Na verdade, tratava-se de um pensador, original e raro, que mergulhava nos abismos do coração e da mente, configurando uma tarefa, cuja exata dimensão não tinha sido todavia bem entendida. Com dezenas de livros escritos, era também um “fazedor”, no sentido de que suas ideias se apresentavam para ser cotejadas em distintos grupos de estudos, -verdadeiros laboratórios existenciais- que muitos jovens e não tão jovens experimentam com entusiasmo e assombro em diversos territórios e culturas.
A consciência, para Silo, era um fenômeno aberto, cujos meandros, incluindo os mais íntimos, reprimidos ou distantes do racional, podiam se despertar a quem soubesse encontrar a chave, com paciência e sereno esforço, para decodificar suas manifestações. A mente, portanto, era uma espécie de âmbito maior, o oceano infinito dentro do qual a consciência e o mundo desenvolviam sua ação cotidiana.
Desde esta perspectiva, seu original ensinamento liberador tem pontos de contato com o Budismo, ainda que não desdenha aportes dos Sufis, da Alquimia dos Alexandrinos e Neoalexandrinos ou da Philokalia dos monges do Monte Athos.
Inquieto escrutador da espiritualidad das culturas precolombianas, em distintas oportunidades se referiu ao mito mesoamericano de Quetzalcoatl, o homem-serpente convertido em deus, como também ao grande Pachakuti, o renovador do estado Inca, que humanizou o coletivo social desse império, segundo se explica no texto *“O humanismo nas distintas culturas”* do intelectual russo Semenov. Por outra parte, o Aconcágua como majestoso e simbólico protetor andino -e da mãe natureza- da localidade de Punta de Vacas, onde Silo começou sua missão, é uma constante referência em sua obra.
Herdeiro de Gandhi e Martin Luther King, foi o criador, sucessivamente, do Movimento Humanista e de organismos como o Partido Humanista, a Comunidade para o Desenvolvimento Humano, Convergência das Culturas e outras associações. A Mensagem de Silo, é a síntese de sua doutrina dirigida para um fim: Humanizar a Terra, quer dizer, descobrir o sentido do homem no mundo.
Otimista profundo e de uma curiosidade notável, nos últimos tempos e como um verdadeiro Prometeo, colocou em prática o que ele chamou *“Ofício do Fogo”*: interessado em estudar o salto de consciência que iluminou aos homínideos e os convirteu em sapiens sapiens, idealizou distintos experimentos para produzir e controlar o fogo a partir de âmbitos primitivos, em elementares condições de origem, e desta maneira observar e entender o esforço, o funcionamento da psique colocada em tal tarefa faz 40 ou 50 mil anos atrás.
Muito pouco antes da morte física de Silo, minha filha María Guillermina, um ser sensível e receptivo me conta, comovida, que teve uma intuição notável. Sonhou que este, em uma reunião de amigos, magro, debilitado e abatido caiu no chão; todos correram para auxiliá-lo, porém Silo os conteve com uma mão enquanto lhes dizia: *“–não, a mim não, cuidem da obra, cuidem da obra…!”*
Extraordinária premonição que me fez recordar a parte final de Zarathustra de Nietzsche, quando este, sentado em uma pedra, inquieto e meditabundo se perguntava *“–qual é o último pecado do homem Superior?”* Então e de imediato, diz o poema, lhe iluminou o semblante e disse: *“- A Autocompaixão..! Acaso aspiro eu o lamento de minha autocompaixão? Não ! – respondeu com firmeza: Eu aspiro a minha Obra !!!”*.
Sua prédica pela Paz começou quando tinha 31 anos, em 4 de Maio de 1969, em Punta de Vacas, aos pés do Aconcágua, com uma arenga connhecida como a Cura do Sufrimiento.
Em 1993, recebeu o doutorado Honoris Causa da Academia de Ciências da Rússia; pouco tempo antes, havia sido designado *“Mestre”* pela Sanga Budista de Sri Lanka, no sul da Índia.
A última vez que se apresentou em público foi em 11 de Novembro do ano passado, na Alemanha, onde dissertou diante a Cúpula dos Prêmios Nobel da Paz, quando a Marcha Mundial pela Paz e a Não Violência, da associação *“Mundo Sem Guerras”* (também nacida a partir de sua inspiração) chegou a Berlim depois de percorrer distintos continentes.
Cabe mencionar que essa marcha, épica, começou na Nova Zelândia, percorreu cinco continentes e culminou em Punta de Vacas, aos pés do Aconcágua, em plena cordilheira dos Andes, onde Silo a recebeu de braços abertos, ali onde construiu um dos tantos Parques de Estudo e Reflexão que se encontram espalhados pelo mundo.
Ver original em espanhol na íntegra:
http://www.pressenza.com/npermalink/la-dimension-espiritual-de-silox-el-infatigable-constructor-argentino-de-la-paz