Brasília – O fazendeiro Orlandino Carneiro Gonçalves, 61, confessou ter atirado no adolescente guarani-kaiowá de 15 anos, Denílson Barbosa. O corpo do jovem morador da aldeia tey´ikue, localizada na área indígena Caarapó, em Caarapó (MS), a cerca de 50 quilômetros de Dourados (MS), foi encontrado no último domingo (17) em uma estrada vicinal que separa a aldeia de algumas fazendas.
Segundo o delegado regional de Dourados, Antonio Carlos Videira, o proprietário da fazenda Sardinha se apresentou ontem (19) à noite na delegacia de Caarapó e confessou a participação no crime. Em seu depoimento o fazendeiro informou que estava só na propriedade quando ouviu os latidos dos cachorros, que correram para a área do criadouro de peixes. Ao perceber o movimento, Gonçalves disse ter disparado dois tiros.
De acordo com o delegado, Gonçalves estava acompanhado de sua advogada, prestou depoimento e foi liberado em seguida. A Agência Brasil não conseguiu localizar a advogada de Gonçalves.
A delegada responsável pelo inquérito policial instaurado para apurar o caso, Magali Leite Cordeiro, esteve na manhã de hoje (20) na reserva, acompanhada por investigadores da Polícia Civil e representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e apreendeu uma arma de propriedade do fazendeiro.
Conforme o coordenador substituto do escritório da Funai em Dourados, Vander Aparecido Nishijima, informou ontem (19) à Agência Brasil, as primeiras notícias davam conta de que Denílson Barbosa saiu para pescar com o irmão mais novo, de 11 anos, e outro índio, no sábado (16) à tarde. Aparentemente, os três pretendiam ir a um córrego cuja nascente fica no interior da terra indígena e que cruza algumas fazendas próximas.
Segundo o testemunho dos dois índios que acompanhavam Barbosa, os três foram abordados por homens armados quando passavam próximo a um criadouro de peixes. Os dois índios disseram também que os três homens atiraram. Na fuga, Denilson teria ficado preso em uma cerca de arame farpado, foi alcançado pelos pistoleiros e agredido. Ontem (19), Nishijima esteve na área acompanhado por líderes indígenas e ouviu a versão do irmão de Denilson. Na língua guarani ele reforçou o que já havia dito na aldeia, logo depois do fato, identificando três homens por apelidos.
Revoltados, parentes do adolescente e moradores da aldeia ocuparam a fazenda onde o crime teria ocorrido e enterraram o corpo de Denilson. Os índios já reivindicavam a área onde, hoje, o fazendeiro cria gado e planta soja, como sendo território tradicional indígena, parte do antigo tekoha (território sagrado) Pindoty, ocupado pelos kaiowás muito antes da expulsão de comunidades indígenas, ao longo do século 20.
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a propriedade estava deserta quando os índios chegaram ao local. Depois de enterrarem o corpo do adolescente, cerca de 300 índios permaneceram no interior da fazenda. O grupo planeja fazer uma série de protestos para chamar a atenção para o assassinato e para os conflitos por terras entre índios e fazendeiros. O Cimi informou também que a comunidade reivindica a presença permanente da Força Nacional na área como forma de garantir a proteção das famílias indígenas.
Cerca de 5 mil índios vivem na Terra Indígena de Caarapó, que mede cerca de 3,5 mil hectares (1 hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, aproximadamente as medidas de um campo de futebol oficial). De acordo com o Cimi, desde a criação do território indígena, em 1924, os índios são obrigados a pescar fora de sua reserva, já que não há peixes nas nascentes dos córregos existentes no interior da reserva. Segundo o Cimi, isso tem provocado problemas e conflitos recorrentes.
Matéria de Alex Rodrigues, Repórter Agência Brasil