e enviada por renomados juristas brasileiros.
Em setembro do ano passado, o leilão do terreno do Pinheirinho foi cancelado. O que houve?
Houve dois pedidos de cancelamento deste leilão. Um nosso e outro da massa falida Selecta. Pedimos o cancelamento do leilão porque o único bem que a massa falida tem para ressarcir os moradores é este. A Selecta, por sua vez, pediu a suspensão do leilão alegando que o perímetro do terreno não é aquele onde foi feito a desocupação. Este pedido da massa falida reforça ainda mais as irregularidades da desocupação. Se a metragem não estava certa, não poderia ter feito a desocupação.
Um ano depois, como está o terreno do pinheirinho?
O terreno hoje não cumpre a sua função social. Não cumpria antes, até a entrada dos moradores do pinheirinho. A partir daí, passou a cumprir uma função social nestes oito anos e agora não cumpre nenhuma função social. Está abandonado, cheio de mato. AS árvores frutíferas dos moradores estão carregadas de manda, acerola, abacate e não serve pra nada. Hoje, tem uma cracolândia perto, como em outros três ou quatro lugares em São José dos Campos.
O terreno nunca pagou IPTU e tem uma dívida de 16 milhões do imposto. Com a retirada das famílias, a massa falida não limpou os entulhos e isso resultou em multa com a prefeitura. Hoje, a empresa tem, portanto, uma dívida com a prefeitura de um pouco mais de 50 milhões, de IPTU e multa. Além disso, a empresa cometeu mais uma irregularidade. Como a prefeitura estava multando por não tirar os entulhos, a empresa resolveu enterrar os entulhos no próprio terreno. O que é irregular e antiecológico.
Como está a organização do movimento popular do pinheirinho após a desocupação?
Continuamos realizando assembleias com os moradores, nos sábados às 15h, de quinze em quinze dias no Campão, no Campo dos Alemães. Existem também reuniões por bairros onde eles estão morando. Nestas reuniões é discutida a perspectiva da luta e como os moradores estão vivendo. O Pinheirinho não era apenas um terreno. Era muito mais que isso. Pinheirinho é um povo, que possui toda uma particularidade. É um povo que aprendeu que precisa se defender, que precisa lutar. Um povo que aprendeu a lutar. E essa luta segue. O dia 22 de janeiro foi uma data muito triste, mas não foi o final. A luta não terminou e segue até que estas pessoas tenham uma casa. E mesmo quando já estiverem morando nas novas casas, vamos continuar organizados para continuar lutando por tudo o que tem direito. Por exemplo, que as mulheres continuem organizadas na luta por creche, mais escolas e contra a violência doméstica. Pinheirinho é um exemplo que eles não conseguiram apagar. Tanto é que já existem hoje muitos novos Pinheirinhos. Muitas ocupações que vieram depois, no Brasil inteiro, são chamadas de “novo Pinheirinho”. Enquanto estiver uma família sem teto, temos que continuar nossa luta. E os moradores do Pinheirinho sabem disso.
Como andam as negociações para a construção de casas populares para os moradores do Pinheirinho?
Está quase concretizado uma compra antecipada de dois terrenos pela Caixa Econômica Federal para a construção das moradias para cerca de mil famílias. Um dos projetos da construção, inclusive, já está bastante adiantado. Este projeto foi feito com assessoria do pessoal da USINA, um setor urbanista que assessora o movimento popular. O nosso projeto não é como o projeto do CDHU que é 40m². Pela USINA, com o mesmo preço, seriam apartamentos por volta de 63m² e, além do mais, com capacidade para que as pessoas possam gerar renda, com pequenos comércios e espaço para os que trabalham com reciclagem. Enfim, uma construção com uma visão social, e não apenas como faz o CDHU que são empresas que querem ter lucros, nada mais que isso. Além disso, queremos também que na construção dessas coisas se utilize a própria mão de obra do pinheirinho, afinal o que mais tinha lá era pedreiro, servente de pedreiro e trabalhadores da construção civil. Quem vai gerenciar o projeto é a Associação Democrática por Moradia e Direitos Sociais (ADMDS), associação do Pinheirinho.
Mas são apenas dois terrenos e não dá pra beneficiar todo mundo do Pinheirinho. É preciso mais moradia. E, por isso, nós queremos que o prefeito da cidade desaproprie o terreno do Pinheirinho. Existe uma dívida da empresa de mais de 50 milhões com a prefeitura. Neste sentido, a prefeitura pode trocar o terreno pela dívida, o que é juridicamente viável. O atual prefeito, Carlinhos Almeida (PT), na época, ainda não era prefeito, esteve no pinheirinho e se solidarizou com a luta. Agora a solidariedade só não basta. Carlinhos tem posição de governo e pode desapropriar o terreno. Basta vontade política. Nestes três projetos, queremos construir alguns monumentos em memória desta luta. Um memorial da luta do Pinheirinho.