Acampamento próximo à cidade de Parauapebas sofre ameaças com armas de fogo rotineiramente.
Matéria de Solange Engelmann, de Parauapebas (PA) para o Brasil de Fato.
Há mais de dois meses as 200 famílias sem-terra do MST, que vivem no acampamento Frei Henri, sofrem ataques diários de uma milícia armada. O acampamento está localizado na propriedade Fazendinha, à margem da rodovia PA-275, a 16 km da cidade de Parauapebas, em Curionópolis, região sudeste do Pará.
Os ataques dos pistoleiros, que tiveram início no dia 6 de outubro deste ano, ocorrem principalmente durante a noite, quando o grupo armado joga bombas contra os barracos, solta rojões, usa um farol para iluminar o acampamento e tentar alvejar pessoas com tiros.
“Aqui eles usam bala mesmo, jogam bombas, atormentando à noite, não deixando a gente dormir, colocando farol, um tipo de farol usado nos campos de refugiados. Esse farol é um verdadeiro terror, ilumina todo o acampamento. Com isso conseguem ter uma boa visão, e quando soltam as bombas, atiram junto tentando alvejar as pessoas no acampamento”, relata o acampado Dian Carlos.
Para a dirigente do setor de educação do Pará, Maria Raimunda, as famílias do acampamento Frei Henri vivem uma situação de guerra permanente, com o acampamento sendo atacado por tiros e bombas de pistoleiros todas as noites.
Os ataques à bala também ocorrem durante o dia quando os sem-terra se deslocam para as roças plantadas na área. Os pistoleiros ainda fazem ameaças de morte aos acampados que encontram na estrada ou no entorno da fazenda. Alguns comerciantes de Curionópolis e Parauapebas, que fornecem alimentos para as famílias acampadas, também foram ameaçados pelos pistoleiros.
Segundo os sem-terra, também há informações de que os fazendeiros da região contrataram um grupo de pistoleiros para assassinar três dirigentes do MST no estado, devido à ocupação dessa fazenda.
O acampado João Melo conta que as famílias enfrentam a violência dos pistoleiros desde a ocupação da área, mas que a situação se agravou quando os sem-terra iniciaram o plantio na terra. “Começamos a preparar a terra e depois das eleições, quando voltamos para plantar não deixaram a gente trabalhar na terra.”
Entre os dias 09 e 11 de outubro deste ano, os pistoleiros, que estão entrincheirados na sede da fazenda, a cerca de 500 metros do acampamento, realizaram um novo ataque contra as famílias acampadas, na tentativa de realizar um despejo forçado. “Esse foi o momento mais tenso, eles armaram uma milícia armada pra despejar as famílias do Frei Henri. Prática de nazismo mesmo. Mantinham a noite toda uma sirene ligada pras famílias ficarem acordadas, atirando, jogando bombas e um farol iluminando o acampamento”, relata o dirigente do MST no Pará, Charles Trocate.
O MST denunciou os ataques da milícia armada à polícia local, à justiça e a Vara Agrária do Pará, e exigiu a intervenção da Força Nacional ou Polícia Federal para proteção das famílias acampadas, mas até o momento as reivindicações não foram atendidas. Os sem-terra também cobram a destinação da fazenda para fins de reforma agrária, pois, segundo parecer da justiça, a área é pública.
Os sem-terra denunciam ainda que a direção do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) vem tratando as reivindicações do MST com desdém, não tendo interesse em amenizar os conflitos e realizar o assentamento das famílias acampadas. Para o MST, a vistoria e desapropriação das fazendas ocupadas não avançaram até o momento porque há conivência de setores do Incra com fazendeiros da região. Porém, a função do Incra é evitar os conflitos agrários, com a realização da reforma agrária.
Devido à situação constante de terror algumas famílias abandonaram o acampamento. Mas muitos acampados continuam resistindo e prometem permanecer na fazenda até a conquista do assentamento. Até o momento, ninguém ficou ferido.
Mesmo diante da situação de tensão e medo, as famílias estão plantando culturas de subsistência e hortaliças. Os sem-terra também construíram uma escola de ensino fundamental, que funciona como anexo de uma Escola Municipal de Curionópolis, em que os educadores do acampamento ministram aulas da 1ª a 4ª série.
Histórico de violência
A violência dos grupos de milícias armadas organizadas por fazendeiros não é um caso isolado no Pará. Ao contrário, essa tem sido uma prática constante, utilizada há muitos anos por pessoas que contratam capangas para grilar terras públicas e reivindicar a posse.
No dia 21 de junho deste ano, cerca de mil sem-terra que faziam um ato para denunciar o uso intensivo de agrotóxicos e a grilagem de terras públicas em frente à sede da fazenda Cedro, em Marabá, foram atacados por pistoleiros da propriedade do banqueiro Daniel Dantas.
No ataque, 16 trabalhadores rurais foram feridos com gravidade. A área faz parte do complexo de 56 fazendas da Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, que concentra 600 mil hectares de terras no Sul do Pará.
A fazenda Cedro foi ocupada em 2010, por 240 famílias do MST, que devem continuar na área até o final do julgamento do processo de posse da área pela justiça. A fazenda é objeto de um imbróglio jurídico que envolve o Estado, a família Mutran e o Grupo Santa Bárbara, de propriedade do banqueiro Daniel Dantas, investigado pela Polícia Federal por suspeita de desvio de verbas públicas, corrupção e lavagem de dinheiro.