Muita gente sonha em ser patrão por vários motivos. O mais comum é querer ficar rico e trabalhar pouco ou nada. Às vezes a motivação inaudita é poder fazer com outros o que sofreu do seu chefe. São mais raros os casos em que se quer ser patrão de si mesmo, “dono de seu nariz” como se costuma dizer. E nenhum desses casos motivou uma experiência concreta que já dura 10 anos.
“A Flaskô, produtora de reservatórios e tonéis plásticos, foi tomada por seus funcionários em junho de 2003, após o pedido de falência devido ao acúmulo de dívidas do grupo(1)” que a controlava. Os trabalhadores, operários e outros funcionários, em meio a uma época de grandes crises e alto desemprego precisavam lutar pelo seu único bem essencial: seu emprego. Assim assumiram o controle da fábrica.
Não são tão raros quanto se noticia os casos de fábricas que em vias de fecharem passam a ser controladas pelos trabalhadores. No entanto, a forma mais comum é a criação de uma cooperativa entre os funcionários que passam a ser proprietários da empresa, não sem antes enfrentarem grandes dificuldades financeiras, relacionais e administrativas.
As cooperativas apesar de carregarem um sentido de igualdade entre seus membros, muitos vezes terminam mantendo a mesma lógica do patronato capitalista: hierarquia e exploração do trabalho e o resultado (lucro) aos poucos vai sendo concentrado num número cada vez mais reduzido de mãos. Até mesmo passam a explorar mão de obra terceirizada ou contratada num momento posterior com condição de decisão inferior. O mais comum é que as decisões vão sendo delegadas e centralizadas matando assim o antigo espírito de solidariedade embutido no cooperativismo
O grupo da Flaskô está trilhando um caminho diferente. Seu objetivo não é ter a propriedade, eles pleiteiam a estatização da fábrica. Por outro lado, fazem uma verdadeira uma revolução na gestão. Ninguém está acima de ninguém e todos podem participar de forma igualitária, livremente, sem coerções.
Após muitas experiências, o controle operário na Flaskô, que tem 80 trabalhadores, funciona assim: Acima de tudo está a Assembléia Soberana que se reune mensalmente ou por necessidade. Todos os trabalhadores participam igualmente e não é obrigatório. As decisões são tomadas em Assembléia e cabe ao Conselho de Fábrica implementar e acompanhar seu andamento.
Por sua vez, o Conselho de Fábrica é formado por uma “cadeira” de cada setor para que todos estejam representados. Para ocupar a cadeira é feita uma eleição dentro de cada setor. Mas para ser candidato, além de ser a expressão da vontade individual (“querer ser candidato”) a candidatura deve ser aceita pelos membros do setor, ou seja, “por que vc quer ser candidato?”, é a pergunta básica que o candidato responde ao coletivo do setor. O conselho se reúne toda semana e além dos representantes eleitos qualquer trabalhador pode não apenas participar como tem o direito de falar também.
Quem comentou à Pressenza a experiência da Flaskô é Josiane L. Vergano, autora da tese de doutorado que virou livro “Fábrica Ocupadas e Controle Operário”, ela mesma também trabalha na empresa. Finalizamos esta matéria, com um trecho do livro, com o depoimento de um funcionário da Flaskô:
“Muitas firmas estão fechadas. O que nosso filho vai comer em casa? Nós fomos a luta. Hoje nós estamos conseguindo e é difícil. Assim como está difícil para a turma sem terra. Eu tneho um filho de 20 anos. Como um filho nosso vai trabalhar em firma fechada? Não tem jeito. Então toda firma que está pra fechar a porta tem que ir com a gente na luta, ocupar a fábrica.”
(*) Extraído do livro “Fábricas Ocupadas e Controle Operário” de Josiane Lombardi Verago, editora CEMOP