**Por Fabio de Castro**
O novo governo tem pela frente o desafio de criar propostas concretas para reparar a política socioambiental do governo anterior, marcada por severas contradições.
As diversas realizações durante o governo Lula na área socioembiental se revelam contraditórias quando contextualizadas dentro do programa nacional de outros setores. Em relação à política territorial, por exemplo, houve um aumento significativo de áreas protegidas, crescente inclusão de populações locais, e início do processo de regularização fundiária na Amazônia.
Estes feitos, porém, se contradizem com a aprovação da alteração do código florestal para subsidiar a expansão do agronegócio, o descaso às populações locais em áreas de conflito ambiental, o isolamento do Ministério do Meio Ambiente e sociedade civil no licenciamento ambiental de grandes projetos, e o desinteresse político em outros biomas relevantes como o cerrado e o pantanal.
Em relação à política energética, o governo anuncia com orgulho o aumento de energia de fonte renovável tais como hidroelétrica e agrocombustível, sua liderança internacional na produção de etanol, e a criação do selo social para inclusão do pequeno produtor na produção do biodiesel.
Esta política, porém, se contradiz com o impacto socioambiental decorrente da produção destas fontes energéticas, seja na construção de grandes hidrelétricas, na expansão desordenada da cana-de-açúcar, ou do domínio da soja na produção do biodiesel.
Na política climática, o governo brasileiro tem assumido uma posição de líder nas negociações internacionais, com metas claras de adaptação e mitigação, mecanismos de compensação para diminuição de emissão de carbono e manutenção de florestas, e resultados concretos de diminuição do desmatamento na Amazônia nos últimos anos.
Porém, a possibilidade de alteração do código florestal para viabilizar mais desmatamento, o processo de licenciamento ambiental sem transparência para viabilizar grandes projetos de alto impacto socioambiental e o elevado investimento para a exploração da novas reservas de petróleo favorece apenas o aumento de emissão de carbono através de desmatamento e consumo crescente de combustível fóssil.
**Política Socioambiental Integrada**
As realizações do governo Lula na área socioambiental são positivas somente se analisadas de forma isolada. Quando se considera as conexões com políticas econômicas e sociais, tais feitos se revelam altamente problemáticos.
O aumento de áreas protegidas ironicamente legitima a expansão do agronegócio e de grandes projetos que direta ou indiretamente afeta a sua integridade socioambiental. Da mesma forma, o aumento de produção de energia renovável viabiliza a imagem de um estado verde, ocultando os custos socioambientais na produção destas fontes energéticas. Finalmente, o foco da política climática na conservação da Amazônia legitima o uso insustentável de outras áreas de relevância socioambiental como o cerrado e o pantanal, que sofrem forte pressão da expansão do agronegócio.
A política ambiental do Brasil, portanto, não pode continuar isolada de outras políticas do governo, uma vez que estão diretamente ligadas a questões sociais, econômicas e políticas. Recursos naturais ocupam uma importância singular na economia nacional, o crescimento econômico gera um aumento de consumo energético e a população está cada vez mais vulnerável a desastres ambientais, como a recente tragédia no Estado do Rio de Janeiro.
Mais do que o simples emprego do termo *“ambiente”* nos discursos de Dilma Rousseff, precisamos de um compromisso concreto de integração da questão socioambiental na política nacional para os próximos anos.
*Fábio de Castro é pesquisador do CEDLA (Centro de Estudos e Documentação Latino-Americanos) em Amsterdã*